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Marcenaria a dois


Saciar uma vontade antiga de aprender marcenaria e, ao mesmo tempo, ajudar uma amiga. Foi isso que Lucas Farias Borges, 30, professor de educação física, fez nesta quarentena. Afastado do trabalho, por conta da pandemia, ficou muitos dias em casa sem fazer nada. Enquanto isso, a amiga Beatriz Miranda, 22, assistente comercial e estudante de arquitetura, havia acabado de se mudar para uma quitinete sem armários na cozinha.

A despensa de Beatriz eram caixas organizadoras, e o balcão, que divide a cozinha do resto do apartamento, ficava cheio de coisas em cima. “Acumulava muita poeira”, conta Lucas. “Não era tão higiênico”, complementa Beatriz. Lucas viu aquele problema da amiga como uma oportunidade: “Pensei: sempre quis, estou com tempo, tem uma situação, é agora”.

E assim surgiu a ideia de fazer um armário de cozinha para Beatriz. Mas deixou claro: “Não sou profissional”. Lucas abasteceu-se de ferramentas, e os dois compraram os materiais e colocaram a mão na massa. “Não tinha nem um parafuso aqui em casa”, brinca o professor. “Comprei furadeira, serra elétrica. Fiz esse investimento, que ficará para quando precisar instalar alguma coisa em casa, consertar alguma outra. Às vezes, a gente paga uma diária para alguém fazer três furos na parede.”

E a dupla se empolgou tanto que a ideia de fazer só um armário de cozinha se expandiu. Sobrou madeira e fizeram sapateira, aparador, pendurador de bolsas e casacos. Como estudante de arquitetura, Beatriz sempre teve curiosidade pela marcenaria, o que coincidiu com o desejo de Lucas. “Quando vinham fazer algum trabalho aqui em casa, sempre ficava observando para ver como era”, conta a jovem.

Tratamento contra a depressão

O aprendiz de marceneiro lembra que passou duas semanas vendo vídeos tutoriais e, só depois, colocou em prática. Ao comprar os materiais, conversou muito com os vendedores para tirar dúvidas e pegar dicas. O trabalho mais pesado, como o de cortar as peças de madeira, foi executado exclusivamente por ele, mas Beatriz ajudou em tudo.

Além de resolver o problema que tinha dentro de casa, Beatriz é grata ao amigo por ter lhe dado uma distração. “Ele me resgatou, eu não tinha ânimo para fazer nada. Foi muito importante descobrir tudo com o Lucas.” A estudante vinha de um processo depressivo, agravado com a pandemia. A marcenaria que o professor trouxe para a vida dos dois fez com que ela ocupasse a mente e se sentisse melhor. “Isso me serviu como um tratamento, foi uma terapia. Levantou-me, foi uma coisa que descobrimos que gostamos de fazer”, conta Beatriz.

Além de tudo, a iniciativa conectou Lucas e Beatriz a outras pessoas, que se inspiravam na dupla e tentavam, também, executar um trabalho de marcenaria. Muitas entravam em contato para tirar dúvidas e dar dicas. “Eu vi que nós influenciamos pessoas. Umas amigas começaram a fazer seus próprios móveis, conforme eu postava o nosso trabalho”, conta Beatriz. E também receberam sugestões. “Estávamos passando um produto com pincel e um conhecido mandou mensagem dizendo que tinha que ser com rolo. Testamos e ficou muito melhor”, relembra Lucas.

Bordando novas opções

O período de isolamento social foi crucial para a publicitária Victoria Franco, 24, aprimorar uma recente habilidade e interesse pessoal: o bordado. Sua primeira experiência com a técnica aconteceu no final de 2019, durante uma festa do pijama. “Uma de nossas amigas é supertalentosa e faz vários trabalhos manuais. Pensamos que ela poderia nos ajudar a bordar durante nosso encontro. Compramos tudo e ficamos um bom tempo bordando, começamos às 17h e fomos noite adentro.”

Desde então, Victoria passou a seguir, nas redes sociais, diversos perfis de bordado livre que faziam postagens sobre o trabalho manual. Porém, foi só durante a pandemia, quando precisou ficar em casa, que a atividade passou a ser praticada com frequência. “Eu gostava muito de ir pra rua, e não dá para bordar lá. Com o tempo em casa, comecei a sentar ao lado da minha mãe, e, enquanto ela fazia crochê, eu bordava. Foi um tempo em família”, explica.

Com o desenvolvimento da aptidão, a publicitária passou a ver mais tutoriais e a tentar novas modalidades da atividade. Nessa procura, descobriu os bordados de arco-íris em uma das contas que seguia. Ela achou que o item seria perfeito para presentear o bebê de uma amiga que ia nascer.

A ideia desse tutorial era utilizar restos de materiais, mas, como Victoria não tinha na quantidade necessária, comprou os itens em um armarinho e descobriu uma nova — e simples — paixão. “É mais fácil do que os bordados no tecido. A parte mais difícil são as medidas, porque não pode errar, mas, depois de cortar os barbantes, é super-rápido”. Ela compartilhou o resultado do primeiro arco-íris em seu perfil no Instagram (@viic.franco) e, do retorno que recebeu, surgiu outra iniciativa.

Diversas pessoas demonstraram interesse no item para decoração, inclusive, gente que não era tão próxima ou com quem Victoria não tinha contato havia bastante tempo. “Eu tinha várias linhas em casa e pessoas interessadas, então pensei em vender. No começo, meu objetivo era zerar o prejuízo da compra do material e continuar a produzir os arco-íris, mas o que eu faria com 300 deles em casa? Aí comecei a divulgar no Instagram”, conta.

Diversificando

Dessa divulgação outros pedidos surgiram, como um móbile de arco-íris. Esses novos projetos, apesar de mais complexos e desafiadores, deixam a jovem entusiasmada e geram mais ideias. “Também fiz uma flâmula com bordado para a filha do meu chefe — minha mãe fez a flâmula e eu bordei. Pretendo, ainda, dar bordados para amigos, já prometi alguns.”

Ela explica que o bordado virou uma verdadeira terapia durante a quarentena. “Você gasta muito tempo fazendo, mas é um trabalho manual que desestressa a cabeça. Às vezes, o mais difícil é escolher a cor, o ponto antes de começar, mas, durante a atividade, é relaxante.” Victoria afirma que até dorme melhor nos dias em que faz a atividade.

Para continuar aperfeiçoando a habilidade, ela já definiu alguns dos próximos itens que tentará desenvolver, como cactos de macramê, que encontrou durante suas pesquisas; camisetas com bordados, que serão presentes para uma amiga; e outros objetos que demonstram afeto em um período de distância.