Então, século 21. O futuro finalmente chegou, trazendo com ele mudanças importantes. A tecnologia conseguiu revolucionar a maneira como as pessoas se relacionam, como compram, como assistem à televisão. Tanta revolução, no entanto, não se aplica às refeições. Pratos coloridos, sanduíches, um bom churrasco, nada disso pôde ser substituído por pílulas de astronauta ; embora tentativas tenham chegado bem próximas disso, como a chamada ;ração humana; e uma dieta emagrecedora batizada em homenagem aos exploradores do espaço. Arroz, feijão, proteínas e saladas, salvo os industrializados, continuam bastante semelhantes aos tempos em que o homem caçava seu próprio alimento em eras pré-históricas. Aparentemente, de pouco serve o ;futuro; para a alimentação.
A não ser no que diz respeito à parte científica da coisa. Alimentos antes de benefícios e riscos duvidosos ; ou desconhecidos ; para a medicina, de repente, passaram a chamar a atenção e se transformaram em milhares de páginas acadêmicas de estudo e pesquisa. A soja, por exemplo, até os anos 1990 considerada um ;alimento de desnutridos;, devido ao seu baixo custo e alto teor proteico, passou a ganhar ares de promessa de uma vida mais saudável. Foi considerada uma aliada na prevenção do câncer de mama por conter fitoestrogêneos, estruturas semelhantes ao hormônio feminino. Um alento para os sintomas da menopausa. Um preventivo contra a osteoporose. Ganhou prateleiras de supermercados e as despensas nas casas das famílias e, por opção de algumas pessoas, passou a substituir completamente outras fontes de proteína como as carnes e o leite. Hoje, já há quem duvide de seus benefícios e do seu caráter preventivo e ainda a considere fator de risco para alguns tipos de câncer, além de perigosa para crianças em idade de desenvolvimento. Se a ciência não chegou a conclusões, pelo menos colocou o que se come em debate.
No mesmo passo em que as pesquisas sobre o lado mocinho e o vilão dos alimentos cresceram, as pessoas começaram a prestar mais atenção ao que comiam. E o ;feijão-arroz-e-bife; de todo o dia passou a dividir espaço com alimentos um pouco esquisitos, até então quase desconhecidos, mas que passaram a estampar páginas de jornais e revistas especializados em saúde e dieta, a constar em receituários médicos e nos supermercados como promessas, senão de uma vida mais longa, de um corpo mais bonito. São sementes de aparência pouco atraente, como a linhaça e a chia, a quinoa, o chá verde, chás de todas as cores, a flor de sal ; como opção ao sal refinado, este já crucificado pela medicina há mais tempo ; e mesmo opções controvertidas, como o noni, uma fruta supostamente anticancerígena, mas altamente criticada por médicos pela sua toxidade ao fígado.
Outro ponto marcou os primeiros anos do século: as pesquisas e descobertas se multiplicaram, mas nenhuma delas vale mais como lei na hora de se alimentar. Nem o leite, por exemplo, que tem sido alvo de críticas por parte de médicos e especialistas, é tão ruim que mereça ser banido do cardápio mundial, nem a quinoa, apontada como manancial de inúmeros benefícios, é tão boa que possa ser única fonte de nutrientes. A alimentação do século 21 é individualizada e, mais do que pesquisas laboratoriais, as regras são ditadas por cada organismo e suas necessidades.
Que você precisa comer pelo menos três vezes ao dia é algo que não muda, não importa em que século esteja. Mas o que e como se come, isso provavelmente sempre mudará de tempos em tempos. E é sobre essas pequenas, mas importantes mudanças do comer que a sétima reportagem da série ;Nosso Tempo; se debruça. Alimentos que mudaram de status e passaram de contraindicados a mais do que indicados e vice-versa, dietas que entraram e saíram da moda, alimentos que passaram a povoar a lista de compras, a maneira como médicos, cientistas e nutricionistas passaram a enxergar a alimentação e como você, aí detrás do seu prato, mudou ou não a sua relação com a comida.
Leia a reportagem completa na edição n; 428 da Revista do Correio.