Diz o clichê que o tempo é capaz de sarar feridas, mas ele também pode transformar o que já foi bom em algo monótono, sem graça. “O tempo desgasta o relacionamento. A rotina faz parte de qualquer relação, mas, quando a preguiça vem junto, as pessoas se acomodam e não há mais prazer”, acredita a terapeuta de relacionamento Rosangela Matos. Começa-se a comparar o período atual com a época em que os dois estavam se conhecendo e queriam impressionar um ao outro. “Passam a brigar e a ficar irritados até com a forma de a parceira ou de o parceiro mastigar”, exemplifica.
Quando se percebe que todo dia um dos dois tem alguma crítica a fazer sobre o outro, quando conversar sobre certos assuntos causa brigas ou quando o casal nem sequer conversa, é chegado o momento de apertar o botão vermelho e cuidar da relação. Mas nem sempre é fácil fazer isso sem ajuda. Por isso, diversas ferramentas estão disponíveis para que o casal supere diferenças, crises e períodos em que se sentem desconectados um do outro.
Todo casal tem conflitos. A diferença é a forma como lida com eles. E expor pontos de vista com respeito, sem levantar o tom de voz e sem agredir, nem sempre é instintivo: depende da personalidade de cada um, do humor naquele dia, de outros problemas pelos quais os dois podem estar passando.
Durante as crises, muitos casais acabam se separando sem antes tentar resolver a situação. “Daí, sentem saudade, voltam e, em três, quatro meses, estão tendo as mesmas brigas. Uma pessoa de fora pode ensiná-los a terem boas brigas. O casal esquece que não são iguais. Cada um traz uma bagagem, e eles precisam começar a escutar o outro e a falar sem atacar”, explica Rosangela.
Segundo Cristiane Sousa, treinadora e master coach da Federação Brasileira de Coaching Integral Sistêmico (Febracis), a maioria das pessoas tem pouca ou nenhuma noção do quanto estão fazendo para contribuir com a crise no casamento. “Acreditam que a culpa sempre é do outro, e não entendem que a felicidade não pode estar na mudança da outra pessoa. É preciso assumir a responsabilidade pelas mudanças”, afirma. Por isso, pode ser necessária ajuda externa para alinhar expectativas e rever o relacionamento.
Entre as opções, há coaching, terapia com psicólogos, terapia tântrica e, para os mais devotos, até grupos religiosos dentro de igrejas. Os profissionais são unânimes: o mais importante é estar disposto e se esforçar. A Revista conta histórias de quem entrou nessa jornada de recuperar um relacionamento desgastado, mas ainda com muito amor.
Um casal e um mediador
A princípio, a ideia de uma outra pessoa, ainda que especialista, ajudar Polyana Gomes, 35 anos, advogada, e o marido, Alisson Santos, 42, corretor de imóveis, a melhorar o relacionamento do casal não agradava a ele nem um pouco. “Eu sou desconfiado, cético e achava que as pessoas tinham que resolver os próprios problemas. Além disso, achava que chegaria lá e só levaria bronca, que a psicóloga diria que eu estava errado em tudo”, relembra Alisson.
Com um pé atrás, depois de muita insistência, ele aceitou a sugestão da mulher de fazerem terapia de casal com uma psicóloga indicada por amigos. E ficou absolutamente impressionado com o que acabou vivenciando. “Ela era imparcial, e foi um processo que nos fez amadurecer muito”, garante o marido. Ainda há brigas, mas, segundo o casal, elas são resolvidas de uma forma muito mais tranquila. “O diálogo melhorou muito”, atesta Polyana.
Evangélicos, contaram com a ajuda de outra pessoa no processo terapêutico: o pastor que celebrou o casamento deles. Em um determinado momento, Alisson quis conversar com o religioso e se surpreendeu por ele corroborar praticamente tudo que a psicóloga já havia dito. Uma das principais coisas que aprenderam foi a validar o sentimento do outro. “Muitas vezes, antes, um reclamava de algo e o outro considerava frescura ou exagero. Aprendemos que, se o outro está sofrendo com algo, não importa se não concordamos”, explica a mulher. Ela queria mais atenção, e ele era muito focado no trabalho. Os dois conseguiram equilibrar melhor as duas coisas e chegaram a uma harmonia que lhes deu até coragem de ter uma segunda filha.
