Jornal Correio Braziliense

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O caos mora no Serejão

Com todo o comando centralizado na figura do senador cassado Luiz Estevão, Brasiliense é o retrato de um clube amador. Atletas e treinadores criticam estrutura, departamento médico e forma de trabalho no Jacaré

Seu Luiz é o dono da bola. É ele quem toma todas as decisões, sejam elas ligadas à preparação física e técnica de jogadores ou a negociações contratuais dos atletas. No Brasiliense Futebol Clube, manda quem pode e obedece quem tem juízo. E seu Luiz é o único que pode. Afinal, é dele que vem toda a grana investida no clube de Taguatinga. Os funcionários, sejam eles de qualquer escalão, são meros mensageiros das vontades do ;todo-poderoso;. Pelo menos é como descreve o atacante Alex Alves (ex-Botafogo, Portuguesa e Cruzeiro) e que vestiu a camisa amarela no ano passado: ; O Jacaré é uma bagunça, em que há muita gente dando pitaco e ninguém com autoridade;.

O senador cassado Luiz Estevão, dono do Brasiliense, age como um cartola de times de fim de semana. O resultado disso é o império do amadorismo. ;Quem está lá dentro é muito pouco comprometido;, critica Heriberto da Cunha, técnico do Jacaré entre julho e agosto deste ano.

Antes dos jogos, seu Luiz, como é chamado pelos empregados, faria as vezes de manager, com direito a preleção antes da partida. ;Para que ter um treinador? Chegam a ser engraçados os sermões que ouvia;, dispara o meia Flávio, dispensado há duas semanas por desavenças com o atual treinador, Reinaldo Gueldini. O jogador ainda afirma que o clima no vestiário é de constante tensão. ;Se as coisas dão errado durante a partida, o elenco sabe que terá que ouvir no intervalo;, revela.

As broncas seriam variadas. Das motivacionais às mais exasperadas. Ofensivas, até. ;Ele (Luiz Estevão) chega a chamar os jogadores de frouxos;, critica Flávio. ;Para alguns, ele pergunta: ;Como você pode se considerar profissional? Você é péssimo.; Uma coisa dessas acaba com a autoestima dos menos experientes;, pondera Alex Alves. Mas Estevão não seria abusado com todo mundo. ;Ele sabe com quem pode mexer. Os atletas mais tarimbados não admitem determinadas coisas. Com esses, ele não faz nada;, afirma o atacante, que atualmente joga no Juventus-SP.

As humilhações, segundo Heriberto da Cunha, não se limitariam aos jogadores. O treinador lembra de episódios lamentáveis envolvendo o antigo patrão e o ex-gerente de futebol Paulo Henrique, demitido na mesma leva que ele. ;Ele falava coisas absurdas, que ninguém merece ouvir. Se o Luiz se dirigisse a mim naqueles termos, eu pediria demissão na mesma hora;, comenta, sem, no entanto, revelar o teor da lavação de roupa suja.

Modelo de gestão


Luiz Estevão, no entanto, nega que fale qualquer coisa nos vestiários. ;Eu faço questão de ir lá antes, durante e depois das partidas. Estão todos sob meu comando, mas vou apenas para observar como o trabalho de cada um está sendo executado;, explica o cartola. Quanto à centralização do poder dentro do clube, ele é enfático: ;Esse é o modelo de gestão do Brasiliense. Já ouvi técnicos e jogadores reclamando que em outros lugares há muita gente mandando. Aqui, é uma só pessoa e será dessa forma enquanto a gestão estiver sob meu comando;, finaliza Estevão.

Clube sem palavra


Os jogadores insistem em dizer: O que se fala durante as negociações com o Brasiliense não se escreve. O atacante Fábio Júnior (ex-Cruzeiro, Atlético-MG e Seleção Brasileira) que o diga. O jogador foi informado de que não faria mais parte do elenco amarelo quando as ;rédeas do vestiário;, na medida do possível, ainda estavam nas mãos de Heriberto da Cunha. ;Tratamos de agilizar uma negociação. Conseguimos acertar com o Santo André. Estava tudo definido, só faltava receber a liberação;, comenta Wagner Cruz, empresário do atleta.

Foi aí que o pesadelo começou. A definição da transferência para o time do ABC paulista dependia da volta de Luiz Estevão, que estava em uma viagem. E, quando Estevão chegou à Brasília, a conversa mudou. ;Ele se negou a cumprir o acordo. Ficou enrolando, até que o Santo André perdeu o interesse;, reclama Cruz. Quando Fábio Júnior não figurava mais nos planos do Ramalhão e a janela de negociações para a Série A se findava, a diretoria do Brasiliense propôs-se a dar fim ao imbróglio. ;Dessa vez, nós recusamos a desfazer o vínculo;, afirma o empresário. De carta fora do baralho, o atacante passou a titular de Reinaldo Gueldini. Mesmo com a situação de seu jogador resolvida, Wagner Cruz pondera sobre a estrutura do time candango. ;A centralização é o maior entrave para o crescimento do clube. Não tem ninguém para resolver, e as coisas são feitas de acordo com o humor do proprietário;, dispara.

Calote

O meia Alex Oliveira (ex-Vasco) diz que também teve problemas em sua passagem pelo Jacaré. Seu contrato com o time de Taguatinga, firmado em 2005, previa um subsídio para o aluguel da moradia. Os repasses foram realizados sem problemas no início da relação, mas depois a fonte secou. ;Fiquei dois meses sem esse dinheiro. Como o contrato estava no meu nome, era eu quem tinha que lidar com as cobranças do proprietário;, reclama. Hoje, o jogador diz ter aprendido a lição e se diz muito mais cauteloso na hora de assinar com qualquer clube.

Questionado sobre a declaração de Alex Oliveira, Luiz Estevão afirma desconhecer qualquer problema com o repasse do dinheiro. ;Nunca fui informado de nada dessa natureza. Todos os jogadores têm meu telefone e a liberdade de conversar comigo;, garante.

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