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Ideia do governo de reduzir ou extinguir isenções do IR afeta classe média

Após projeto de simplificação de tributos federais sobre o consumo, governo trabalha proposta para diminuir ou extinguir isenções no Imposto de Renda da Pessoa Física, o que atingirá a classe média. A contrapartida seria a correção na tabela do Leão, defasada há cinco anos

Após apresentar um projeto de lei de reforma tributária de fácil aprovação, apenas com a pretensão de simplificar tributos federais sobre o consumo, o governo federal prepara-se, agora, para mexer em um vespeiro. Resolvido o impasse sobre bens e serviços, os próximos passos incluem a revisão da tributação sobre os rendimentos de pessoas e empresas e mudanças no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A equipe econômica pretende enviar os projetos ao Congresso em 30 dias.


Uma das propostas prevê diminuição ou até o fim das deduções no Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). A revisão prejudica a classe média, que costuma receber de volta parte dos gastos com saúde e educação declarados ao Leão. Para compensar, o governo pretende corrigir a tabela do IRPF, defasada há cinco anos, promessa do presidente Jair Bolsonaro.


A desatualização no piso do imposto, hoje de R$ 1,9 mil, prejudica, principalmente, os contribuintes mais pobres. Boa parte dos que hoje descontam 7,5% dos rendimentos, primeira faixa do IRPF, não precisaria pagar, se a tabela tivesse sido corrigida nos últimos anos. No fim de 2019, Bolsonaro disse que o governo pretendia aumentar a faixa de isenção para R$ 3 mil.


Também com o argumento de reduzir distorções, o governo quer taxar dividendos, parte do lucro da empresa distribuída aos sócios e acionistas de empresas. Desde 1996, esses valores não são tributados, o que estimula empresários a distribuírem o dinheiro, em vez de reinvestirem. Na prática, a isenção beneficia as camadas mais ricas da sociedade. A ideia é cobrar sobre os dividendos e, em troca, reduzir a alíquota do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ).


A transição seria feita de forma gradual, para não causar um “choque de arrecadação”. Mesmo com a contrapartida, tributaristas ouvidos pelo Correio acenaram positivamente para a correção no IR, mas fizeram ressalvas quanto à taxação de dividendos. “O assunto está em pauta há algum tempo e acho que essa discussão precisa ser considerada, desde que venha com ajuste na tributação da renda”, defendeu a advogada tributarista Vanessa Cardoso.


“É importante, realmente, garantir correção de distorções, mas sem aumento de impostos. Taxar dividendos sem rever a tributação sobre a renda, tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas, pode aumentar a carga tributária”, explicou a advogada, sócia do escritório De Vivo, Castro, Cunha, Ricca e Whitaker Advogados. “Medidas isoladas, como limitar deduções, não corrigem distorções”, resumiu.


A isenção dos dividendos, Segundo o presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), Gustavo Brigagão, "A revogação da isenção vai fazer com que a economia volte à informalidade". Se a taxação for retomada, “o investidor fica sem mobilidade”, disse.


Advogada tributarista e ex-integrante do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), Mirian Lavocat concordou. “Sou contra a tributação de dividendos. A empresa, quando faz essa distribuição entre sócios, já foi tributada como pessoa jurídica. Seria uma bitributação”, criticou.

No radar

O governo também pretende reformular o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A ideia é transformá-lo em um Imposto Seletivo, que incidirá apenas sobre produtos como bebidas e cigarros. A proposta já é discutida pelos parlamentares há mais de um ano. Foi mencionada, inclusive, durante os debates sobre as propostas de emenda à Constituição (PEC) 45 e 110 — reformas sugeridas, respectivamente, por Câmara e Senado.

 

A desoneração dos produtos da cesta básica foi mantida no projeto enviado na terça-feira, mas o governo já avisou que esse ponto deve ser alterado em breve. A ideia é voltar a cobrar impostos sobre itens essenciais, como arroz e feijão. O dinheiro a mais gasto pelos mais pobres seria devolvido pelo programa Renda Brasil, que substituirá o Bolsa Família. O secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto, disse que a proposta virá na próxima etapa da reforma.