Uma imagem a reconstruir
A saída de Abraham Weintraub pelas redes sociais — ou talvez pela porta dos fundos do MEC —, com indicação para ocupar uma diretoria do Banco Mundial, abriu um novo debate em torno do ex-ministro. A possibilidade de o bolsonarista ser alçado a um posto executivo na instituição que integra o sistema financeiro internacional provocou reação imediata. O ex-ministro Rubens Ricupero acionou o prestígio internacional e a rede de contatos que conquistou pelo mundo para alertar as embaixadas sobre a temeridade de se escolher um militante com tamanho grau de intempestividade em um cargo estratégico do multilateralismo internacional. Não se trata somente de uma divergência política doméstica, tão comum na quadra atual dos acontecimentos. A escolha de Weintraub para um cargo relevante na política externa brasileira pode redundar em consequências nefastas para a imagem do país na comunidade internacional. Nas palavras de Ricupero, Weintraub no Banco Mundial representaria “um atentado ao pouquíssimo que restava da credibilidade externa do Brasil”.
Convém lembrar que, no extenso rol de ataques, impropérios e confusões protagonizados pelo histriônico bolsonarista, alguns com implicações legais, estão os insultos dirigidos à China, país que exerce enorme influência no Banco Mundial, bem como na economia globalizada. Nomear Weintraub para o Banco Mundial poderia aliviar momentaneamente as aflições do Planalto, que procura se livrar do desgaste político e do constrangimento de ver um ministro criminalmente imputado pelo Supremo Tribunal Federal. Mas é enorme o risco de agravar a situação do Brasil na comunidade internacional considerando-se o histórico de Weintraub na vida pública nacional. Convém ressaltar, ainda, que o fato de Weintraub ocupar um cargo em Washington não o impede de causar mais problemas no Brasil, pois boa parte dos despautérios do ex-ministros emergem nas redes sociais. Estão aí Olavo de Carvalho e o bando de lunáticos das fakes news sob investigação pelo STF para provar que a virulência política não precisa ter endereço ou dar expediente em Brasília.
A presença de Weintraub no Banco Mundial constitui, na verdade, parte de um problema muito maior para o governo Bolsonaro: reconstruir a imagem do Brasil no exterior. Não é de hoje nem de ontem que a política externa brasileira é alvo de sérias ressalvas. Parte da insatisfação concentra-se no perfil ideológico do ministro Ernesto Araújo, que se apresenta como crítico ao que entende por globalismo. Mas é nas ações domésticas – e nem se faz mais necessário mencionar a constrangedora intenção de nomear Eduardo Bolsonaro embaixador em Washington – que o Brasil tem sequestrado a credibilidade necessária para ocupar um lugar mais relevante na comunidade internacional. A desastrosa política de enfrentamento à pandemia do coronavírus, marcada pela desarticulação, quando não pelo confronto, entre o governo federal e os estados na condução das estratégias de contenção da doença, causa enormes danos de ordem sanitária e terá consequência no esforço de retomada econômica. O confronto com a Organização Mundial da Saúde é outra frente de desgaste, com evidente prejuízo para os esforços internacionais de combate à pandemia, para o reconhecimento de políticas públicas de saúde bem-sucedidas e, em última instância, para o prestígio da ciência e da medicina brasileiras. A questão ambiental também se tornou um passivo relevante, na medida em que o desmatamento cresce em alta velocidade e o atual governo não é afeito a ter uma sólida agenda de defesa do meio ambiente. Pelo contrário, como revelou a reunião ministerial de 22 de abril, o importante é “passar a boiada” enquanto a imprensa está ocupada em noticiar o avanço da covid-19. E, por último, a crônica violação de direitos humanos, problema que permanece insolúvel na realidade brasileira.
A imagem externa do Brasil já vinha desgastada bem antes de Jair Bolsonaro subir a rampa do Palácio do Planalto. Os escândalos dos governos petistas, com o assalto bilionário aos cofres públicos nos esquemas do petrolão e do mensalão, minaram o ambiente econômico do país e dinamitaram o prestígio de Luiz Inácio Lula da Silva, que, em algum momento, tornou-se celebridade internacional em razão de sua trajetória pessoal e de programas como o Fome Zero. A aproximação com regimes notoriamente antidemocráticos, como Cuba e Venezuela, além de uma preferência ideológica de estabelecer relações comerciais com países do chamado eixo Sul-Sul, também foram erros crassos do Itamaraty sob a gestão petista. Em tese, o governo Bolsonaro teria condições de reverter essa “herança maldita” e apresentar um novo Brasil ao mundo. Mas, até o momento, não se vislumbram ações convincentes nesse sentido.