Politica

Fundeb sob fogo cruzado

Câmara começa a votar PEC do fundo do ensino básico hoje, mas contraproposta do governo, que circulou entre líderes no fim de semana sugerindo o adiamento por um ano, recebe críticas por poder comprometer o funcionamento das escolas em 2021

A Câmara dos Deputados começa a votar hoje a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n° 15/15, que torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e aumenta, em dez pontos percentuais, nos próximos seis anos, a fatia de recursos da União, atualmente, de 10%. A votação ocorre em meio à polêmica em torno de uma contraproposta do governo que circulou entre os parlamentares, no sábado, propondo renovação do fundo somente a partir de 2022.
Além disso, o texto sugere que metade do acréscimo previsto para os recursos da União fosse para programas sociais, como o Renda Brasil, novo programa que está sendo elaborado pelo governo para substituir o Bolsa Família. O Fundeb, responsável por 63% do financiamento da educação básica, ficará sem dinheiro no próximo ano caso essa proposta do Executivo seja aprovada.


A votação da PEC do Fundeb na Câmara será o primeiro grande teste da aproximação entre o presidente Bolsonaro e o Centrão, grupo parlamentar de centro-direita que recebeu vários cargos importantes na administração federal em troca de apoio ao governo. Os recursos são aplicados por estados e municípios na remuneração dos profissionais de educação, no transporte escolar, na aquisição de equipamentos e material didático, na construção e manutenção das escolas, conforme o artigo 70 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O fundo vai expirar no fim do ano se não for prorrogado a tempo pelo Congresso.


A deputada Professora Dorinha (DEM-TO), relatora da PEC do Fundeb na Câmara, considerou a contraproposta do governo uma ameaça de “apagão” da educação básica no próximo ano, com o possível fechamento de escolas e outros prejuízos para o setor. Ela disse que a ideia de remanejar recursos do fundo para programas sociais é inconstitucional e “certamente não será aprovada pela Câmara”.

Teto e piso
A proposta do governo também prevê mudanças na parte da PEC que trata da remuneração dos profissionais de educação. O texto em análise na Câmara aumenta de 60% para 70% o piso de recursos do Fundeb para o pagamento de salários da categoria. A contraproposta do governo, porém, estabelece um teto de 70% para a destinação de recursos do fundo para essa finalidade. Isso inviabilizaria o pagamento dos profissionais em várias redes estaduais e municipais, que já destinam percentual maior do que 70% para esse fim.


O presidente da Comissão que analisa a PEC do Fundeb na Câmara, deputado João Carlos Bacelar (Podemos-BA), também criticou a contraproposta do governo. Ele acusou o presidente Jair Bolsonaro de querer usar o dinheiro do Fundeb para comprar votos por meio de programas sociais, pois o Fundeb não estaria sujeito ao teto de gastos. Disse, também, que o chefe do governo “nunca se preocupou com a educação”.


“Bolsonaro tenta, mais uma vez, atrapalhar a tramitação da PEC 15/15, que torna o fundo permanente. Dessa vez, o governo enviou aos líderes partidários um texto informal sugerindo que o Fundeb só começasse a vigorar a partir de 2022 e que a complementação adicional da União fosse repartida com o Renda Brasil, programa que deve substituir o Bolsa Família. A proposta do governo não explica como ficaria o financiamento da educação em 2021”, afirmou o deputado, em nota. “Querem o Brasil ignorante e com votos comprados. Empurrar o Fundeb para 2022 e destinar parte significativa do recurso para sustentar um programa assistencial é fazer cena eleitoral”, destacou. Ele também criticou a equipe ministerial por não ter se envolvido na construção da PEC 15/15. “É um absurdo sugerir mudança no texto aos 45 minutos do segundo tempo. Não vamos aceitar essa proposta esdrúxula”, disparou o deputado.

Atitude desumana
O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, classificou como “desumana e vergonhosa” a atitude do governo em relação ao tema. Ele lembrou que, na reunião em que o parecer da deputada Professora Dorinha foi apresentado à Comissão da Câmara, o líder do governo na Casa, deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), assegurou que a bancada governista aprovaria o texto. “E, agora, eles virem com essa proposta é muito absurdo, porque um ano sem Fundeb é um ano sem termos recursos para a educação básica, e, num momento como esse de você ter a recuperação de uma pandemia, sabendo que antes mesmo as escolas já precisavam de recursos, é algo completamente desumano. É vergonhoso”, disse o presidente da UNE. Ele reforçou que a maioria dos partidos já manifestou apoio ao relatório, não tem por que mudar agora. “Essa é mais uma loucura do governo, que, além de não ajudar no debate, atrapalhou porque o Abraham Weintraub, quando era ministro da Educação, tentou reduzir os recursos do Fundeb”, acrescentou.


A presidente da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES), Rozana Barroso, afirmou que o Fundeb é uma pauta histórica dos estudantes e que, há meses, a entidade está alertando para a necessidade de um fundo novo e permanente. Ela avaliou que o adiamento do Fundeb para 2022 pode acarretar em fechamento de escolas em 2021. “Não ter o Fundeb por um ano significa isso. Não existe falar de um Brasil que supere esse momento difícil que passamos sem colocar a educação no centro. O ensino infantil e até o de jovens e adultos está em risco. Por isso permanecemos mobilizados para a votação no dia 20 e 21. Defendemos a aprovação da PEC 15/15 conforme o parecer da relatora, em defesa da educação básica, em defesa do nosso país!”, disse. Segundo ela, a entidade colocará uma faixa em frente ao Congresso para pressionar os deputados.


Procurada, a assessoria de imprensa do Ministério da Educação não retornou até o fechamento desta edição. O líder do governo na Câmara, Major Vítor Hugo, ao ser procurado, também não comentou o assunto.

 

Flávio Bolsonaro vai depor no MPF

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) vai depor hoje, ao Ministério Público Federal (MPF), na investigação que apura supostos vazamentos da Polícia Federal na Operação Furna da Onça. O depoimento do filho do presidente Jair Bolsonaro será na condição de testemunha a um procurador da República que vai ao seu encontro em Brasília.


Em nota divulgada no sábado, a assessoria do parlamentar informou que o senador marcou a data do depoimento “para que a verdade seja restaurada o mais rápido possível”. Ele foi intimado em 19 de junho e tinha trinta dias para marcar a data do depoimento.


A investigação do MPF faz parte do procedimento aberto para apurar declarações feitas pelo ex-aliado do governo, o empresário e pré-candidato à prefeitura do Rio, Paulo Marinho (PSDB), de que o filho mais velho do presidente foi previamente avisado sobre a operação que trouxe à tona as movimentações atípicas nas contas de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.

Rachadinha

O ex-funcionário de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio foi citado em um relatório do antigo Conselho de Atividades Financeiras (Coaf), o que arrastou o então deputado estadual para o centro de uma investigação criminal sobre suposto esquema de desvio de salários em seu gabinete, a chamada rachadinha.


Marinho afirma que, segundo relato do próprio Flávio, um delegado da Polícia Federal avisou das investigações pouco após o primeiro turno das eleições daquele ano e informou que membros da Superintendência da PF no Rio adiariam a operação para não prejudicar a disputa de Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018. Na ocasião, Flávio disse que a acusação era uma “invenção” e que o empresário teria interesse de prejudicá-lo, uma vez que é seu suplente no Senado Federal.