Especialistas consultados pelo Correio discordam das justificativas que constam nas decisões do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, que suspendeu busca e apreensão no gabinete do senador José Serra (PSDB-SP) e, depois, barrou as investigações envolvendo o tucano. Toffoli, presidente da Corte, relatou que, no Senado, estão guardados materiais ligados à função parlamentar e que a ordem expedida era muito ampla, podendo gerar apreensão de documento relacionado à atividade de senador.
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, Gustavo Assed Ferreira afirma que a inviolabilidade do parlamentar não se estende ao gabinete ou à casa dele. “Não é porque tem material parlamentar no gabinete que a polícia não pode entrar. Isso praticamente estende inviolabilidade para qualquer investigação envolvendo parlamentar”, argumenta. O professor explica que esse princípio serve para garantir ao parlamentar o direito de se expressar de forma livre, mas não abrange crimes cometidos. “A rainha da prova no direito é a documental. Sem isso, vou fazer o quê? Isso está dando salvo-conduto para deputado, senador, todo mundo. Se essa decisão prospera, vai bater nas câmaras municipais. Olha a caixa de pandora perigosa que estamos abrindo no Brasil por um casuísmo. Isso tem que ser revertido, porque, se prosperar, vai atingir as Casas legislativas do Brasil todo”, alerta o professor sobre risco de precedentes.
Proteção
Há uma decisão de 2017 no STF que debateu sobre medidas cautelares contra parlamentares, definindo que, em casos que dificultem ou impeçam o exercício regular do mandato, a decisão deveria ser remetido à Casa Legislativa em 24 horas. O criminalista Andrew Fernandes avalia que será preciso também discutir melhor sobre medidas em gabinetes de deputados federais e senadores. “Entendo o Toffoli, o problema é que, em muitos outros casos, não tinha impedimento e, agora, tem? Isso gera insegurança jurídica”, reforça.
Professora de direito constitucional da USP de Ribeirão Preto e do Centro Universitário de Bauru, Eliana Franco Neme detalha que a proteção aos parlamentares foi colocada na Constituição Federal para que eles possam exercer a função sem medo de serem punidos por isso. “São invioláveis por suas palavras e votos”, ressalta, explicando que a deputados e senadores também foram concedidas garantias formais, como a prerrogativa de serem processados pelo Supremo — nesse caso, desde 2018, apenas por crimes cometidos no exercício do mandato e que tenham relação com a função.
Para Eliana, não deve haver regra diferente para busca e apreensão em gabinetes parlamentares. “A proteção do parlamentar é em razão do meio. Se, na busca e apreensão, aparecer uma declaração de voto, algo da atividade, não se consegue nem usar, porque diz respeito ao trabalho dele. Mas não posso usar uma proteção material da Constituição Federal para acobertar crimes”, afirma.