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Quem tem medo do tempo?

A cada dia que passa, seu corpo envelhece um tiquinho mais. Mas esse processo não precisa ser cercado de temores. Se você estiver preparado, tem tudo para viver uma etapa emocionante e libertadora

Você já deve ter reparado que o mundo está envelhecendo. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também notou. Segundo dados do órgão, de 1960 a 2000, a população brasileira com 60 anos ou mais aumentou de 4,7% para 8,5%. O último levantamento, em 2010, mostrou que há 20,5 milhões de compatriotas nessa fase da vida, o que representa a generosa fatia de 10,8% da população. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, em 2025, seremos o sexto país com maior número de idosos do mundo: 32 milhões de pessoas. Não é de espantar que, mais do que nunca, a envelhescência (ou gerontolescência) é tema de debates, estudos e até filmes.

Houve um tempo em que lugar de velho era dentro de casa ou no hospital. Como um roteiro, a vida seguia um ritmo pré-definido e previsível: nascer, crescer, casar-se, procriar, morrer. Acontece que as pessoas começaram a viver mais. Agora, o que tira o sono da humanidade é uma pergunta inquietante: o que fazer com o tempo extra, fruto da longevidade?


O levantamento Como os brasileiros encaram o envelhecimento, feito pelo Instituto QualiBest por encomenda da Pfizer, entrevistou 989 pessoas a partir de 18 anos de todo o país. O intuito foi justamente descobrir como a ;nova geração; lida com o assunto. As descobertas são interessantes: embora apenas 9% tenham afirmado não temer os efeitos do tempo, quase um quarto espera viver entre 96 e 120 anos (). Ao mesmo tempo, solidão e medo de perder habilidades cognitivas, como a memória, são preocupações que tiram muito mais o sono dos jovens do que o dos mais velhos.


Em geral, as principais preocupações dos entrevistados velhos estavam relacionadas à vida financeira (52%) e ao distanciamento dos familiares (37%). A novidade é que os idosos de hoje não pensam só em fazer a aposentadoria chegar ao fim do mês ou em cuidar de netos. Eles também querem paz interior (44%), vida sexual ativa (14%) e viajar (14%). ;Ao detectar os principais mitos sobre a longevidade, é possível trazê-los ao debate e contribuir para uma maior reflexão;, analisa Eurico Correia, diretor médico da Pfizer.
A geriatra e gerontóloga Andréa Prates, mestre em Promoção de Saúde pela Universidade de Londres, sócia-diretora da Contemporânea ; consultoria aplicada para a longevidade e coordenadora executiva do Centro Internacional de Informação para o Envelhecimento Saudável (Cies), explica que o processo de envelhecimento está relacionado a vários aspectos: físicos, emocionais, financeiros, sociais etc. ;Um dos preconceitos que a gente mais tem, hoje em dia, é com relação à idade;, analisa. ;É algo muito arraigado. Não vemos pessoas, mas números;, critica.


Antigamente, o curso de vida era inteiramente pautado pela questão familiar. A partir da Revolução Industrial, havia idade para tudo ; para ir à escola, para ter uma união civil, para entrar no mercado de trabalho e, consequentemente, para sair dele. Nascia a aposentadoria. ;Só que a aposentadoria foi criada em 1878. Naquela época, as pessoas tinham expectativa de vida de 40 anos;, completa Andréa Prates. ;Passados mais de 130 anos nessa formulação, praticamente vivemos sob as mesmas regras.;


Olhando por esse lado, dá até para entender por que ainda há tanto estranhamento quando o assunto é idoso fazendo coisas de ;gente jovem;. Com a aposentadoria, criou-se a ideia de que o indivíduo cumpriu toda a produtividade que tinha para cumprir. Embora o imaginário coletivo ainda tenha certos estigmas com relação aos mais velhos ; 57% dos entrevistados da Pfizer acreditam que idosos tendem a ser mais teimosos e 33% acha que eles são impacientes ;, a maioria, 77%, acha que envelhecer deve ser motivo de orgulho. Inclusive, essas mesmas pessoas acreditam que nunca se deve deixar de fazer certas coisas por ;excesso de primaveras;, como dirigir (25%), namorar (76%) ou sair com amigos (77%).


Thiago Rodrigues Póvoa, geriatra do Hospital Santa Helena, explica que existem dois termos para o paciente que está envelhecendo. O primeiro é a senescência, ou o processo natural, em que as células envelhecem e há um conjunto de alterações metabólicas. ;Isso é demonstrado no organismo pelo envelhecimento funcional, em que coração, rins, cérebro e músculos vão, pouco a pouco, perdendo atividade.; Já a senilidade seria o lado ruim, associado a alterações patológicas, ao desgaste precoce a tudo que prejudica a funcionalidade do indivíduo. Doenças como diabetes ou hipertensão são alguns dos fatores desse envelhecimento fora de época.


