Jornal Correio Braziliense

Superesportes

A vida de quem não é Alisson

Na contramão do brasileiro eleito melhor do mundo pela Fifa, goleiros de aluguel completam a renda em torneios amadores e em peladas ganhando até R$ 20,50 por hora. Conheça o aplicativo que recruta talentos


Foi-se o tempo em que a nossa indústria da bola era reconhecida apenas pela frabricação de jogadores de linha. Trocamos os pés pelas mãos e, agora, exportamos goleiros em série. Alisson (Liverpool) conquistou no mês passado o Fifa The Best na posição. Ederson (Manchester City) ficou em segundo. Neto é reserva do Barcelona. Mas, por incrível que pareça, a pátria de luvas não consegue suprir a demanda por interessados em assumir as traves na raiz, a essência do futebol brasileiro: a várzea.

A falta de goleiros nos torneios amadores e até mesmo na pelada do fim de semana com os amigos está rendendo dinheiro para investidores ousados, criativos. Eles desenvolveram um aplicativo para alugar guarda-redes, como se diz na língua portuguesa da terra de Camões.

O curitibano Samuel Toaldo, 36 anos, é um dos fundadores do ;Goleiro de Aluguel;, App para dispositivo móvel que possibilita contratar arqueiros. A ideia começou durante a Copa do Mundo da Itália, em 1990. Aos sete anos, queria ser jogador de futebol, mas faltava habilidade para atuar na linha. Samuel virou goleiro, porém, não seguiu carreira. Fez curso técnico de informática e graduação em física. Entretanto, não pendurou as luvas. ;Quando ia jogar com amigos, eu não conseguia sair de lá. Os outros times que chegavam pediam para eu ficar para os próximos jogos;, recorda, em entrevista ao Correio.

Em 2015, ao contar aos colegas de faculdade que era requisitado nas peladas e jogava futebol todos os dias, um amigo disse a Samuel que ele só era chamado para jogar futebo porque as pessoas não gostam de ser goleiros. Foi então que ele decidiu criar uma fanpage no Facebook chamada goleiro de aluguel.

;Amigos compartilharam em grupos do whatsapp até chegar em pessoas que se interessaram e entraram em contato comigo para me contratar. Com um mês, tinha 13 partidas remuneradas. No segundo mês, fiz 15, até que, nos meses seguintes, não dei mais conta de ir a todos os jogos e comecei a convidar outras pessoas;, lembra.

À época, Samuel tinha dívida de uma antiga empresa, no valor de R$ 100 mil. Graças aos valores recebidos no ;bico; como goleiro de aluguel, quitou a quantia. ;Com os primeiros 13 jogos, eu recebi mais de R$ 350. Foi assim que eu vi que podia ter uma renda extra. Fiz negociações para pagar essa dívida e consegui apenas com o dinheiro do goleiro de aluguel. Assim, limpei o meu nome;, ressalta.

Em agosto de 2016, Samuel criou o aplicativo Goleiro de Aluguel para celular em parceria com Eugen Braum, 32. Em 2017, firmaram parceria com o Reality Show Shark Tank, para aspirantes a empreendedores, no qual receberam um impulso financeiro de
R$ 250 mil. Com o financiamento, ambos conseguiram sair do emprego e passaram a se dedicar apenas ao negócio virtual.

;Fizemos um estudo de mercado e descobrimos que, em um período de 30 dias, acontecem cerca de 1 milhão de peladas e 60% delas tinham dificuldade para encontrar goleiros;, conta. Atualmente, são mais de 50 mil goleiros cadastrados e mais de 30 mil contratantes, ou seja, interessados em alugar goleiros. ;Damos emprego para sete pessoas e, indiretamente, para milhares de pessoas;, acrescenta Samuel.

Nova cultura

Em um país que valoriza muito mais os jogadores de linha, Samuel classifica o empreendimento como a implementação de uma nova cultura. ;O brasileiro nasceu para fazer gol, ele não quer defender. Mas, hoje, no futebol amador, os goleiros estão defendendo, estão ganhando dinheiro. Com o aplicativo, colocamos o goleiro como protagonista;.

Os goleiros cadastrados no aplicativo recebem por hora. O valor depende do tempo de utilização do App, quantidade de jogos e a avaliação do jogador. Para os arqueiros novatos, a quantia é de R$ 19,79/h. Os classificados ;goleiros de elite; recebem o preço máximo,
R$ 20,50/h. À medida que o atleta acumula pontos no aplicativo, ele pode trocar por cupons na loja virtual do Goleiro de Aluguel e receber materiais esportivos, como luvas.

Samuel conta que recebe relatos diariamente de usuários satisfeitos com os ganhos. ;Tem goleiro que paga aluguel, faculdade, financiamento da casa própria só com o dinheiro do app. Recebemos foto de uma moto, fotos de pessoas na praia e em viagem de férias;, comemora.


;Descobrimos que, em 30 dias, acontecem cerca de 1 milhão
de peladas e 60% delas tinham dificuldade para encontrar goleiros;

Samuel Toaldo,
36 anos, um dos sócios do app Goleiro de Aluguel


;As pessoas não gostam de ir para o gol revezar e muitos pedem desculpas.
Dizem que não sabem agarrar, que o braço está machucado;

Marcos Vinícius, 30 anos,
melhor brasiliense no ranking do app Goleiro de Aluguel