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Como as redes sociais podem impactar na saúde dos usuários?

Pesquisadores analisam como as redes sociais podem impactar na obesidade, no consumo de bebidas alcoólicas, no fumo e até mesmo no conceito de felicidade

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Vivemos em rede desde os mais remotos tempos, e o sucesso da espécie humana depende de sua capacidade em fazer relações sociais, capacidade que é vista como uma vantagem evolutiva. Indivíduos no centro de uma rede social têm mais acesso à informação, e no caso dos nossos ancestrais, essa informação poderia ser, por exemplo, o local de uma nova fonte de alimento. Entender melhor como funcionam as redes sociais permite-nos entender também como elas podem influenciar importantes problemas de saúde pública, área recente do conhecimento chamada de epidemiologia social. Nos últimos anos, riquíssimos estudos nessa área vêm sendo publicados por pesquisadores das universidade da Califórnia (Fowler GH) e de Harvard (Christakis NA) junto a outros colaboradores nos mais renomados periódicos científicos do mundo.

Ainda no ano de 2007 (NEJM 357;4), eles demonstraram que a rede social de um indivíduo tem impacto no seu risco de tornar-se obeso em até três graus da rede (ex: amigo do amigo do amigo). Essa associação é muito mais forte pela proximidade social do que pela geográfica, como é o caso de vizinhos. A chance de uma pessoa se tornar obesa é 57% maior se um amigo se tornou obeso num dado período. Entre irmãos, a chance é 40% maior e, no caso do cônjuge, a chance aumenta em 37%.

No ano de 2008 (NEJM 358;21), os pesquisadores demonstraram esse mesmo efeito de contágio social na chance que uma pessoa tem de parar de fumar. Quando um dos membros de um casal para de fumar, o outro tem uma chance 67% maior de parar também. O indivíduo tem 25% mais chances de parar quando um irmão/ irmã também para, 36% mais chance quando um amigo para e 34% mais chance quando um colega de trabalho para. Ainda em 2008, os pesquisadores também demonstraram o efeito de contágio social na capacidade de uma pessoa se considerar feliz (BMJ) . Há uma tendência de pessoas felizes estarem no centro de suas redes sociais e próximas de outras com alto grau de felicidade, criando aglomerados de pessoas felizes. Além disso, ao longo do tempo, as pessoas ficaram mais felizes quando passaram a ser cercadas por outras felizes. Um amigo feliz que mora por perto (menos de 2 km) aumentava a chance de uma pessoa ser feliz em 25%, irmãos felizes por perto em 14%, e vizinhos em 34%. Esse efeito contagioso da felicidade diminui com o tempo e também com a distância entre as pessoas, e não foi percebido entre colegas de trabalho.

Em 2010, o contágio social também foi demonstrado no consumo de bebidas alcoólicas (Ann Int Med). A quantidade de álcool que uma pessoa consome é proporcional ao tanto que seus amigos e parentes próximos bebem. O padrão de consumo de álcool de vizinhos e colegas de trabalho não teve a mesma influência. O estudo também demonstrou que aqueles que não bebem têm menos amigos e parentes que não bebem. Os pesquisadores publicaram, ainda em 2010, uma tendência do contágio social de sintomas depressivos entre amigos e vizinhos. O efeito foi mais marcante com amigas do sexo feminino (Mol Psychiatry).

Uma das pesquisas mais interessantes foi publicada em março de 2010 (PLoS One). Foi demonstrado entre adolescentes que o efeito do contágio social no perfil de uso de drogas chega a envolver quatro níveis da rede social. O estudo também mostrou o efeito de contágio social no número de horas diárias de sono e que há uma relação estreita entre a quantidade de sono o e o consumo de drogas. Quando uma pessoa dorme menos de sete horas por noite, a chance de um amigo dormir menos de sete horas é de 11% maior. Quando um adolescente usa maconha, a chance de um amigo usar é 110% maior. O estudo também apontou que, quando uma pessoa dorme menos de sete horas, a chance de um amigo usar drogas aumenta em 19%. Esta foi a primeira vez que se evidenciou que o contágio social de um comportamento influencia o contágio de outro tipo de comportamento.

Em setembro de 2010 (PLoS One), os mesmos pesquisadores publicaram outro estudo que revelou que, numa epidemia infectocontagiosa, indivíduos mais ao centro da rede social são acometidos mais precocemente. Esse achado pode facilitar o controle de epidemias ao se focar os esforços precocemente em indivíduos mais vulneráveis.

Este é um novo modo de pensar a saúde. Qualquer intervenção positiva nos hábitos de vida de um indivíduo pode se alastrar para a sua rede social. Há também o outro lado da moeda: comportamentos negativos também se difundem pela rede. É de se esperar que a internet amplifique cada vez mais esse poder, tanto para o lado positivo quanto negativo, mas o balanço geral certamente será um reflexo da eficiência das políticas públicas para a promoção de saúde da população.

.*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e Diretor Clínico do Instituto do Cérebro de Brasília