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Conheça famílias que amam o Natal e vivenciam a data com união e tradições

O Natal inspira essas famílias em suas tradições que, além, de deixarem a data mais emocionante e animada, promovem ainda mais a união entre os entes queridos

Ailim Cabral, Silvana Sousa*
postado em 22/12/2019 08:00
O Natal é uma das poucas datas comemorativas celebradas em praticamente todo o mundo que parece ter uma fórmula mágica: pratos especiais, família reunida, troca de presentes e o sentimento gostoso de acolhimento. Por isso, tem impacto positivo para a saúde mental em lares em que a harmonia é preservada, como defende a psicóloga Débora Porto. ;Um exemplo são os ritos familiares, que fazem sentido ao mostrarem ao indivíduo que ali, com sua família de origem ou escolhida, ele pode se descobrir e entender mais sobre sua identidade.;

Cada família, uma tradição. Enquanto na Cruz a herança do avô que se vestia do Bom Velhinho uniu toda a família em um negócio coletivo; no núcleo dos capixabas Magalhães Mendes, o Natal tem gosto de ancestralidade com os bolinhos de bacalhau preparados há várias gerações.

E como toda tradição tem um começo, o Oscar dos Vieira Lima é um exemplo de como ideias simples podem se tornar o momento mais especial e memorável das noites de Natal. A Revista convida você a conhecer a história dessas famílias que levam o Natal tão a sério que, em vez de presentes, ganham algo muito mais valoroso: momentos de união.

A verdadeira família Noel

Abílio Cruz encarna o Papai Noel há 27 anos e hoje conta com a companhia da mulher, Gelsina; da filha Márcia; e dos netos Gusthavo e Eduardo
E quem disse que Papai Noel não é real? Não só ele, mas toda a família Noel? Pois eles não só existem como moram no Planalto Central. A família Cruz passa o ano inteiro esperando a chegada de dezembro para que parte dos integrantes possa vestir seus trajes e mostrar o quanto celebra o Natal em sua totalidade.

Tudo começou há 27 anos. O hoje aposentado Abílio Cruz Pinto, 76 anos, via o sogro trabalhando como Papai Noel no ParkShopping e tinha o sonho de um dia poder ser o Bom Velhinho. Ao comentar o desejo com uma pessoa para quem estava construindo um depósito, ouviu as palavras mágicas: ;Então você vai ser o Papai Noel da minha loja, vou comprar o tecido e você manda fazer a roupa;.

Empolgado, Abílio se entregou à tarefa. A esposa, a consultora Gelsina Olívia de Paiva Cruz, 63, costurou o primeiro traje e ali nascia a vocação de Bom Velhinho. Dois anos depois, ele foi convidado para trabalhar no shopping, revezando-se com o sogro, e nunca mais deixou o ofício de lado.

Há alguns anos, membros da família vêm embarcando no que hoje pode ser considerado um negócio familiar. Em 2019, os Cruz tomaram conta de vez do ParkShopping ; ao todo, são cinco integrantes exercendo o ofício natalino.

Gelsina, que já foi a filha do Papai Noel, se tornou, pela primeira vez, a Mamãe Noel. Com olhar carinhoso, acompanha o marido na atenção com quem quer fazer um pedido especial. Para ela, trabalhar ao lado de Abílio e dividir com ele o amor pelo Natal é um momento especial de união. ;É um prazer! É gratificante receber tanto carinho e ver tanta alegria nos olhos das crianças.;

Os netos do Bom Velhinho


Os estudantes Gusthavo Tolentino Cruz, 19, e Eduardo da Cruz Pimentel, 18, trabalham como ajudantes do Papai Noel. Na vida real, são netos de Abílio, que, para eles, não importa o que digam, é, de fato, o Noel. ;Quando éramos crianças, tínhamos o maior orgulho. Queria contar a todo mundo, especialmente às outras crianças, que o Papai Noel era o nosso avô;, lembra Eduardo, rindo.

O rapaz trabalha com a família pela primeira vez e se sente grato pela oportunidade no que chama de ;época mais feliz do ano;. Apesar de o serviço no shopping ser cansativo, o jovem diz que presenciar o entusiasmo das crianças é extraordinário.

Para Gusthavo, que está em seu segundo ano como ajudante do Papai Noel, estar ao lado do avô e do restante da família é a realização de um sonho. ;Desde pequeno, eu o via trabalhando e sempre quis participar. Tive que esperar completar 18 anos, mas, assim que pude, aproveitei a chance de ver de perto aquela felicidade.;

Do que Gusthavo mais gosta é de ver o espírito natalino se mantendo vivo nas crianças e da alegria que o avô sente ao fazer parte daquele momento. Filha de Abílio, a professora Márcia Olívia da Cruz Pimentel, 46, é a substituta da mãe como Mamãe Noel e assegura: ;Isso mantém o meu pai vivo;.

