André Baioff*
postado em 03/09/2017 08:00
Ao criar um animal de estimação, certos cuidados viram obrigações dos tutores para evitar a propagação de doenças graves e letais, que podem, inclusive, ser transmitidas aos homens, como a raiva. Doença infecciosa aguda causada pelo vírus lyssavirus, o mal tem como alvo os animais mamíferos terrestres e com pouquíssimas chances de cura. A única forma de preveni-la, tanto em animais quanto em humanos, é a vacinação anual dos bichos.
No Distrito Federal, o último caso da raiva humana foi registrado em 1978, como resultado bem-sucedido do Programa Nacional de Profilaxia da Raiva Humana, criado em 1973. O último cão diagnosticado foi no ano 2000 e, em gatos, só se ouviu falar da doença em 2001. Sendo assim, a raiva é considerada erradicada no DF. Mas, segundo o veterinário da Diretoria de Vigilância Ambiental (Dival) e responsável técnico pelos reservatórios de raiva e leishmaniose do Distrito Federal, Laurício Monteiro, a única forma de manter a população protegida é por meio da vacinação regular. Além disso, o Governo do Distrito Federal faz quatro tipos de vigilância (leia mais no quadro) para assegurar o controle da doença: aérea, silvestre, rural e urbana.
Para Mariana Collina Scanavaca, médica veterinária e coordenadora técnica da MSD Saúde Animal, alguns sinais clínicos servem para despertar a atenção dos tutores no caso de um animal estar infectado. Entre eles, ela lista mudança de hábitos ou de comportamento do pet: se esconder ou agir de maneira diferente da usual; ficar mais agressivo; salivar muito e ter paralisia corporal. ;É importante salientar que nem todo cão ou gato que saliva bastante está com raiva. Quando a doença se instala, ocorre, principalmente, paralisia dos músculos faciais, o que impede a deglutição normal e, por isso, o animal pode babar muito;, esclarece.
Vacina é a melhor prevenção
A raiva é uma doença incurável, para a qual não existe tratamento. ;O animal com suspeita de estar doente deve ficar em observação por 10 dias e, se confirmado o diagnóstico, é indicada a eutanásia;, esclarece o infectologista veterinário Paulo Tabanez. Não existe outra forma de prevenção que não a vacinação periódica, acompanhada pelo veterinário. Mas, para proteção em massa da população, o ideal é que, no mínimo, 70% de cães e gatos estejam imunizados. Ele acrescenta que a vacina não tem contraindicação, mas o ideal é imunizar animais saudáveis, acima de 3 meses de idade.
Eduardo Soares Tanzarella, 37 anos, é dono do Canil Petit Imperator. Com a esposa, cria 13 cães da raça buldogue francês. ;Como não temos filhos, costumamos dizer que eles são nossos anjos de quatro patas;, emociona-se. Para cuidar de tantos animais, não abrem mão do conforto deles: tem sempre água limpa e fresca; alimentos de qualidade, incluindo frutas e legumes; brincadeiras e atenção para que eles gastem energia e fiquem mais calmos.
Segundo Eduardo, pelo menos duas vezes ao ano, uma veterinária de confiança vai à casa deles para examinar e vacinar a matilha. ;Às vezes, por tomar alguma medicação ou estar em fase de reprodução, algum fica de fora e, então, o levamos a uma clínica posteriormente;, garante.
Com igual dedicação, a enfermeira Vanessa Patelli dos Reis, 24, trata seus bichos. Honey e Twiggy, 2 anos, são da raça biewer yorkshire; as gatas vira-latas Zara, 5, e Xaninha, 10; além do cavalo Docão, 20. ;Todos eles chegaram de forma parecida em casa, ou seja, inesperada! Só a Honey foi planejada;, brinca Vanessa.
A jovem mora no Lago Norte e leva os bichos a uma clínica veterinária no Guará a cada 15 dias. A profissional de confiança cuida dos cães e dos gatos, desde o banho até a coleta de exames. Já o cavalo recebe acompanhamento veterinário no haras onde vive. Ali, é submetido à avaliação clínica a cada três meses, além de receber a visita de um veterinário dentista uma vez ao ano.
