Foi então que, no microsystem, tão moderno para o período, começou a tocar Banda Magníficus, famosa por seus forrós românticos. O garoto achou que era a hora certa. Ela aceitou. Eles dançaram. O casal não vingou para a vida, mas aquele bailar ficou marcado. Até porque foi vivida pelo repórter que vos escreve. E virou lembrança não só pelo romantismo inocente, mas para mostrar que ; seja com 12 ou 82 anos ;, saber uns bons passos de dança pode fazer diferença na hora de tentar conquistar o coração de alguém.
Ou, como mostram os entrevistados desta reportagem, a dança permite que a timidez de mexer o corpo seja substituída pelo prazer de ser levado pelo ritmo da música. "A dança mexe com o nosso ego. Se você não se sente confiante, não vai dançar. Por isso, o mais importante, quando você vai ensinar alguém, é fazer com que a pessoa se sinta capaz de fazer aquilo com qualidade", garante a professora de dança Bruna Araújo, que, com o grupo ShiiiU! Performance, ajuda os envergonhados a girar no salão ou nos palcos.
Assim, seja em um forró despretensioso, seja naquela aula de jazz em que o corpo é muito exigido, dançar é uma experiência física, emocional e social. E, nos passeios feitos por cinco academias de dança da cidade, ficou claro que, em muitos casos, ela se torna uma ferramenta para o autoconhecimento e para a socialização, com uma boa dose de diversão. Quer dançar com a gente?
Zouk, a dança divertida
Para que o acanhamento surja na hora de dançar não é preciso haver plateia. Há quem se sinta embaraço em rebolar até mesmo sozinho em casa. Por isso, quem vence a inibição e procura uma escola de dança não está querendo apenas girar sob a batuta de um profissional. Quer poder brilhar longe dele. Para o professor André Muri, o que a escola oferece é um ambiente controlado para a pessoa se soltar.
"Há muitos alunos que chegam aqui tímidos e isso independe do estilo que eles queiram dançar. Os ritmos, mesmo o bolero, mais lento, ou o zouk, mais rápido, tem a questão da sociabilidade envolvida. Há muita gente que chega aqui nem tanto querendo aprender a dançar, mas a se soltar", diz André. Aos que nasceram em meados da década de 1980, o zouk não chega a ser uma novidade: o ritmo caribenho tem muito da nossa lambada.
Erika Amaral, estudante de 22 anos, dança desde os 5. Conhece diversas modalidades, mas tem o zouk como preferida. "Nunca fiquei sem dançar. Só que, com o zouk, sinto algo diferente. É como se o mundo deixasse de existir, tanto que é comum que a gente dance de olhos fechados." Para ela, mesmo com a exigência da técnica, esse estilo é intenso e demanda uma sensualidade feminina constante. "Tem muito charme envolvido", completa.
André Muri explica que, no zouk, quem manda é a dama, sendo elas as que mais procuram as aulas. "É com ele que as mulheres podem mostrar toda a feminilidade e sensualidade." Mas, na hora de aprender, o mais importante é se divertir. Piadas entre os alunos, muitas risadas. O clima é liberal, o que deixa todos ainda mais à vontade para dançar. "Vamos trabalhar balão", avisa André, separando a turma entre damas e cavalheiros.
O tal balão não é nada fácil. O cavalheiro deve segurar a dama pelas mãos, enquanto ela gira a cabeça, bem como o tronco. Ao fim, ela dá uma volta sozinha, reencontrando as mãos daquele que guia, isso sem parar de dançar. O bom humor do professor é indispensável. Ninguém quer fazer parte do Bolshoi. "No zouk, o cavalheiro está ali simplesmente para conduzir a dama: ele vai apresentá-la. É uma dança divertida e não tem restrição de idade", frisa André.
Por que dançar?
"Quando uma pessoa dança, ela começa a entender seus limites e a lidar melhor com eles." A frase da professora de dança Soraia Silva, da Universidade de Brasília (UnB), resume bem as possibilidades de quem decide aprender a dançar. Mesmo que o ato não necessite de aprendizado técnico, ao se colocar em um ambiente que exige maior consciência corporal, há uma consequente "aprendizagem" de si mesmo.
"Todas as danças trabalham uma viagem interior e exterior. E começar a dançar é sempre um desafio pessoal. Mas nunca é tarde demais para isso." Para Soraia, a timidez que muitos carregam na hora de decidir dançar é um resquício de uma ideia errônea que estilos como o balé clássico impuseram. Pela beleza dele, a burguesia o tomou como exemplo a ser seguido. E, dessa forma, errar se tornou um pecado. "Mas dançar é liberdade. É construir relacionamentos e fazer troca", completa.
A competitividade no meio, porém, é uma realidade. Geórgia Botelho, do grupo ShiiiU! Performance, garante que há muitos dançarinos que vivem com medo de serem julgados pelo desempenho. "Conheço vários que vão a boates porque lá se sentem mais livres para dançar." Por isso que, em suas aulas, ela prioriza a conquista do lado pessoal de cada aluno. "Isso passa confiança e faz com que ele não tema o outro", diz Geórgia.
Para a facilitadora em biodança Betânia Moura, a dança é um termo poético para o movimento: quando dançamos, estamos usando um método simples de conseguir melhorar nosso ânimo. "Qualquer espaço no qual a pessoa possa se expressar corporalmente dará mais noção de quem ela é."
Leia a reportagem completa na edição n; 482 da Revista do Correio.