Jornal Correio Braziliense

Superesportes

Enquanto aguarda julgamento, Rebeca Gusmão aprende a gostar de futebol

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Quando, no início de setembro do ano passado, a brasiliense Rebeca Gusmão soube que havia sido banida da natação por ter sido considerada culpada em dois casos de doping (2006 e 2007), muita gente pensou que o assunto estava encerrado. Na verdade, desde então, a vida da atleta, pelo menos nas piscinas, entrou em um estado de suspensão. E será assim até o próximo dia 17, quando a Corte Arbitral do Esporte (CAS) julgará, em Lausanne, na Suíça, os recursos da atleta. Disposta a tocar a vida fora das piscinas, Rebeca Gusmão (UniCeub e Decel), 24 anos, magoada e sentindo-se massacrada pelas notícias publicadas desde que o caso de doping no Pan do Rio-2007 tornou-se público, foi buscar em um outro esporte forças para seguir em atividade. E encontrou nos gramados dos campos de futebol uma nova motivação. Em setembro, no mesmo mês em que foi banida pela Federação Internacional de Natação (Fina), Rebeca ingressou no time de futebol feminino do UniCeub. Em meados de novembro, juntou-se a uma outra equipe, a Ascoop, da Associação Atlética Esportiva e Recreativa dos Cooperados do Distrito Federal. E é com esse segundo time que ela embarca hoje para uma série de cinco amistosos no Rio de Janeiro, que servirão de preparação para o Campeonato Brasiliense, previsto para começar na segunda semana de abril. Na capital carioca, a Ascoop enfrentará o Cepe Caxias, a Portuguesa (da Ilha do Governador), o Chicago (equipe norte-americana com filial no Brasil) e o Campo Grande, além de jogar com um time dos Estados Unidos, o Ohio. Nos últimos seis meses, Rebeca, que atua como atacante, tem suado a camisa com as companheiras das duas equipes em treinos e jogos. Tanto que ela emagreceu e hoje ostenta o mesmo porte físico de quando ralava na natação. ;Quando comecei no UniCeub, estava com 98kg. Hoje estou com 85kg. Perdi 18kg de gordura e ganhei 5kg de massa muscular. Já estou vendo os gominhos da barriga de novo;, brincou a atacante. A rotina de treinos no futebol é intensa. Quando nadava, Rebeca costumava treinar seis horas por dia, entre trabalhos na piscina e na academia. Hoje, joga futebol quase todos os dias, correndo atrás da bola em média cinco horas diárias entre a preparação do UniCeub e a do Ascoop. ;Estou dobrando os treinos no futebol. Minha vida não ficou sossegada porque eu saí da natação e fui jogar bola. Só a minha alimentação é que mudou muito;, contou Rebeca. ;Quando eu nadava, minha alimentação era certinha. No futebol, como queimo mais calorias, fica mais fácil manter o peso. Eu emagreci só com os treinos mesmo. Não fiz nenhuma dieta;, detalhou. Rebeca sabe que não é nenhuma Marta, a brasileira eleita três vezes a melhor jogadora do mundo pela Federação Internacional de Futebol (Fifa). Mas o técnico da Ascoop, Pablo Rizza, ressalta que ela é uma atleta exemplar. ;Por ser uma esportista de alto nível ela tem uma outra mentalidade;, explica Pablo. ;A postura dela é espetacular. Em termos táticos, eu mostro o que deve ser feito e ela executa. A Rebeca tem evoluído muito. Não é uma craque. Mas nunca falta aos treinos, ajuda as outras jogadoras e por ter seguido uma carreira profissional por muito tempo na natação, procura sempre passar um pouco disso para as companheiras;, elogiou Rizza. ;Além de tudo, ela é muito humilde. Em nenhum momento pediu regalias por ser uma pessoa famosa. Pelo contrário. Ela se esforçou muito para baixar o peso e, para mim, tem sido muito gratificante trabalhar com ela.; Adrenalina Rebeca tem de parar para fazer as contas de quantos gols já marcou na recém-iniciada carreira de atacante. Ela hesita por alguns instantes, busca na memória e chega a um número: ;Foram cinco. Quatro no campo e um no futsal;, contabiliza. ;É difícil fazer muitos gols porque tem sempre umas três me marcando. Mas, pelo menos eu abro espaço para as outras. Acho que o objetivo é esse mesmo;, analisa. Questionada qual é a melhor sensação, bater na borda da piscina na frente das rivais ou estufar as redes adversárias, a brasiliense respondeu: ;Quando marco um gol, sinto que marquei porque o time ajudou. Eu sei que precisei de mais 10 pessoas para fazer o gol. Acho que o gol é do time;, ressaltou. ;Quando eu batia na borda da piscina, aquele tempo era meu, fruto do meu trabalho. Quando faço um gol, a adrenalina é muito diferente. Eu corro, pulo, grito. Na piscina não tem muito o que fazer, a não ser ficar comemorando lá dentro; comparou. A brasiliense não sabe o que será da sua vida a partir do dia 17, quando o julgamento do recurso na Suíça terminar. Mas, hoje, depois de tudo o que viveu, tem a certeza de que, caso o veredito seja desfavorável, não se deixará abater por um novo turbilhão de emoções negativas. ;Se não der certo vou continuar jogando bola. Vou continuar me desafiando para ver até onde eu posso chegar;, explicou. ;Hoje eu sou uma pessoa muito feliz, independentemente do que aconteça lá. Nunca tive amigos em Brasília e hoje tenho vários. Tenho dois times de futebol, onde fiz várias amigas. Isso ajudou a curar a ferida do que aconteceu comigo dentro da natação;, finalizou.