Pela primeira vez, Márcia e Gelsina tiveram a oportunidade de encarnar a Mamãe Noel ; só este ano o shopping trouxe a companheira do Bom Velhinho ;, e a professora conta como se emocionou com o contato com as crianças. ;Uma delas passou a mão no meu rosto, fazendo carinho e disse que nunca tinha me visto (a Mamãe Noel) e que eu era linda.;

Márcia afirma que é impossível não ficar tocada com alguns pedidos e hoje percebe por que o pai ama tanto o trabalho que faz. ;O amor dele pelo Natal sempre foi contagiante, mas poder fazer parte disso com ele é mágico.;

Um sonho real


Sorrindo, Abílio conta que a alegria do espírito natalino vem desde a infância. Os pais, muito católicos, montavam presépios todo o ano e nunca deixaram de celebrar o Natal. O entusiasmo contagiou Abílio, que transmitiu a tradição para o restante da família. ;Passa um Natal e a gente já fica esperando o outro;, ri.

Por 45 dias no ano, em média, Abílio realiza seu sonho. ;Não consigo colocar em palavras o quanto é gratificante, faço por amor. Eu gostaria mesmo é de ser o Papai Noel de verdade;. E a semelhança já se tornou difícil de ignorar. Mesmo sem o traje vermelho, o rosto bondoso com barba branca evoca a imagem do Bom Velhinho. Depois de 12 anos com barba artificial, por causa do trabalho em construções, Abílio pôde cultivar os fios brancos naturais, após se aposentar.

E Abílio, assim como o Papai Noel, não descansa na noite de Natal. No dia 24, enquanto todos estão reunidos com as famílias, ele participa de eventos diversos, distribuindo presentes e fazendo a sua parte para manter o espírito natalino e a magia nos corações das pessoas. Depois da meia-noite, é a hora de se encontrar com a própria família.

E eles estão, religiosamente, reunidos esperando pelo patriarca. A família Cruz nunca ceia à meia-noite, eles sempre esperam Abílio, ou melhor, o Papai Noel chegar para começar as comemorações e só iniciam a festa quando estão todos juntos. ;É emocionante vê-lo chegando. Desde criança até hoje, fico ansioso esperando. É meu avô, o Papai Noel, vindo passar aquele momento com a gente;, conta Gusthavo.

Gostinho de casa


As primeiras lembranças dos natais em família das irmãs Carla Mendes, 48, Amélia Cristina, 47, e Sandra Mendes de Magalhães, 46, têm cheiro, gosto e um quê de saudade. Carla conta que em uma casa pequena de fundo, no interior de Praia Grande, no Espírito Santo, a bisavó Almerinda Neves ; carinhosamente chamada pelos netos de Vó Ita ; começava os preparos para a ceia ainda nas primeiras horas da manhã, sempre alegre e lúcida. O peixe era desfiado com calma, e o cuidado transparecia no gosto do seu famoso bolinho de bacalhau, que hoje é receita de família: ;Tinha gosto de afeto;, relembram.

O preparo da receita se repetia ano após ano, até que, devido ao avançar da idade, Almerinda não conseguiu mais cozinhá-lo sozinha. Era hora de passar o legado. ;Uma cena que nunca saiu da minha mente é da bisa, se locomovendo com dificuldade e auxiliada por andador, indo orientar minha avó Cissinha para ver se o ponto do bolinho estava certo, pois, se tivesse mais batata que bacalhau, não era o bolinho da família;, lembra Amélia.

Ela conta ainda que, quando o ponto estava aprovado e avó Cissinha era liberada para continuar a receita, a bisavó sentava e a ajudava a enrolar os bolinhos. ;Nós, crianças, também participávamos desse momento e, até hoje, eu deixo que minha filha me ajude a enrolar os bolinhos, quando faço a receita, para que, quando crescer, ela repita nossa tradição na casa dela;, diz.
As irmãs Carla, Amélia e Sandra ainda hoje se reúnem no Natal para comer os bolinhos de bacalhau, receita da bisavó, que atravessa gerações

Rituais mantidos


Como a passagem de tempo chega para todos, a infância das irmãs ficou para trás e, com ela, as lembranças dos tradicionais natais organizados por vó Cissinha e vó Ida, ambas já falecidas. O curso da vida também levou cada irmã para um canto do país: Carla se tornou cirurgiã em Brasília; Amélia Cristina mudou-se para Vitória da Conquista (BA), onde exerce a medicina; e Sandra achou seu recanto em Manaus, onde se casou e teve o filho, Heitor Augusto, hoje com 18 anos.

