O impacto político da prisão de Fabrício Queiroz no governo de Jair Bolsonaro ainda não pode ser medido, mas não há dúvidas de que poderá ser grande, dependendo dos desdobramentos das investigações daqui para frente, de acordo com analistas e políticos ouvidos pelo Correio. Também não parece restar dúvidas de que se o ex-policial militar ou sua mulher, que está foragida, fizerem delação sobre os esquemas das rachadinhas no gabinete do então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro, ou sobre o suposto envolvimento do ex-auxiliar com as milícias, o risco político pode aumentar.
“O tamanho do impacto é potencialmente grande pelos desdobramentos que podem ter. Aumenta o desgaste político, enfraquece o presidente junto ao Judiciário e retira energia do governo no momento da pandemia”, avaliou o cientista político e advogado Murillo de Aragão, sócio da Arko Advice.
O cientista político Carlos Melo, professor do Insper, evita fazer previsões, porque espera ver quais serão as próximas revelações da polícia. Mas reconhece que Bolsonaro está em um momento político muito difícil e bastante enfraquecido, a ponto de deixar no ar uma tensão sobre golpe de Estado.
“A questão é que as condições políticas em que Bolsonaro está no momento são complicadas. Existe uma pandemia que ainda não se dissipou, e ele não conseguirá tirar o corpo disso. Ele é o presidente da República e já foi alertado de que será responsabilizado por minimizar a crise e chamar a covid-19 de gripezinha”, afirmou. Melo ainda lembrou que o presidente em problemas com o Supremo Tribunal Federal (STF), onde há processos que atingem em cheio seus apoiadores, além da ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que pode impugnar sua chapa na eleição de 2018 –– e devem enfraquecê-lo ainda mais.
Apesar de Bolsonaro ter iniciado uma aproximação com o Centrão para aumentar a base aliada e evitar processos de impeachment no Congresso, os partidos do bloco são muito voláteis, segundo Melo. “O presidente está na defensiva e é claro que a polícia e os tribunais vão ter que trazer novos elementos para justificar a prisão de Queiroz, como ocorria na Lava-Jato”, destacou.
Impeachment
A sorte de Bolsonaro é que não há interesse do Congresso em dar andamento aos processos de impeachment que se acumulam na gaveta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). De acordo com dados da assessoria da Casa, até 8 de junho foram recebidos 48 pedidos contra Bolsonaro. Desse total, 46 estão em análise; a maior parte, 42, foi protocolada neste ano.
“Enquanto não houver pessoas nas ruas pedindo impeachment, o Congresso não deve avançar esses pedidos. O Centrão vai aproveitar e participar da administração do governo, por enquanto. E só vai se movimentar quando vir que há um risco iminente de queda de Bolsonaro. Ao contrário dos apoiadores fiéis, não vai ficar na base apenas por amor”, avaliou Melo, lembrando Tancredo Neves, que disse que “o político vai com o outro até a cova, mas não se joga”.
Na avaliação do cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, o andamento da agenda econômica no Congresso, com mais esta crise política que deve ocorrer com a prisão de Queiroz, poderá ser prejudicada. “Os parlamentares não encampam as teses de impeachment, mas é difícil imaginar um controle da agenda do Congresso por parte do Executivo nesse processo. A aliança do presidente com o Centrão, naturalmente, vai ter um custo para o tipo de agenda e encaminhamento das pautas econômicas”, afirmou.
O deputado Marcelo Ramos (PL-AM), vice-líder do Centrão, não vê impacto na bancada. “Claro que a turma fica um pouco na defensiva, mas não vejo um impacto relevante na tentativa do governo em formar uma base. Mas lógico que é preciso ficar atento aos desdobramentos”, afirmou.
O líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO), minimizou a prisão de Queiroz e disse não atinge o presidente. “O nosso desejo é que as investigações, que se voltam para eventos ocorridos na Assembleia do Estado do Rio, atinjam, de maneira igual, com o mesmo rigor, imparcialidade e transparência todos citados no relatório do Coaf”, defendeu.
De acordo com o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da Oposição na Câmara, o fato de Queiroz ter sido encontrado na casa de um advogado ligado aos Bolsonaro é “gravíssimo”. “A principal preocupação do presidente da República não é com a saúde do povo na pandemia, com a garantia de uma melhor educação ou com os empregos dos brasileiros, mas apenas em proteger a sua família e os seus amigos da polícia”, atacou.
Detenção repercute na imprensa estrangeira
Alguns dos principais veículos de imprensa internacionais noticiaram a prisão de Fabrício Queiroz. “Outro golpe indireto para um líder já em apuros”, exibiu o jornal americano The New York Times. O texto fala que a imagem do presidente Jair Bolsonaro foi contaminada pela situação. “As investigações ameaçam minar sua promessa de campanha de reprimir a corrupção”, aponta. O britânico The Guardian foi igualmente incisivo. “Polícia brasileira prende aliado de Bolsonaro em inquérito sobre corrupção”, salientou, lembrando que Bolsonaro foi eleito com a bandeira anticorrupção. O francês Le Figaro observa que “esta é uma investigação potencialmente embaraçosa para Jair Bolsonaro”. E o espanhol El País lembrou que “o escândalo de Flávio Bolsonaro eclodiu depois que seu pai venceu a eleição com uma campanha na qual ele sinalizou a luta contra a corrupção”.
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