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Para ficar zerado

Se descuidarmos, o corpo acumula as toxinas ingeridas ao longo da vida. Por isso, que tal aproveitar o gás do ano novo para promover uma verdadeira limpeza do organismo?



Começa um novo ano e pipocam dicas e soluções rápidas para eliminar os excessos do Natal e do réveillon. As deliciosas rabanadas agora parecem inimigas mortais e o maior desejo é aproveitar o verão e não fazer feio na praia. Assim como as roupas, as dietas também acompanham a moda e o "detox" segue forte como tendência. Essa palavrinha virou uma poderosa propaganda, um mercado de sucos, dietas e vários outros serviços para limpar o organismo e perder alguns quilinhos.

No entanto, os ingredientes para a desintoxicação vão muito além da mistura de couve com frutas. "E de jeito nenhum é para emagrecer", ressalta a nutricionista Gabriela Calsing. O emagrecimento pode até ocorrer como uma consequência natural de adotar opções mais saudáveis, porém está longe de ser o foco. "Às vezes, a pessoa começa com uma consciência de perda de peso, mas sai com outra visão. Tem algo mais profundo que a estética ; é um estilo de vida", opina a empresária Renata Queiroz, de uma empresa de alimentação funcional e desintoxicante.

Mais do que se recuperar dos espumantes e das ceias de fim de ano, o processo inclui repensar diversas fontes de toxinas ; inofensivas nas doses diárias, mas maléficas quando acumuladas ao longo do tempo. Elas estão na poluição, nos alimentos industrializados, no estresse da cidade e até no famoso suco detox, se feito com hortaliças cheias de agrotóxicos. "O pior dessa má alimentação é que você não come hoje e vai passar mal amanhã. Na maioria dos casos, as consequências virão 10 ou 15 anos depois", adverte o nutrólogo Francisco Humberto Azevedo.

Todos nós estaríamos expostos a uma gama complexa de componentes tóxicos no ar, na água e nos alimentos, preconiza o Instituto de Medicina Funcional (IFM). Em seu site (www.functionalmedicine.org), o centro de estudos norte-americano lança um alerta: "Há evidências convincentes de que mesmo pequenos níveis de exposição tóxica estão relacionados a uma variedade de condições crônicas de saúde, incluindo disfunções hormonais e doenças degenerativas, como o Parkinson".

Diante desses perigos, o leitor pode se perguntar: "Mas eu vou ter que viver numa bolha?". Gabriela Calsing tem a reposta na ponta da língua: "Só se for em uma bolha de vidro, porque a de plástico também faz mal". A frase, claro, é uma brincadeira da nutricionista, que tenta tranquilizar os pacientes. "O importante é reduzir as fontes que intoxicam e consumir alimentos que estimulam o processo natural de desintoxicação", resume. "Em qualquer self service, é possível fazer um excelente prato", endossa Francisco Humberto.

Portanto, procure fazer as escolhas certas, sabendo que existem vários aliados nesse caminho. Integrar novos hábitos ao cotidiano exige, sim, algum esforço e o principal deles é com a alimentação. Além disso, estão disponíveis tratamentos específicos para a pele e para os cabelos. Entenda.

O veneno de cada dia
Listar as principais fontes de toxinas é complicado, pois a ideia de "substância estranha à vida" não se esgota facilmente. Talvez seja melhor falar em substâncias que alteram de forma nociva o funcionamento das células. Se estamos saudáveis e com os órgãos excretores ; intestino, rins, fígado, pulmões e pele ; em bom funcionamento, elas são eliminadas e não provocam grandes malefícios. A intoxicação ocorre quando elas são absorvidas numa quantidade maior do que a capacidade de eliminação.

Segundo o livro Você sabe se desintoxicar?, do Dr. Soleil, as funções excretoras atingem a máxima atividade durante a segunda metade da noite e terminam no meio da manhã. "Quanto mais intoxicado o organismo, maior é o mal-estar ao acordar ; com uma série de sintomas provocados pelo esforço para se livrar do excesso de toxinas", diz o autor. Alguns exemplos são dor de cabeça ou em outras partes do corpo, rigidez e fraqueza nas articulações, inchaço, cansaço geral, mau humor e raciocínio lento.

Mas esses problemas são apenas a ponta do iceberg. "Todas as supostas doenças são crises de toxemia", escreveu John Henry Tilden. Ele foi um dos principais expoentes do higienismo, um movimento que surgiu no século 19 nos Estados Unidos. Para essa corrente, as doenças são sintomas do esforço da natureza em eliminar as toxinas presentes no sangue. Assim, curar uma úlcera no estômago significaria apenas remover um efeito, sem saber a origem dele.

A verdadeira causa dos desvios na saúde estariam em "hábitos enervantes", que irritam e enfraquecem o organismo, como alimentação excessiva, abuso de álcool, descanso insuficiente e sentimentos negativos. Sem identificar a verdadeira causa, "curar" uma gripe apenas interromperia essa resposta natural do corpo de eliminar toxinas. Elas vão continuar se concentrando e, depois, se manifestarão de outras maneiras. Essa abordagem voltou a ganhar força graças a iniciativas como a do Instituto de Medicina Funcional (IFM). "Nós temos que começar a procurar a raiz das doenças crônicas em vez de simplesmente suprimir os sintomas", defende o instituto em seu site.

O Breast Cancer Fund (BCF), outra instituição norte-americana, atua de forma semelhante ao combater as causas ambientais do câncer de mama. "Pesticidas pulverizados em plantações, antibióticos usados em aves e hormônios dados ao gado expõem os consumidores involuntariamente a contaminantes que se tornam parte dos nossos corpos", destacam. Entre as atividades da BCF, está o engajamento na campanha Safe for Cosmetics, que foi criada em 2006 e conta com mais de 150 instituições. O grupo realiza pesquisas e pressiona empresas a eliminar componentes potencialmente prejudiciais das fórmulas dos cosméticos.

Nessa área, uma das principais discussões é sobre os níveis seguros de exposição. A dermatologista Joana Costa defende que, na maioria dos casos, as concentrações presentes em cosméticos são muito pequenas para causar câncer ao longo da vida. Uma das exceções é o formaldeído, o famoso formol usado em alisantes de cabelo e fortalecedores de unha, em que o máximo permitido pela legislação brasileira é de 0,2%. Acima disso, alguns problemas já começam a aparecer, como irritações na pele e no sistema respiratório. Em outras situações, a dermatologista alerta que a preocupação maior deve ser com pessoas alérgicas e no cuidado para guardar os produtos em condições adequadas. "Muita gente deixa xampus, desodorantes ou cremes em lugares que pegam sol. Isso pode provocar alterações na fórmula, que vai apresentar um efeito maléfico não esperado", exemplifica.

Para o BCF, no entanto, mesmo as pequenas concentrações são prejudiciais. O problema estaria na mistura entre os vários produtos que combinamos e usamos ao longo do dia. A instituição cita alguns estudos, um deles realizado em 2006, na Universidade de Londres. Segundo a pesquisa, a grande quantidade de químicos com efeito semelhante ao hormônio feminino estrogênio, todos em baixos níveis, podem agir juntos e provocar alterações no nível hormonal, um fator de risco para o câncer de mama. Outro problema, destacado pela Safe for Cosmetics, é o de que muitos produtos não descrevem todos os componentes no rótulo, principalmente perfumes, e podem deixar de informar substâncias de segurança duvidosa.

Leia a reportagem completa na edição n; 503 da Revista do Correio.