Quando a primeira filha da professora Luisa Maria Ferreira, 29 anos, nasceu, a mãe não precisou fazer nenhuma restrição alimentar. Pelo menos em um primeiro momento. Com poucos dias de vida, porém, Bia, hoje com 2 anos, teve uma assadura. Luísa e a família acreditaram que fosse apenas uma reação à fralda, embora estivesse usando a mesma marca de sempre e trocasse com regularidade. Aconselhada pela nutricionista a tirar o leite da própria dieta para evitar cólicas na filha que amamentava, Luísa se adaptou a uma nova alimentação e o episódio da fralda nunca mais se repetiu.
Quando a professora voltou, aos poucos, a consumir leite e derivados, notou um pouco de sangue nas fezes da garota. ;Então, fiz o teste: cortei o leite de novo, e não houve mais sangramento;, relembra. Após uma consulta médica, ficou diagnosticado que Bia tinha alergia à proteína do leite.
Depois de um ano e meio amamentando e sem comer nada com leite, Luisa voltou, aos poucos, à dieta antiga, sem restrições. ;Foi uma recomendação médica e eu fiquei tranquila, porque ela já mamava pouco, comia bem;, conta. Deu certo. A filha não teve mais nenhuma reação. ;Foi um alívio. Eu tive que me virar nos 30. O queijo de búfala me satisfazia bem no dia a dia. O mais difícil era ir a restaurantes.;
Ela tem certeza de que chegou a comer fora de casa um alimento feito com manteiga. ;Bia teve uma cólica muito forte. Os restaurantes não eram tão preparados. Eu tinha que explicar e verificar;, conta. Com o tempo, foi descobrindo lugares que não usavam leite. A nutricionista dela também a ajudou muito ensinando-a a fazer substituições. ;O leite de coco, eu mesma fazia, congelava e usava em vitaminas;, orgulha-se.
O segundo passo era reintroduzir o leite de vaca na alimentação direta de Bia ; e não só por meio do leite materno. Primeiro, ofereceram alimentos assados com o ingrediente, como pão de queijo, bolo feito com manteiga. Depois, incluíram também os queijos, um leite hipoalergênico e, recentemente, um leite em pó comum. Foi um caso de sucesso. A alergia passou.
O gastroenterologista Bernardo Martins, do Santa Lúcia Norte, explica que, na maioria das vezes, a alergia à proteína do leite aparece nos primeiros dois anos de vida, por imaturidade do sistema imunológico. ;Quando ele começa a ficar mais desenvolvido, deixa de ter essas reações;, afirma.
Entenda a diferença
Muita gente confunde intolerância à lactose com alergia à proteína do leite. A primeira é mais comum quando em adultos e idosos. A segunda, em crianças. O gastroenterologista Bernardo Martins explica que a intolerância à lactose é uma condição que a maioria dos brasileiros vai ter.
;O leite possui alguns açúcares, e o mais comum deles é a lactose. Precisamos quebrá-lo para absorvê-lo e fazer a digestão. Mas, para quebrá-lo, precisamos da lactase, cuja capacidade de produzir diminui com a idade. Sem a lactase, a lactose não vai ser absorvida e vai causar desconforto abdominal, diarreia, constipação. Isso é a intolerância;, esclarece. Portanto, os efeitos da intolerância são causados pela própria lactose.
No caso da alergia à proteína do leite, os efeitos são causados pelo próprio corpo. ;A proteína é um dos componentes do leite, que é uma união de vários aminoácidos. Quando a gente quebra a proteína para digerir os aminoácidos, uma porção deles fica exposto e gera uma resposta do sistema imunológico, que pode ser rápida, nas primeiras duas horas, ou tardia, alguns dias depois da ingestão, ou ainda mista;, diferencia o gastroenterologista.
O médico atribui o aumento da incidência de alergia à proteína do leite ao diagnóstico mais conhecido e também à exposição precoce dos bebês ao leite que não é materno. ;Alguns bebês têm uma alergia tão importante que, se a mãe ingerir leite ou derivados, ela já observa dores abdominais, sangue nas fezes. Outros têm uma alergia mais discreta, precisa de grandes concentrações para ter uma reação;, pontua Bernardo.