Caso o novo Estatuto do Torcedor seja aprovado, cambistas ou pessoas que comercializem ingressos pelo preço superior ao do estampado no bilhete ou que desviem ou facilitem a venda de entradas de convites poderão ser condenados a pena de um a quatro anos de reclusão. O projeto tramita no Senado.
O trabalho de cambistas na porta dos estádios é um dos maiores problemas na venda de ingressos para o Ministério do Esporte. E é criticado também por Walter Balsimelli Neto, um dos donos da BWA, empresa responsável pela Ingresso Fácil, que detém a venda de ingressos em cerca de 90% dos estádios do Brasil. "Torcedor faz questão de comprar ingresso na mão de cambista, que não é posto oficial. Ele é parte do crime também."
Para o jornalista esportivo Juca Kfouri, o problema dos cambistas envolve também outras esferas do mundo futebolístico. "Há uma cumplicidade entre quem vende e quem promove o espetáculo e esses cambistas. São as mesmas pessoas. É um grande esquema que frauda o cofre do clube e que beneficia o bolso do cartola [dirigente do clube]", afirmou.
Segundo Kfouri, cambistas há em toda parte do mundo, mas no Brasil eles se diferenciam por serem "cambistas em consignação". "Os ingressos que, em tese, deveriam ;morrer; na mão dele, ele [cambista] devolve e é ressarcido. O cambista, pelo mundo afora, corre pelo menos um risco: se a procura não for aquela que ele imagina, ele começa até a vender ingressos a preços mais baixos do que comprou para não ficar com todos os ingressos. Aqui não. O cara não baixa o preço, no máximo ele chega ao preço [real] do ingresso. Se não conseguir vender, ele devolve na bilheteria", criticou o jornalista.
Segundo o assessor-chefe da Fundação Procon em São Paulo, Carlos Augusto Coscarelli, as soluções para evitar que os ingressos fiquem nas mãos de cambistas passam pela "identificação do consumidor nos ingressos e a comercialização individualizada". Ele também defende que o torcedor compre os ingressos diretamente nos postos de vendas oficiais, disponibilizados pelo clube mandante da partida.
"Até nos países de primeiro mundo você encontra a atividade de cambista. Mas, no momento em que ele passa a desempenhar um papel principal na comercialização dos ingressos, é que isso se transforma numa coisa muito preocupante", afirmou o promotor Rodrigo Terra, do Rio de Janeiro.
Na opinião do promotor, uma das causas desse problema é a falta de profissionalismo na comercialização dos ingressos. "E isso acontece porque o clube, de certa forma, impede que o organizador do evento, que é um dirigente do clube, seja responsabilizado", reclamou.
Para Juca Kfouri, outro defensor do clube-empresa, as sanções ao cambista previstas no Estatuto do Torcedor podem até ser consideradas um avanço, mas ainda são menos importantes do que a punição aos famosos cartolas do futebol.
"É menos importante que haja punição ao cambista e mais importante que haja punição a quem é cumplice do cambista, a quem o acoberta e a quem o alimenta. Você vai pegar o cara visível que está ali no asfalto vendendo ingresso. Mas o cara que está por trás dele, que é o dirigente, escapa incólume."
O Estatuto do Torcedor, criado em 2003, sofreu alterações e já foi aprovado na Câmara dos Deputados e na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado. Falta ainda ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário pelos senadores, seguindo depois para sanção do presidente da República.