O Ministério da Justiça afirmou, em documento enviado nesta quinta-feira (06/08) à ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), que a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) não produz dossiês "contra nenhum cidadão" e não instaura "procedimentos de cunho inquisitorial". A secretaria foi acusada de produzir um relatório sigiloso sobre mais de 500 servidores públicos da área de segurança, identificados como integrantes do movimento antifascismo e opositores do presidente Jair Bolsonaro. A existência do dossiê revelada pelo site UOL.
"A SEOPI reitera que sua área de inteligência atua subordinada à mais estrita legalidade, em consonância com os marcos e limites normativos impostos à atividade de inteligência e, portanto, sem qualquer viés investigativo, punitivo e persecutório", afirmou o ministério no documento.
Na terça (4), Cármen Lúcia deu prazo de 48 horas para que o governo enviasse informações sobre o caso. A ministra é relatora de uma ação da Rede Sustentabilidade que pede a "imediata suspensão da produção e disseminação de conhecimentos e informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do ‘movimento antifascismo’ e professores universitários".
O episódio provocou uma mudança na Secretaria de Operações Integradas. Thiago Marcantonio Ferreira, delegado da Polícia Federal, substituiu Gilson Libório na diretoria de Inteligência da Seopi.
O Ministério da Justiça, no documento em que presta esclarecimentos ao STF, pondera que um eventual compartilhamento de informações com o Poder Judiciário poderia ter efeitos nos trabalhos de inteligência.
"A submissão dos documentos produzidos ao Poder Judiciário, ainda que cercada de cautelas, poderia colocar em risco o sistema de salvaguardas das informações e documentos de inteligência e, por consequência, comprometer a credibilidade interna e externa da República Federativa do Brasil no que se refere à estrita obediência dos parâmetros internacionais que regem a Atividade de Inteligência", diz o texto do ministério.
"Isso porque o compartilhamento, desapartado dos ditames da legislação de regência da Atividade de Inteligência, significaria não somente a desconstrução da credibilidade interna e externa da própria República Federativa do Brasil, perante a comunidade internacional de inteligência, assim, corporificando a assunção direta da responsabilidade pelo Poder Judiciário sobre eventuais prejuízos que possam vir a ser suportados pelo Estado, pelas agências de inteligências, por seus servidores e por suas respectivas fontes, com elevado risco de danos irreparáveis, inclusive à vida dos envolvidos", acrescenta a pasta.
O ministério pede, ainda, "parcimônia e sensibilidade" do STF para que o tema seja objeto de fiscalização do Congresso, como é praxe.
"Espera-se, assim, parcimônia e sensibilidade do supremo para que, exercitando a autocontenção, abra espaço para que a Comissão de Controle Externo da Atividade de Inteligência do Congresso promova oportunamente suas atividades de controle externo, em homenagem ao equilíbrio entre os poderes e ao estrito e rigoroso mecanismo de conformação , sob pena de, a pretexto de apurar suposto desvio de finalidade, acabar por invadir a competência do poder legislativo", afirma a pasta.
A existência do relatório foi revelada pelo UOL na semana passada. Segundo a reportagem, "o Ministério da Justiça colocou em prática, em junho, uma ação sigilosa sobre um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do ‘movimento antifascismo’ e três professores universitários”.
Ainda conforme a reportagem, a pasta "produziu um dossiê com nomes e, em alguns casos, fotografias e endereços de redes sociais das pessoas monitoradas."
Em nota divulgada na semana passada, o Ministério da Justiça e a Seopi não negaram a existência do dossiê nem explicaram por que produziram o documento, mas afirmaram que não compete à secretaria produzir dossiê contra nenhum cidadão ou instaurar procedimento de cunho inquisitorial.
Segundo a nota, é rotina da Seopi obter e analisar dados para a produção de conhecimento de inteligência em segurança pública e compartilhar informações com os demais órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência. A secretaria, diz o ministério, "atua na prevenção de ilícitos e na preservação da segurança das pessoas e do patrimônio público".
O governo não explicou quais possíveis riscos essas pessoas listadas no relatório representavam.