Nos fins de semana, quem mandava era a primogênita. O casal só fazia os programas dela. Passou, então, a reservar um tempo também só para os dois. Agora, há o momento de fazer coisas em família e também em casal. “No início, ele se sentia culpado de se divertir sem ela, mas, com o tempo, isso foi passando”, conta Polyana.
O pé atrás de Alisson deu lugar a um profundo agradecimento, tanto à mulher, por tê-lo incentivado, quanto à psicóloga, pelo apoio e profissionalismo. “Desde então, já indicamos para um monte de gente. Hoje temos muito mais cumplicidade e mais transparência.”
Quatro décadas de amor
Depois de 37 anos casados, Júlio*, 62, e a mulher, Lúcia*, 59, sentem-se como no início do namoro. Em janeiro do ano passado, decidiram que era hora de fazer algo para recuperar todo o amor — e as demonstrações dele — da época em que se conheceram, no Rio de Janeiro. Com ele sempre muito focado no trabalho e de temperamento difícil, as brigas eram comuns. “Eu tinha uma personalidade assertiva, para não dizer autoritária. E isso, desconectado dela, ainda, virou uma espiral ruim. Eu sabia que estava irritável”, admite Júlio. “Se o tempo já dificulta manter a paixão acesa, com o jeito dele dificultava mais”, lamenta Lúcia.
Foi ele quem sugeriu que participassem de um fim de semana de terapia tântrica. “Eu estava ouvindo rádio, falaram algo sobre o assunto, comecei a pesquisar na internet e fiquei impactado com os depoimentos”, relembra. Ela não estranhou a proposta. Conta que ele sempre foi “novidadeiro”. Mesmo assim, ambos confessam que foi uma verdadeira quebra de paradigma. “Saímos da nossa zona de conforto completamente”, diz Júlio.
O casal acredita que foi ele quem saiu mais impactado daquele fim de semana. Tanto que, depois, Júlio continuou fazendo terapia tântrica individualmente, além de participarem de workshops juntos. “O tantra trabalha a parte sexual, mas é também um estilo de vida. E meu comportamento mudou muito, graças a ele”, conta Júlio, que passou a meditar e garante que não se irrita tanto com situações que antes lhe causariam reações raivosas.
Reapaixonados
Lúcia corrobora que tudo mudou. “Parece que o horizonte dele se abriu. Ele começou a ter outro entendimento da vida e do relacionamento e, principalmente, passou a ver as minhas dificuldades. Antes, por causa das reações dele, parecia que só ele passava por coisas difíceis e sofria. Eu passei a ter muito mais espaço para me expressar. Foi um processo de reencontro”, alegra-se. Para ela, os dois se reapaixonaram.
Resumidamente, eles acreditam que o tantra trouxe, acima de tudo, autoconhecimento e autoestima. “E, quando estamos bem com nós mesmos, nos relacionamos muito melhor com o outro”, explica Lúcia. O casal nunca tinha feito nenhum tipo de terapia juntos antes, mas acredita que uma das coisas que lhes manteve juntos por tanto tempo foi a espiritualidade. “Somos espíritas, então, temos essa conduta de saber que ninguém é perfeito. Essa foi nossa ferramenta a vida toda, e agora somamos mais uma”, explica Júlio.
A terapeuta tântrica Daricha, cofundadora da clínica Atman Consciência e Tantra, explica, no entanto, que nem todo desfecho é o mesmo de Júlio e Lúcia. “É possível que, no processo, o casal perceba que aquele relacionamento já acabou por ali. Nesse caso, o tantra ajuda que aquela separação seja com carinho, respeito, sem as mágoas comuns desse período”, explica. Segundo ela, o tantra faz com que cada indivíduo se conecte com sua essência, sem interferências externas, para que ele entenda melhor os próprios sentimentos.
*Nomes fictícios a pedido do casal
Os cinco pilares de um relacionamento
Amor e admiração: o amor é alimentado pela admiração. Quanto mais se admira, mais se ama.