Assim como Eduardo, Vanessa paga para vacinar todos os seus bichos. ;Ter um animal não é só alegria. É imprescindível zelarmos por eles.;
Ações da Diretoria de Vigilância Ambiental do DF
1. Vacinação de cães e gatos.
2. Diagnóstico de raiva de todas as espécies de animais: canina, felina, quirópteros, bovina, equina e outras.
3. Promoção para educação em saúde, por meio de palestras, seminários, cursos, congressos, folders e outras mídias.
4. Investigação de casos suspeitos de raiva.
5. Observação clínica de cães, gatos e outros animais por médico veterinário.
6. Vacinação antirrábica humana de profissionais que trabalham com animais: médicos veterinários, zootecnistas, biólogos, técnicos e outros.
7. Vacinação antirrábica humana de pessoas que sofreram agressões por animais, mordedura ou arranhadura.
8. Acompanhamento de casos suspeitos em humanos.
Campanha
As medidas sistemáticas de vacinação antirrábica canina em todos os estados e territórios federais começaram no ano de 1977, por meio do Programa Nacional de Profilaxia da Raiva, mediante um convênio firmado entre o Ministério da Saúde e o da Agricultura, além da Central de Medicamentos (Ceme) e da Organização Pan-Americana da Saúde. Na época, registravam-se, em média, 30 casos de raiva humana por ano no país. O município de Botucatu, em São Paulo, foi pioneiro no Programa em 1963, ano de sua criação.
O departamento de medicina veterinária (na ex-Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu) atendia, em média, três casos por dia de animais com suspeita de raiva e, em momentos de crise, chegou a receber sete cães em um único dia, além de manter 40 internados, alguns deles com diagnóstico confirmado. A situação deixou em pânico os donos dos animais, a população da cidade e os órgãos públicos. ;Importante lembrar que, nessa época, não havia legislação ou manuais de instruções sobre o tema. O programa também não tinha ajuda financeira, como existe atualmente;, diz Mariana Collina Scanavaca, médica veterinária e coordenadora técnica da MSD Saúde Animal.
Era preciso conscientizar os tutores de pet sobre a importância da vacinação anual. Em 1971, após oito anos do início do programa, foi possível observar o declínio do registro da doença, em um momento em que se estimava que 90% da população canina estava vacinada. Em 1977, o programa foi expandido para o restante do paí e teve como objetivo promover atividades sistemáticas de controle à raiva humana, mediante o controle da zoonose nos animais domésticos e o tratamento específico das pessoas mordidas ou que tiveram contato com animais raivosos. No DF, a Secretaria de Saúde não tem data prevista para a campanha de vacinação de 2017.
O ciclo da doença
Após o período de incubação do vírus que causa a raiva, a doença se manifesta em ciclos.
Primeira fase: dura de um a três dias. Nessa etapa, ocorre mudança de comportamento do animal, que se esconde em locais escuros, fica mais agitado, além de comer coisas incomuns, como madeira, por exemplo.
Segunda fase: ele fica mais agressivo, tenta se morder e agredir as pessoas e outros animais. Ele saliva muito, para de comer e beber.
Terceira fase: é a última, quando ele sofre com convulsões generalizadas, entra em um estado paralítico e morre em 48h.
Tipos de raiva
A raiva canina pode acontecer de três formas:
Furiosa: é a mais comum. O cão late muito, fica agressivo, saliva bastante, tem convulsões e paralisia. O animal vive em torno de quatro a sete dias.
Muda: como o próprio nome já diz, o animal fica mudo, não atende aos comandos e não fica agitado nem agressivo. O tempo de vida é em torno de três dias.
Intestinal: é a mais rara. Não apresenta nenhum dos sintomas comuns da doença, mas pode ter vômitos e cólicas frequentes até morrer, em até três dias.
Fonte: Mariana Collina Scanavaca é médica veterinária e coordenadora técnica da MSD Saúde Animal
(*) Estagiário sob a supervisão de Sibele Negromonte