A saudade e a distância fizeram com que a volta ao Espírito Santo durante as celebrações de fim de ano se tornasse obrigatória, tanto para reviver o sabor do bolinho que hoje é preparado pela mãe, Ignez Maria, quanto para compartilhar com os filhos a essência e a tradição da família Magalhães Mendes.

Na ceia, que é sempre farta, outras receitas também ocupam seu lugar na memória afetiva da família, como o peru recheado do pai e a rabanada da mãe. Troca de presentes e ida à Missa do Galo também fazem parte do combo natalino. ;Fazemos questão de relembrar nossos laços nessa data. Na hora da troca de presente, sempre temos que fazer uma cartinha para a pessoa, e a Missa do Galo é programação obrigatória, pois na nossa família a data é religiosa;, conta Carla.

Para a cirurgiã, todos esses momentos representam a cultura e a história dos Magalhães Mendes. ;Por nossa família ter um forte apelo gastronômico, costumo falar que o Natal tem gostinho de família. As outras datas até passam, mas, nesta época do ano, a gente sempre dá um jeito de se encontrar e, mesmo que não dê para comemorar juntos no dia 25, repetimos todos as receitas que lembram nossa família.;

E o Oscar vai para... os Vieira Lima

Família Vieira reunida

A família de veia artística na qual nasceram as irmãs Alice Vieira Lima, 21, e Letícia Vieira Lima, 24, sempre buscou inovar quando assunto é Natal. Apesar de apresentações de dança, troca de presentes e shows ao vivo com os membros mais talentosos fazerem parte das noites natalinas, os Vieira Lima só encontraram uma tradição para chamar de sua em 2011, quando Alice e Letícia decidiram lançar o ;Oscar da Família;.

;Nós sempre vamos passar as festas de final de ano em São Luiz, no Maranhão, onde a maior parte da família mora. Certa vez, quando fomos decidir quais seriam as brincadeiras da noite, pensamos nesse Oscar, com categorias que se identificassem com a personalidade de cada um;, conta Letícia, que vê o prêmio como uma maneira de aproximar ainda mais a família.

A jovem conta que, no começo, as categorias eram mais genéricas. Aos poucos, o Oscar foi absorvendo as individualidades dos parentes. ;A brincadeira começou a ser uma forma de atualizar a família sobre o que aconteceu com cada integrante durante o ano, assim os prêmios são mais sobre as conquistas dos nossos tios e primas ao longo ao ano do que sobre como eles são no dia a dia;, explica Alice.

Nascidas em Brasília, mas moradoras do Rio de Janeiro, as irmãs são as responsáveis por apurar tudo que aconteceu com os familiares durante o ano, assim como definir qual será a estatueta ; um brinde ou algo do gênero ; e preparar os power points que anunciam os ganhadores da cerimônia que elas mesmo apresentam. ;Tentamos não deixar tão na cara quem ganhou o quê. Procuramos manter o suspense. E, nessa história, já passamos por várias categorias inusitadas, como ;Brilha uma estrela;, ;Anfitrivida; e o ;Rei do hambúrguer;;, conta Letícia.
Idealizado pelas irmãs Letícia e Alice, o %u201COscar%u201D da família Vieira Lima reúne todos os parentes

Homenagens

Há alguns anos, a comemoração ocorre na casa da servidora pública Gisele Fernanda Vieira Lima, 46, que também é a responsável pela decoração da casa e da ceia ; tarefa que rendeu a ela os prêmios de ;Blogueira do ano; e ;Decoradora n; 1;. ;O último foi em um ano que minhas decorações começaram a chamar a atenção e algumas pessoas se interessaram no meu trabalho. Foi assim que montei uma pequena empresa de decoração;, relembra a tia.

Outra que faturou prêmios inusitados foi Letícia, que se orgulha de ter ganhado a categoria ;Julius; ; alusão ao personagem do seriado Todo mundo odeia o Chris, na qual o personagem Julius tem dois empregos ; no ano em que fez dois estágios simultâneos. ;Foi um época bem puxada, mas na qual ganhei muita experiência, o que foi muito importante, porque eu estava no final da minha graduação;, conta a designer.

De ;Oscar da Família;, o prêmio passou a se chamar ;Osmar Lima;, em homenagem ao avô que faleceu que era a alegria da família. ;Ele era um sujeito elegante e muito alegre, havia ganhado as categorias de ;Melhor dançarino; e ;Figurino mais elegante;, pois sempre estava bem-vestido, tinha aquele típico jeito de malandro carioca ; calça de linho, sapato combinando e chapéu. A homenagem é uma forma de entender melhor a saudade e manter viva a sua memória;, conta Alice com carinho.
*Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte

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