Sexualidade: não se trata só do ato sexual, mas do toque, do carinho, do cuidado por meio do tato, da química. Costuma ser um dos primeiros pilares a cair, e é o que mantém o casal apaixonado mesmo depois de muitos anos.
Afetividade: parceria, conversa. Não conversar só sobre o “tem que”: tem que pagar conta, tem que levar a criança na escola, tem que comprar detergente. É um hábito bom do início da relação que precisa continuar.
Objetivos em comum: é necessário existir sonhos individuais e comuns.
*Quando não há esses pilares, é preciso de alinhá-los deixando o ego de lado.
Fonte: terapeuta de relacionamento Rosangela Matos
Objetivos e sonhos compartilhados
Hendrika, 29, e Anderson Alvarenga, 33, engenheiros civis, se conheceram há quatro anos e se casaram no ano passado. Muito ágil e proativa, ela se incomodava com a falta de iniciativa dele para resolver os problemas e as pendências da casa. Ela reclamava, e ele se incomodava com as reclamações e as críticas. Trabalhando e estudando muito, os dois também não tinham muito tempo um para o outro.
Precisaram de uma profunda imersão no coaching para aprenderem a lidar melhor um com o outro. Primeiro, fizeram um fim de semana inteiro de palestras com o coach Paulo Vieira. Depois, identificaram que conversar sobre as contas da casa era complicado e gerava brigas. Fizeram um coaching de finanças para casais.
“Primeiro, eu entendi melhor como eu sou. E, com isso, passei a compreendê-lo melhor”, conta Hendrika. “Eu tenho a ação, sou de agir. Ele tem é de refletir antes de fazer. E um pode ser extremamente bom para o outro. Isso de entender o outro é uma arte”, completa.
Nos momentos de impaciência de Anderson, Hendrika costumava reclamar. Passou a entender que, se algo estava causando aquilo nele, ela deveria validar aquele sentimento, em vez de criticá-lo e cobrar que ficasse de bom humor. “Hoje, eu sei que quando ele está assim, está precisando de amor e carinho.”
Para Anderson, a mudança foi extremamente positiva. O casal faz questão de deixar claro que os conflitos não acabaram, mas a forma de lidar com eles mudou. “Antes, ela falava bastante e eu ficava mais quieto. Hoje, quando temos algum conflito, conseguimos conversar de forma mais empática, se colocando no lugar do outro”, explica Anderson.
Avanços
Anderson estava sempre com a sensação de que não tinha tempo de fazer tudo que precisava. Em casa, pensava no trabalho. No trabalho, pensava nas pendências de casa. Se se dava um momento de lazer, sentia-se culpado. Com isso, o relacionamento ficava de lado. Ele entendeu que devia se dedicar mais à mulher, que deveria se organizar para isso. “Agora, anoto as metas da semana, foco no que estou fazendo naquele momento. Se estou com ela, não fico no celular falando sobre trabalho, nem conversando com os amigos”, relata. Nessa rotina, ele também ganhou tempo para si.
Os dois mergulharam fundo no coaching e no objetivo de melhorar o relacionamento à medida que passaram a ler diversos livros com os dois temas. Um dos que mais marcou a vida do casal foi As cinco linguagens do amor, de Gary Chapman. “Com ele, nós entendemos o que faz cada um de nós se sentir amado. Ele se sente prestigiado quando tem tempo de qualidade, e eu quando ele faz coisas por mim”, afirma Hendrika.
O coaching fez com que identificassem problemas que nem sabiam que tinham: não compartilhavam sonhos e objetivos. Isso já está revertido. Agora, têm sonhos individuais, nos quais um ajuda o outro, e ainda sonhos juntos, que envolvem viagens, investimentos. “Nós saímos do automático”, conclui Hendrika.
Cristiane Sousa, treinadora e master coach da Febracis, explica que a especialidade auxilia primeiro no autoconhecimento; depois, na descoberta e conhecimento de quem é o outro. “A comunicação fica mais assertiva, gerando empatia e harmonia em todas as decisões. Existe respeito, mesmo diante das diferenças. Os problemas que poderiam desgastar o relacionamento são substituídos por desafios que são superados e trazem crescimento para o casal.”