Já está nas bancas o segundo encarte do projeto "Profissões em Pauta". O caderno de hoje (30/08) faz um diagnóstico completo do mercado técnico, apresentando os mitos e as verdades sobre essa formação. Dentre as histórias apresentadas, destaca-se a do empresário Paulo Rogério, auxiliar de produção que sonhava em ser arquiteto. Sem recursos financeiros para investir em uma universidade, ele se matriculou ainda jovem em um curso técnico de cabeleireiro para dar vasão a uma outra paixão: atuar no ramo da estética. Após um ano de estudos, apto a ingressar no mercado de trabalho, começou a cuidar de cabelos em salões de beleza. Hoje, mais de dez anos depois, é dono de seu próprio negócio e orgulha-se em dizer: tem renda superior a das irmãs, que têm diplomas universitários.
"Não me arrependo de não ter feito arquitetura. Para ser dono do meu próprio salão, tive que trabalhar 12 horas por dia e fazer outros cursos de especialização técnica, alguns até fora do Brasil. E conheço muito cabeleireiro com diploma de advogado e engenheiro", revela o proprietário de um instituto de luxo no Lago Sul, hoje com 45 anos.
Assim como Paulo, os brasileiros, de um modo geral, concordam que os cursos técnicos e profissionalizantes são um caminho rápido para conseguir uma vaga no mercado de trabalho e conquistar uma boa remuneração. Pesquisa recente feita pelo Ibope, a pedido da Confederação Nacional da Indústria (CNI), revela: 90% dos brasileiros acreditam que a educação profissional oferece boas oportunidades para quem quer um bom emprego. Já para 82% dos entrevistados, profissionais com certificado de qualificação profissional têm salários maiores do que os não capacitados. Esses resultados - na avaliação do diretor-geral do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Rafael Lucchesi - ajudam a desconstruir a ideia de que o Brasil não valoriza as profissões técnicas. "O desafio do país, agora, é montar uma rede de informações sobre oportunidades de cursos e oferta de empregos, e assim auxiliar a população na hora de fazer suas escolhas para entrar no mercado de trabalho", diz o executivo.
Reconhecimento no exterior
Apesar de a imagem do ensino técnico estar melhorando no Brasil, apenas 7,8% dos brasileiros optam pela educação profissional, de acordo com o Censo da Educação 2013, divulgado pelo Ministério da Educação (MEC). Já nas 34 nações mais desenvolvidas, a média dos jovens fazendo educação profissional é de 35%, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
Na contramão do Brasil, 76,8% dos australianos, 69,7% entre os finlandeses e 51,5% dos alemães estão inseridos em um contexto de ensino técnico, de acordo com dados do European Centre for the Development of Vocational Training (CEDEFOP).
De todos os países, a Finlândia é o que mais forma profissionais técnicos. O grau de valorização da educação profissionalizante naquele país surpreende: 80% dos finlandeses que concluem o ensino médio optam por um curso da chamada "educação vocacional" e não seguem para a universidade. Por lá, estes cursos tem duração de três anos, com possibilidade de uma especialização depois de três anos e uma espécie de mestrado após cinco anos da conclusão do ensino técnico. Apenas 15% dos egressos destas turmas optam pelo equivalente aos cursos tecnólogos e 5% ingressam nas universidades tradicionais.
Já no Brasil, conforme a pesquisa da CNI, apenas um em cada quatro brasileiros já frequentou ou frequenta algum curso de educação profissional. "A sociedade aposta muito ainda no ensino superior. O preconceito existe, mais pela falta de informação. As pessoas não sabem direito o que faz um profissional técnico, como é a remuneração da carreira e o quanto ele pode crescer dentro da carreira", observa o gerente de Estudos e Prospectiva do Senai, Márcio Guerra.
Preconceito
De fato, ainda persiste no Brasil um pensamento preconceituoso de que pessoas que se formam em cursos técnicos são qualificadas apenas para empregos braçais. Outro mito em torno dessa formação: a suposta baixa qualidade dos cursos, que formaria tão somente mão de obra barata.
"É preciso desmistificar que a educação técnica é simples. Ela não é", defende Felipe Morgado, gerente executivo de Educação Profissional e Tecnológica do Senai Nacional. "Ela exige o uso de muita tecnologia, tem sua complexidade e valor dentro dessa grande cadeia econômica. Hoje, até em uma oficina é difícil encontrar os mecânicos sujos de graxa. É tudo limpo, eles utilizam tecnologias avançadas, que dão todas as informações iniciais do carro. São esses conhecimentos técnicos que aumentam o salário, a empregabilidade e melhoram a produtividade do funcionário. Não há nada de segunda linha em se tornar um técnico. Ao contrário, o estímulo à formação técnica é um dos grandes desafio do Brasil".
Um grande passo nesse sentido foi dado, em 2011, com a criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) - política pública cujo objetivo é expandir a oferta de educação profissional e tecnológica no Brasil por meio de cursos técnicos gratuitos. Desde o lançamento, o programa contabiliza mais de 7,59 milhões de matrículas, sendo 2,16 milhões em cursos técnicos e 5,43 milhões em cursos de qualificação profissional. Conheça um pouco mais do Pronatec amanhã, aqui mesmo, neste hotsite.
PARA SABER MAIS
A Educação Profissional está dividida em três níveis: básico, técnico e tecnológico. Os cursos básicos são abertos a qualquer pessoa interessada, independente da escolaridade prévia; os técnicos são oferecidos simultaneamente ao Ensino Médio ou após a sua conclusão, e têm organização curricular própria; já os tecnológicos são cursos de nível superior. Fonte: Inep/MEC