Sabe aquele paciente que apresenta os sintomas de uma doença, vai ao hospital, é medicado, recebe um calhamaço de receitas e papeladas de exames, retorna para casa, enfia as prescrições dentro da gaveta, não passa na farmácia para comprar os remédios e dar sequência ao tratamento e toca a vida como se nada estivesse acontecendo? Bem-vindo ao futebol brasileiro, mas não estamos sós na teimosa insanidade.
Enquanto ligas nacionais, como as da Inglaterra, França, Alemanha, Espanha e Portugal; e continentais como a Champions, Europa League e Libertadores foram suspensas para reforçar o combate à pandemia do novo coronavírus, a bola segue rolando sem padronização no Brasil. Há jogos sem (e com) a presença de público. Argentina, Chile, Bolívia resistem. As principais competições nacionais do Leste Europeu também. São os casos da Rússia, Turquia, Ucrânia, Sérvia e Hungria. Não há recomendação do Ministério da Sáude (no caso brasileiro) nem da Organização Mundial de Saúde que tire os times de campo.
Ontem, o coronavírus causou até efeito colateral na tensa relação do Flamengo com o Grupo Globo para a transmissão dos jogos do time rubro-negro no Estadual. Horas antes da partida contra a Portuguesa pela terceira rodada da Taça Rio, o clube surpreendeu ao comunicar: “O Flamengo e o Grupo Globo, tendo em vista a realização dos jogos de futebol com os portões fechados, deixaram de lado as negociações contraturais envolvendo o Campeonato Carioca e buscaram uma solução que possibilitasse que os torcedores pudessem acompanhar o jogo em suas casas: sendo assim, Flamengo x Portuguesa terá transmissão do canal oficial FlaTV e no globoesporte.com”.
O clube da Gávea tem média de público de 47.619 pagantes na temporada em jogos no Maracanã. Acertou ao fazer um mimo para os torcedores que têm colocado a mão no bolso para pagar pelo ingresso e desfrutar da excelente fase do time. Entretanto, a diretoria poderia ter seguido o exemplo da cúpula do River Plate da Argentina e se recusar a jogar neste fim de semana. Como publicou o Correio na quinta-feira, o vice-presidente de Embaixadas do Flamengo, Maurício Gomes de Mattos, testou positivo para coronavírus.
Jesus desabafa
No fim de fevereiro, o dirigente participou de uma caravana da diretoria que visitou o Real Madrid e o Barcelona. A Espanha é o quinto mais afetado pelo Covid-19 com 4.231 casos confirmdos. Só perde para China, Itália, Irã e Coreia do Sul. No retorno ao Brasil, ele esteve no mesmo avião fretado que transportou o Flamengo para a partida contra o Junior Barranquilla pela Libertadores.
Na última sexta-feira, executivos, membros da comissão técnica e jogadores foram submetidos a exames. Os resultados estavam previstos para sair em 48 horas. Portanto, a virada rubro-negra sobre a Portuguesa, ontem, por 2 x 1, no Maracanã, poderia ter sido adiada pela Ferj em respeito e proteção à saúde dos atletas dos dois times.
Ontem, depois da vitória de virada sobre a Portuguesa, o técnico Jorge Jesus criticou duramente os dirigentes do futebol brasileiro por não suspenderem as competições. “Penso que não pode haver jogos. Temos que entender que os jogadores não são super-homens, O Flamengo, neste momento, está no risco, tivemos contato com uma pessoa, não sabemos o que pode acontecer. Espero que este tenha sido o último jogo nessa situação”, reclamou o treinador.
Emocionado, Jesus citou um amigo pessoal infectado pelo novo coronavírus. “Este vírus é uma preocupação que a gente pode ter, conosco, com as nossas famílias. Está sendo um problema grande. Eu sou português, sei muito bem o que está a passar em Portugal. Tenho um amigo em estado grave. É algo importante, não é uma brincadeira. É preciso a começar a pensar que não é só nos outros países. Isso (jogos) vai ter que parar”, comentou, parando alguns segundos para segurar o choro.
A bola também segue rolando no Leste Europeu. A Rússia registra 34 casos da doença. Em vez de parar tudo, Moscou passou a proibir jogos com mais de 5 mil pessoas. São Petersburgo estabeleceu limite de 1.000.
A Turquia decidiu que as próximas seis rodadas serão com portões fechados. A fase final do Campeonato Ucraniano começou neste fim de semana com portões fechados. O Campeonato da Sérvia também ignora a onda de paralisações. Na Hungria, o governo impediu eventos com mais de 500 pessoas. A liga nacional fechou os portões.
Onde a bola ainda não parou
“Não pode haver jogos. Os jogadores não são super-homens. O Flamengo está no risco,
tivemos contato com uma pessoa, não sabemos o que pode acontecer.
Espero que este tenha sido o último jogo nessa situação”
tivemos contato com uma pessoa, não sabemos o que pode acontecer.
Espero que este tenha sido o último jogo nessa situação”
Jorge Jesus, técnico do Flamengo
Onde a bola ainda não parou
Brasil
121 casos confirmados
121 casos confirmados
Sem padrão. Jogos de Estaduais e Copa do Nordeste são disputados com (e sem) a presença de público.
Argentina
34 casos confirmados
Copa da Superliga com portões fechados. River recusou-se a entrar em campo pela saúde dos profissionais.
Chile
43 casos confirmados
O governo determinou que todos os jogos serão sem torcida no período de 19 de março a 19 de abril.
Rússia
34 casos confirmados
Liga segue com torcida nas arenas. Ontem, a do Zenit até abriu faixa: “Doentes pelo Zenit até a morte”.
Sérvia
31 casos confirmados
O campeonato nacional continua sendo disputado com portões fechados.
Ucrânia
3 casos confirmados
Hexagonal final pelo título e hexagonal final contra o rebaixamento com portões fechados.
Hungria
25 casos confirmados
A recomendação era evitar eventos com mais de 500 pessoas. A liga optou por fechar os portões.
Turquia
5 casos confirmados
As próximas seis rodadas da corrida pelo título serão disputadas com portões fechados.