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Anticoncepcionais na berlinda

Alerta da Anvisa sobre o risco maior de trombose em usuárias de pílulas com drospirenona preocupa mulheres. Médicos, no entanto, não veem motivo para pânico

Nada de pânico! O recado é do médico Rogério Bonassi, presidente da Comissão de Contracepção da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), tranquilizando as brasileiras que consomem anticoncepcionais com a substância drospirenona. Este hormônio faz parte de pílulas mais modernas, como a Yaz e a Yasmin, favoritas das mulheres por não apresentarem efeitos colaterais como ganho de peso, inchaços, espinhas, além de ajudar a controlar os sintomas da TPM.

Porém, a venda desses anticoncepcionais está na berlinda. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou este mês um alerta para médicos e pacientes sobre reações adversas dos produtos. A decisão do órgão brasileiro se baseia em estudos internacionais, publicados na periódico médico British Medical Journal, apontando um risco maior no surgimento de coágulos sanguíneos em mulheres que tomam anticoncepcional contendo o hormônio drospirenona.

A comercialização ainda é permitida, desde que a pessoa apresente receita médica. No entanto, a Anvisa orienta médicos a conversarem com suas pacientes sobre sinais e sintomas do tromboembolismo venoso e pulmonar. Pede ainda que os profissionais de saúde informem à Vigilância Sanitária sobre reações adversas graves pelo uso da substância.

O recado do doutor Bonassi com certeza trará mais confiança a mulheres como a funcionária pública Fabiana de Fátima Araújo, de 38 anos, mãe de duas meninas. Há 13 anos, ela toma a pílula Yasmin e em outubro interrompeu o uso do anticoncepcional. "Periodicamente tomo este cuidado. Dou um tempo, para limpar o organismo", conta. Desta vez, ela não pretende retomar o uso do produto. "Tomei conhecimento das suspeitas, fiquei preocupada. Tenho de medo de ter trombose", revela. Há duas semanas, ela teve um mal estar, procurou um clínico geral, ele a orientou a procurar um cardiologista, pois os sintomas indicavam que Fabiana está com aterosclerose ou formação de placas de gordura no interior das artérias. "Só volto a usar qualquer anticoncepcional depois de conversar com o meu médico", afirma a servidora.

Para mulheres como Fabiana, o diretor da Febrasgo explica que as pesquisas ainda não são definitivas e que não há motivo para pânico ou alarde. "A trombose, mesmo entre usuárias de pílulas Yaz e Yasmin, é um evento muito raro", garante Rogério Bonassi.

Segundo ele, entre as mulheres usuárias de anticoncepcionais comuns, as possibilidades deles terem trombose é de cinco casos para cada 100 mil mulheres. Porém, o índice aumenta para 10 casos em 100 mil entre as que usam produtos como Yaz e Yasmin. "Mesmo assim é uma incidência ainda muito pequena", garante Bonassi.

Já o ginecologista Frederico Correa, especialista em endometriose, diz que os benefícios dessas pílulas são muitos, em especial na redução de sensações desagradáveis para as pacientes, entre eles as dores menstruais. Ele afirmou também que a trombose tem causa genética. "Todos os métodos contraceptivos precisam ser discutidos entre o médico e paciente, para uma escolha mais adequada", aconselha.

Independentemente do conselho, a bióloga Luiza Xavier não usará mais a pílula Yasmin. Ela a usou por três meses, por sugestão da sua ginecologista. Neste período, Luiza esteve na Bahia, participando de um projeto de preservação de baleias. "Tomei porque não podia menstruar, pois trabalhava todos os dias em alto mar. Depois que voltei a Brasília, suspendi e não pretendo voltar. Não senti nenhum incômodo, mas irei conversar com a minha médica", diz a moça.

Entenda a polêmica

Os pesquisadores médicos não se entendem e seus estudos apresentam conclusões diferentes sobre os riscos das novas pílulas anticoncepcionais. O FDA, o todo poderoso órgão de vigilância sanitária dos Estados Unidos, divulgou no início deste mês os resultados de um estudo mostrando que existe um risco maior de trombose venosa em mulheres que tomam anticoncepcional contendo o hormônio drospirenona, em comparação às que tomam contraceptivos mais antigos, à base de levonorgestrel. As pílulas Yaz e Yasmin, do laboratório Bayer, contém o hormônio drospirenona.

A pesquisa analisou o histórico médico de mais de 800 mil mulheres norte-americanas que usavam diferentes métodos contraceptivos, entre 2001 e 2007. Em média, aquelas que tomavam Yaz tinham uma chance 75% maior de sofrer trombose do que as que tomavam anticoncepcionais mais antigos. Outra pesquisa, publicada na primeira semana de novembro e feita com mais de 1 milhão de dinamarquesas, revelou que mulheres que tomavam Yaz e outras medicações mais novas tinham o dobro de risco de trombose em relação às que tomavam o hormônio levonorgestrel. O levantamento foi divulgado no British Medical Journal, obrigando a Anvisa a emitir o alerta aos médicos brasileiros. No entanto, outros dois estudos publicados em 2007, realizados como parte das exigências pós-comercialização da FDA e de reguladores europeus, não encontraram diferença no risco de trombose entre os dois grupos.

O laboratório alemão Bayer, responsável pela produção das duas pílulas, age com cautela. Em um comunicado, a empresa informa que dados clínicos de um período de mais de 15 anos e os resultados de estudos de segurança realizados pós-comercialização de até 10 anos dão suporte à conclusão da Bayer de que os contraceptivos orais combinados que contêm drospirenona em sua formulação são seguros e eficazes quando usados conforme indicação médica. A companhia entende que o risco de trombose relacionado a eles é similar a qualquer outro contraceptivo de baixa dosagem.

E o uso contínuo?
Entre as incertezas sobre os riscos provocados pelas pílulas com drospirenona, as brasileiras desconhecem que o método contínuo de contracepção é uma opção para quem sofre com TPM, cólicas, endometriose. Uma pesquisa realizada com 340 mulheres de 18 a 30 anos em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife concluiu que 71,9% das entrevistadas não sabem da existência do chamado regime contínuo em contracepção, que coloca fim ou, ao menos, diminui os episódios de menstruação.

O estudo do Instituto Resulta com a Libbs Farmacêutica apontou que apenas 19,3% já usaram a contracepção contínua. Mesmo assim, 40% afirmaram que gostariam de não menstruar para evitar, principalmente, cólicas, desconfortos e outros sintomas decorrentes da TPM. Entre as entrevistadas, 45% apontam como a principal dúvida o efeito colateral apresentado pelos métodos orais escolhidos por elas. "Sob os pontos de vista científico e médico, a pílula usada em regime contínuo oferece os mesmos riscos que o uso tradicional ; com pausas mensais de sete ou quatro dias. Atualmente, a mulher pode escolher a frequência do seu ciclo com segurança e sem causar prejuízo ao organismo", garante o ginecologista Rogério Bonassi, presidente da Comissão Nacional de Anticoncepção da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).