O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, caracterizou como “crucial” o papel do Poder Judiciário para suavizar os impactos sociais e econômicos inevitáveis da pandemia da covid-19. Ele ressaltou, também, que as medidas da Justiça não podem substituir a atuação dos poderes responsáveis pela elaboração de políticas públicas de combate ao novo coronavírus.
“É ainda mais fundamental que o Judiciário atue nesta época, mas que também tenhamos uma atuação com prudência e autocontenção para que nós não substituamos aqueles que têm o poder legítimo da democracia para estabelecer as políticas públicas necessárias ao combate à pandemia”, defendeu, ontem, em congresso digital promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre as repercussões jurídicas e sociais da doença.
No mesmo evento, o também ministro do STF Luiz Fux pontuou sobre a soberania da Constituição Federal, mesmo em meio a um cenário de anormalidade, como da pandemia. “É muito importante que tenhamos em mente que vivemos num momento de exceção, mas não estamos em um estado de exceção, vivemos um momento de exceção dentro de um Estado de direito”, frisou, referindo-se às decisões de juízes em relação à covid-19.
Fux também esclareceu, mais uma vez, a decisão da Corte de dar autonomia a estados e municípios na condução de medidas de combate à disseminação do vírus. “À luz dos riscos que essa pandemia trouxe, o STF estabeleceu que a competência dos estados em calamidade pública é da União, mas essa competência não exclui a responsabilidade concorrente de estados e municípios, máxima quando eles apresentam peculiaridade local e que a proteção dada por estados e municípios é mais eficiente do que a concedida genericamente”, disse.
O ministro também destacou o rompimento dos tetos estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal como um dos principais impactos jurídicos trazidos pela pandemia. Segundo ele, a decisão teve como lado positivo atender a comunidade carente do país. “Neste momento, o Brasil passou a ter consciência de que não pode deixar à própria sorte a dignidade humana, esses 50 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza”, enfatizou. Ele ponderou, no entanto, que essa mesma medida contribuiu para atos de corrupção.
Atrito
Outro ministro a destacar o papel do STF na pandemia foi Luís Roberto Barroso. Apesar de o Brasil ser o segundo país com mais vítimas da covid-19, um estudo publicado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), neste mês, estima que políticas de isolamento social adotadas por estados salvaram 118 mil brasileiros. Ontem, o magistrado afirmou que decisões da Corte contribuíram para “salvar vidas” no país, mesmo que isso tenha causado atrito com o governo federal.
As medidas às quais Barroso se referiu foram: a autonomia de estados e municípios para determinar ações de combate à pandemia; a proibição de o governo federal veicular a campanha “O Brasil não pode parar”, contrária ao isolamento social; e a obrigatoriedade do Executivo de divulgar estatísticas de infecção e morte pela covid-19. “Evidentemente, sempre que se limita o poder, traz algum grau de controvérsia, o choro e ranger de dentes, mas acho que foram decisões corretas, que fizeram bem ao país e que salvaram muitas vidas”, afirmou.
Felix Fischer internado
O ministro Felix Fischer, relator do habeas corpus do ex-assessor Fabrício Queiroz no Superior Tribunal de Justiça (STJ), está internado em Brasília. Segundo quatro magistrados da Corte ouvidos reservadamente, ele será submetido a uma cirurgia de risco — não se trata de infecção por covid-19.
Fabrício Queiroz foi beneficiado por uma decisão de plantão do presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, que concedeu prisão domiciliar ao ex-assessor de Flávio Bolsonaro em razão da pandemia do novo coronavírus. O benefício foi estendido à Márcia Aguiar, mulher de Queiroz. Os dois são alvo de investigação do esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
A decisão, contudo, poderia ser revista por Fischer, considerado linha dura dentro do tribunal, segundo a avaliação de ministros do STJ. A aposta nos bastidores é que o relator leve o caso para apreciação da Quinta Turma.
Não há previsão de quando isso poderia ocorrer, e um eventual afastamento do ministro pode levar o habeas de Queiroz a ser encaminhado para o ministro Jorge Mussi, o integrante mais antigo da Quinta Turma.
Fischer também é relator da Lava-Jato no STJ. Em julho do ano passado, o ministro foi internado no Hospital Brasília para tratar de uma embolia pulmonar.