De alguma forma, o médico diz que é, sim, possível traçar um comparativo entre a adolescência e a envelhescência, no que tange as mudanças corporais, cerebrais e comportamentais. Se, na adolescência, o corpo está a mil, na fase avançada da vida há perda de funções motoras e declínio da audição e da visão. ;É mais um estágio da vida;, complementa Thiago Póvoa.


Desnecessário dizer que, quanto antes o indivíduo se preparar para a velhice, melhor será essa fase. Um estilo de vida desregrado, com ausência de atividade física e cuidados médicos em geral dificilmente terá como resultado um idoso saudável, feliz e funcional. ;Uma rotina estressante traz um desgaste em termos orgânicos e psicológicos que vão culminar em uma velhice mais sofrida;, reforça Póvoa. ;A pessoa deve se preparar para a velhice a vida toda. Colhemos na velhice o que plantamos na juventude.;

Bônus de longevidade

À medida que o corpo vai envelhecendo, tudo muda. Os hormônios, certamente, não ficariam de fora. Patrícia Brunck, endocrinologista do Hospital Santa Lúcia, explica que há uma diminuição geral na produção hormonal, em específico, o GH (mais conhecido como hormônio do crescimento). ;Ele continua sendo produzido mesmo quando não estamos em fase de crescimento porque é importante para a vitalidade;, justifica. Nas mulheres, acontece a menopausa (fim da produção hormonal pelos ovários) e, nos homens, a chamada andropausa (decréscimo da testosterona).


A queda hormonal causa impactos significativos na qualidade de vida do idoso. Quadros depressivos, diminuição da libido, alterações de humor, irritabilidade e insônia são sintomas comuns.

Josefa Rodrigues Neres, 72 anos, não teve o que a sociedade considera essencial para uma vida completa: o casamento. A aposentada perdeu vários irmãos ao longo de sua trajetória e, na casa onde moravam 10 pessoas, hoje só há ela. Para muitos, esses seriam motivos suficientes para que a idosa não tivesse mais vontade de sair da cama. Mas Josefa, uma senhora animada e com um sorriso luminoso, é o extremo oposto do que se poderia imaginar. Todos os dias, ela coloca seus tênis e caminha por Taguatinga. Na igreja, encontrou companhia, amigos e hobbies, como o coral, viagens, a pintura e o artesanato.

Josefa credita sua boa memória e humor irretocável à companhia dos amigos que fez no grupo. ;Tenho que sair de casa, porque senão enjoo de ficar sozinha;, justifica. Para ela, só há uma palavra para definir a envelhescência: maravilhosa. ;A gente aprende a conviver com as pessoas. Aquelas besteiras que a gente fazia quando nova, não faz mais.; Entender que a fase adulta acabou foi algo natural para ela: nada de problematizar. Com ela, o lance é agitar. Quem acha que a vida já acabou, ela tem um recado: sair da zona de conforto pode salvar uma vida. ;Para que ficar em casa chorando?;.


Envelhecer sem vergonha
Veja alguns dados da pesquisa Como os brasileiros encaram envelhecimento, feito pelo Instituto QualiBest por encomenda da Pfizer:


- O maior medo de pessoas com 61 anos ou mais é ter problemas de saúde (71% dos entrevistados);
- 35% quer viver entre os 76 e 85 anos; 23% espera chegar entre os 86 e 95 anos; e 23% quer que a vida se estique dos 96 aos 120 anos;
- 77% considera o envelhecimento um motivo de orgulho.

Brasil em números

- De 1940 a 1990, a expectativa de vida ao nascer foi de 41,5 para 67,7 anos de idade;

- Em 2013, a expectativa de vida saltou para 74,9 ; 71,3 para homens e 78,5 para mulheres;

- 55% da população com 60 anos ou mais é constituída por mulheres e a maioria (83,9%) vive em áreas urbanas ; especificamente, na região Sudeste (56,7%);

- A média de estudo da população com 60 anos ou mais é de 4,7 anos de estudo;

- Quase metade (48,4%) tem rendimentos superiores a um salário mínimo. Mais da metade dessas pessoas (55,4%) vive na Região Sul;

- A maioria da população com 60 anos ou mais (76,1%) recebe algum benefício da Previdência Social.

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)