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Será que seu cérebro gosta de frio?

Sabemos que tanto o frio quanto o calor extremos podem influenciar negativamente nossas habilidades mentais, e um balanço geral dos estudos sugere que o frio tende a atrapalhar mais

Do ponto de vista psicológico, clima frio é aquele que nos provoca a sensação de frio ou até mesmo desconforto. Do ponto de vista fisiológico, clima frio é aquele que altera nosso sistema de regulação de temperatura. Podemos dizer que nosso termostato funciona em ;marcha lenta; em ambientes com temperaturas entre 25;C e 27oC, não disparando reações de aumento do metabolismo, no caso do frio, ou de transpiração, no caso do calor. A inteligência maior dessa regulação encontra-se em um centro profundo no cérebro, o hipotálamo, e é ele que comanda nossas reações de suor, calafrios e constrição ou vasodilatação dos vasos sanguíneos em resposta à temperatura ambiente.

Será que realmente funcionamos em outro ritmo em dias mais frios?

A adaptação do nosso corpo ao frio envolve mecanismos neurológicos, que influenciam nosso sistema endocrinológico e vascular, mas é claro que também envolve mecanismos comportamentais, como tirar do armário aquele cobertor que só usamos algumas vezes no ano.

Vários fatores determinam a regulação do frio em um determinado indivíduo: idade, sexo, preparo físico, quantidade de gordura corporal. Até mesmo o tipo de personalidade do indivíduo pode influenciar: extrovertidos reagem mais ao desconforto do frio com maior aumento da pressão arterial e secreção de noradrenalina. Doenças sistêmicas e medicações também podem afetar a resposta individual ao frio.

Quando pensamos no nosso desempenho físico, o frio prejudica a função muscular em exercícios dinâmicos. Já em exercícios estáticos (isométricos), o frio não influencia tanto e pode até aumentar a resistência muscular. Um estudo revelou associação entre o frio e a capacidade de equilíbrio, possivelmente por reduzir a eficiência de nossas ;antenas; que regulam nosso balanço. Mas e o nosso cérebro?

Sabemos que tanto o frio quanto o calor extremos podem influenciar negativamente nossas habilidades mentais, e um balanço geral dos estudos existentes sugere que o frio tende a atrapalhar mais. Entretanto, há evidências de que o frio leve/moderado pode melhorar nosso desempenho intelectual.

Duas principais teorias explicam o efeito do frio sobre nossas habilidades cognitivas. A primeira é a do ;efeito distração; que o desconforto associado ao frio pode causar, desviando nossa atenção da tarefa. A outra teoria defende a ideia de que o frio leve/moderado deixa-nos mais acordados, e o maior estado de vigília permite um melhor desempenho. Evidências neurofisiológicas apoiam essa hipótese, ao mostrar que a atividade elétrica cerebral no frio leve/moderado é mais ;esperta;.

O frio pode reduzir nosso nível de vigília, nossa concentração e memória de curto prazo, entre outras funções cognitivas, especialmente em temperaturas abaixo de 10; C. No caso de hipotermia, em que a temperatura corporal chega a níveis inferiores a 35;C, pode-se observar sintomas de confusão mental e redução da vigília. O efeito do inverno sobre nosso comportamento também pode ter uma parcela de contribuição do fator luminosidade. Em países muito ao sul ou muito ao norte, o inverno vem acompanhado de pouca luz por conta de dias muito curtos, fenômeno que é bem reconhecido como fator que aumenta a frequência de sintomas depressivos nessa estação. E depressão é igual a cérebro menos eficiente. Há evidências também que as concentrações dos hormônios da tireoide estão reduzidas em invernos rigorosos. E hormônios da tireoide são combustíveis importantes para o cérebro.

A melhor dica para nosso cérebro curtir o frio com bom desempenho é a de nos agasalharmos bem para não ficarmos distraídos com o desconforto do frio. No ambiente de trabalho, o ar condicionado exagerado pode ser um fator de distração. Viver o inverno sem ficarmos lembrando que está frio pode até deixar o cérebro mais ligado. Um cafezinho vai muito bem também.

*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e Diretor Clínico do Instituto do Cérebro de Brasília