Clelson Veras Gomes, 31 anos, é zagueiro e está há 880 minutos - ou 11 jogos completos - sem tomar nenhum cartão amarelo. Tal desempenho já seria um feito e tanto em qualquer campeonato de futebol do mundo. Mas Clelson não atua em qualquer campeonato de futebol do mundo. Ele marca os atacantes adversários no campão de terra onde acontecem os jogos da Liga Amadora de Sobradinho II. É uma terra hostil, com todos os ingredientes de tensão e conflito que marcam as peladas Brasil afora, desde as mais sérias até as mais descompromissadas.
Ao
Correio, o zagueiro mais fidalgo do futebol amador do DF contou seu segredo. "Jogo duro, mas sem violência. Sou da paz. O segredo é saber se posicionar bem. Eu procuro cobrir os espaços vazios e pegar a bola quando ela passar por mim", revela o beque do Atlético A, de Sobradinho II, lÃder do campeonato.
Nem mesmo o sol quente, o tempo seco e o poeirão que levanta do campo de terra fina em dias de jogos cortam a fleuma do zagueirão. "Tudo isso não me desanima. Até sinto falta. Passo a semana toda rezando para que chegue logo o domingo, dia de jogo. Para mim, o futebol amador é diversão, mas que levo muito a sério. É uma válvula de escape para esquecer os problemas, as contas. Sou apaixonado por futebol. Comecei a jogar bola aos 10 anos, na rua onde morava, e desde então não parei nem vou parar", conta Clelson.
Para o senhor fidalguia, bom zagueiro é aquele que evita a criação de possibilidades de gol pelo ataque adversário. E, meio constrangido, admite que nem sempre quem atua ali atrás possui técnica com a bola. "Isso colabora com a má fama dos zagueiros", comenta o morador de Sobradinho II, bombeiro hidráulico nas folgas do futebol. No caso dele, porém, a máxima não é verdadeira, pois dizem que tem bom passe e alguma visão de jogo.
Admirado pelos amigos pela serenidade e companheirismo, todos os jogadores do time, sem exceção, o têm como exemplo. "Ele é muito querido e disciplinado. Nós aqui somos uma famÃlia. O Clelson é companheiro dentro e fora do campo. Está sempre presente. Acredito que sua excelente forma fÃsica o ajude a ser preciso nos passes e tiradas de bola", analisa o técnico do time, Cleber Gomes.
Torcedor do Flamengo, ele é fanático por futebol e não perde uma partida na televisão, mesmo que seu time do coração não esteja em campo. "Assisto a todos. Não importa o time que esteja jogando. Gosto de observar como os jogadores roubam e passam a bola. É uma forma de aprender e me aperfeiçoar", anima-se o zagueiro que não bate, não toma cartão e não dá chutão pro mato, que o jogo é de campeonato.
Cachaça e bola
Conhecido por não ser levado a sério por alguns - há quem chegue alcoolizado para jogar -, o futebol amador dá sentido à vida de outros. "Tem gente que vai para o jogo direto da farra. Chega bêbado e joga. Além de perderem o reflexo, eles ficam de cabeça quente por pouca coisa. AÃ, sempre acaba em briga. Eu levo o futebol muito a sério. Para mim, não é brincadeira. Jogar me faz muito bem. Faz eu me sentir vivo. Bebida para mim, só depois do jogo. Antes, não dá. Atrapalha o rendimento", explica Clelson, que já passou por todas as posições e terminou na zaga.
Quem é ele
Clelson Veras Gomes
Idade: 32 anos (23/10/1976)
Altura: 1,87 m
Peso: 86 kg
Posição: zagueiro
Proeza: está há 11 jogos do Campeonato de Futebol Amador de Sobradinho sem tomar nenhum cartão
Será que ele resiste?
A próxima partida do senhor fidalguia será no próximo domingo contra o Liga 17, às 9h15, no campão de terra, ao lado do cemitério de Sobradinho II.