Jornal Correio Braziliense

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Dança comigo?

Primeiro, a aula; depois, o baile. Como os brasilienses estendem o prazer de dançar das academias para a noite da capital

Existe uma lei, tão certa quanto à da gravidade, que diz: em todos os salões do planeta, o baile gira em sentido anti-horário. Essa é uma das maravilhas da dança. Outra é que existem ritmos praticamente universais, dançados com igual desenvoltura tanto no Japão quanto em Cuba, por exemplo. Os campeões são a salsa e o tango, que, apesar das coreografias desafiantes, estão ;na ponta do pé; de milhares de bailarinos.
Que fique claro: tamanha popularidade não significa que os cruzes e aberturas do tango e os giros da salsa são instintivos. Tudo demanda treino e um mínimo de aulas preliminares. Em se tratando de dança, a vantagem é que o processo de aprendizagem também é pura diversão. Pensando nisso, a Revista percorreu aulas e bailes de Brasília e conversou com alunos dançarinos que transformam a vida numa balada.

Descomplicando Gardel

Numa aula
Frio na barriga. Na turma de iniciantes há sempre um número considerável de pessoas temerosas de não conseguir acertar os passos e outra parte confiante de que vai sair dançando na primeira aula. Atento às expectativas da turma, o dançarino e professor Marcelo Amorim traquiliza. ;Quero desmistificar o tango porque a maioria das pessoas ainda acha que este é um ritmo muito complicado.;
Enquanto Marcelo escolhe a música que servirá de trilha para a lição do dia, os aprendizes quebram o clima repassando passos básicos, sozinhos, olhando para o espelho. Nada de copiar o colega ao lado. Até porque os passos e giros do tango ;vestem; cada corpo como uma peça única. Para que os iniciantes não se percam, alguns monitores percorrem a sala, tirando dúvidas. Para esquerda ou para direita? Passo para frente ou para trás. Muita calma...
Sentir a música talvez seja o primeiro passo. ;E música é matemática pura;, diz, com propriedade, a aluna Luciana Ventura, 25 anos. Há oito anos, ela, que cursa matemática na Universidade de Brasília (UnB), não perde um dia de tango. A ideia foi sugerida pelo pai, assim que ela saiu do colégio e deixou de jogar basquete. Não sabe bem como explicar a relação estável que mantém com o ritmo. Ao longo de anos de prática, a mesma preocupação com o equilíbrio do corpo e a estética da dança continuam. Não é como andar de bicicleta. ;Se você não pratica, esquece.;
É hora de cavalheiros e damas se posicionarem para dançar juntos. ;La música, señores;;, avisa o professor. Atento, ele corrige daqui, dali, mas não interrompe a dança para apontar erros. ;Democrático, o tango permite que cada casal dance à sua maneira, correspondente ao conhecimento de cada um;, explica.


Numa milonga
O baile de tango tem nome próprio: milonga. Como um ritual, ele segue regras e códigos. Nada de chamar a dama para dançar estendendo-lhe a mão. O cavalheiro olha para aquela com quem quer dançar, aguarda ser correspondido por olhares e, então, dirige-se à dama para convidá-la. Ambos se deslocam para o salão.
Nos primeiros 10 segundos da primeira música da ;tanda; ; grupo de três canções do mesmo autor ou compositor ; o casal escuta o ritmo e, a partir daí, começam a dançar. Ao fim da terceira canção, entra a ;cortina;, um tipo de música diferente, engatilhada pela orquestra ou pelo DJ para que os casais se dissipem, voltem às suas mesas e outra tanda comece com novos pares.
Quando vai aos bailes com a namorada, o engenheiro Henrique Falcão já demonstra a tranquilidade que só a prática traz. ;Uma das dificuldades que o cavalheiro enfrenta é confiar que pode conduzir. Esse foi meu maior desafio, mas também foi o que me ajudou a desenvolver autoconfiança;, conta.
Momento de entrega da dama ao cavalheiro, o tango também permite um maior conhecimento e interação entre homem e mulher. ;Aprendemos a respeitar, a adquirir paciência, identificar no outro aquilo que não conhecemos. Claro que há atritos (risos), mas na média é produtivo para o casal;, acrescenta Henrique.



E agora, a salsa

Música com tempero
Numa aula
Terça-feira, oito da noite. O professor Bruno Mendes, 26 anos, abre as portas da sala para duas horas de salsa. Os primeiros alunos chegam. Curiosamente, mais homens que mulheres. O crescente interesse masculino acompanha a demanda de mulheres em busca de parceiros na pista de dança. Mais alguns minutos e o professor aperta o play. Bongôs e tambores anunciam a melodia que está por vir. Anunciados pelos instrumentos de percussão, os metais compartilham a movida latina. Agora sim, mais damas e outros cavalheiros se espalham pela sala. Que empieze la salsa;
Os primeiros passos básicos, em frente ao espelho, são individuais. Homens e mulheres seguem as instruções do professor. Todos precisam aprender, individualmente, alguns movimentos. Paciente, Bruno passa e repassa giros e passos. No segundo momento da aula, formam-se os pares, dispostos numa roda. Hora de colocar em prática os movimentos. Depois da primeira música, troca-se de par. A ideia é que todos dancem com diferentes parceiros para ;pegar o jeito;.

Numa balada
O ponto de encontro é o bar e restaurante Barcelona. No subsolo, uma taberna à meia luz convida casais e solteiros a arriscar passos ousados e tímidos na pista. Quem não sabe dançar, não tem escapatória. Logo surge a mão de um cavalheiro para chamar a dama para a salsa.
Insinuações ficam de fora em respeito ao parceiro ou parceira. No salão, a história é outra. Aprender novos passos é o grande barato de quem gosta de sair para dançar. ;Aquele cavalheiro, aquela dama ; eles sabem um certo número de passos. Você constrói sua dança baseada no que você também aprende com outros parceiros. Você está ali pela dança e, se precisar, pode cortar gracinhas;, aconselha a aluna e veterinária Letícia Souza Wanderley, 26 anos.
Nada de ciúme na hora de trocar de par. ;Não adianta dançar com apenas uma dama e repetir os mesmos erros. Ou seja, mudando de parceira você aprende mais, e isso para a dama também é importante;, garante o dançarino e professor Bruno Mendes.

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