Correio Braziliense
postado em 18/06/2020 17:37
O ministro Marco Aurélio Mello foi o único dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF) a votar a favor da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) número 572, que questiona a validade do inquérito 4.781 contra as fake news aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele afirmou que ao dar continuidade ao inquérito, a suprema corte está agindo de forma inquisitorial, contrária ao sistema jurídico brasileiro. Também criticou o fato de o presidente do STF, Dias Toffoli, ter escolhido a dedo Alexandre de moraes como relator, em vez de sorteá-lo, o que argumentou ser antidemocrático, e disse que o inquérito é “natimorto” e não poderá tramitar.
A principal argumentação de Marco Aurélio apontou as diferenças entre o sistema acusatório e o inquisitorial, onde o juiz é, também, acusador do investigado e, portanto, tem uma opinião contaminada dos fatos. “Se um órgão que acusa é o mesmo que julga, não há garantia de imparcialidade, e haverá tendência em condenar o acusado, o que estabelece posição de desvantagem do acusado na partida da ação penal. O inquérito inquisitorial diminui a confiança e a credibilidade do sistema de justiça. O viés de um juiz confirmar na sentença sua própria acusação é uma variável que não pode ser descartada no sistema inquisitorial”. Argumentou o magistrado.
“Daí, logo se percebe que a finalidade que alimenta o sistema acusatório é a necessidade de garantir que investigados e acusados um processo penal imparcial, livre de pré-compreensões decorrentes de sua prévia atividade de preparar a investigação e a acusação. Afrânio Silva Jardim adverte com propriedade, que o princípio mais importante para o sistema penal moderno são o da imparcialidade do juiz e o direito ao contraditório. O princípio da demanda ou iniciativa das partes próprio do sistema acusatório decorre da indispensável neutralidade do órgão julgador. Sem ela, toda atividade jurisdicional restará viciada”, continuou.
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Marco Aurélio usou argumentos de um trabalho de autoria da ex-procuradora geral Raquel Dodge. “Para que o princípio central que anima o sistema acusatório seja realmente alcançado, garantir julgamentos de juízes imparciais e neutros, não basta que o juiz que julgue não seja o mesmo que acuse. É necessário também que o juiz que julgue não seja o mesmo que investigue os fatos que, a seguir, constarão na acusação. O juiz que investiga se vincula e a emoção está presente na vida de todos nós. Se vincula, ainda que inconscientemente, aos resultados da sua investigação, o que lhe diminui a capacidade de avaliar com distanciamento a acusação posteriormente feita por outro órgão”, citou.
“Justamente por isso, o pilar do sistema penal acusatório é a baliza que juízes devem se manter distantes da fase pré-processual de coleta de provas necessárias à formação da opinio delicti e formulação da acusação, nela atuando apenas quando provocado pelas partes. Como um ato de constrição contra possível envolvido. Para que o sistema processual penal seja genuinamente acusatório, magistrados não devem instaurar inquérito, sem prévia provocação dos órgãos de persecução penal. Não devem ter iniciativa probatória. Cabendo nessa atividade ao órgão de acusação no brasil, a teor da Constituição Federal, o Ministério Público, destinatário da prova produzida”, expôs.
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Para o ministro, é precisamente o inquérito do STF faz as vezes de inquérito inquisitorial. “É precisamente o que ocorre, disse sua excelência, no inquérito 4781, cuja instauração foi feita por magistrado, e cuja condição investigatória está sendo feita por magistrado sem participação do MP, em afronta à Constituição Federal e ao sistema acusatório. E prossegue versando a instauração de ofício do inquérito e abordando a problemática para mim seríssima, o ato de se ter escolhido a dedo o relator do inquérito, sem observância do sistema democrático da distribuição”, avisou.
“Presidente, estamos diante de um inquérito natimorto. Diria mesmo um inquérito do fim do mundo, sem limites. Peço vênia à maioria acachapante de oito votos para dissentir. Eu faço acolhendo pedido formulado na ADPF para fulminar o inquérito, porque o vício inicial contamina a tramitação. Não há como salvá-lo em que pese a ótica revelada posteriormente pela mesma PGR. Devo ressaltar que inicialmente, esse inquérito foi encoberto pelo sigilo, e receio muito coisas misteriosas. Só se deu margem a acesso de investigados passados 30 dias. É como voto”, proferiu.
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