Politica

Todos querem Camargo fora

Áudio vazado de reunião com ofensas ao movimento negro e aos heróis da cultura afro-brasileira coloca lado a lado a OAB, várias entidades e parlamentares, que exigem troca na presidência da Fundação por considerarem o atual ocupante indigno de ocupar o cargo

Os ataques de Sergio Camargo, presidente da Fundação Palmares, que em um áudio divulgado na terça-feira chamou o movimento negro de “escória maldita” — entre outras ofensas a Zumbi dos Palmares e até a uma mãe de santo —conseguiu indignar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), parlamentares e representantes da militância. A presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade (CNPI), Silvia Cerqueira, disse ontem que pediu para a OAB entrar na Justiça pedindo o afastamento de Camargo, aproveitando um processo interno em tramitação ao qual serão acrescentados dados do mais recente episódio envolvendo o jornalista.

“A permanência dele é um retrocesso”, disse a presidente da CNPI, Sílvia Cerqueira. A advogada afirma que Camargo precisa responder civil e criminalmente pelas últimas afirmações que fez, assim como o estado, uma vez que ele representa o governo federal. “Ele está em um lugar inadequado, ele não poderia ser dirigente de uma instituição que foi construída para a defesa do movimento negro, sobretudo as populações quilombolas e as políticas afirmativas”, disse.

Silvia afirma ainda que Camargo tenta desconstruir o movimento. “Por ali (Fundação Palmares) passaram pessoas do mais alto desenvolvimento intelectual. As pessoas que passaram ali nos honraram. Aí, de repente, esse senhor cai de paraquedas. Nos causa vergonha e constrangimento”, lamentou.

Paralelamente, um grupo de deputados federais impetrou ontem um pedido para que o Ministério Público Federal abra inquérito para investigar os novos ataques de Camargo. Os signatários são os parlamentares Benedita da Silva (PT-RJ), Orlando Silva (PCdoB-SP), Fernanda Melchionna (PSol-RS), Talíria Petrone (PSol-RJ), David Miranda (Psol-RJ), Bira do Pindaré (PSB-MA) e Damião Feliciano (PDT-PB). O presidente da Palmares pode ser responsabilizado por improbidade administrativa e abuso de poder.

Movimentos

Já o Coletivo de Mulheres do Axé do Distrito Federal e o Coletivo de Culturas Populares do Distrito Federal, composto por 21 grupos, pediram a exoneração de Camargo. Por meio de nota, repudiaram as manifestações do presidente da Palmares.

Para o Coletivo de Culturas, Camargo representa uma conduta que atenta contra os princípios fundamentais da república e oferece resultados danosos à sociedade brasileira. Ressalta ainda que ele “insulta e ataca gravemente a dignidade, integridade e honra de Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra do Brasil escravocrata”.

Por sua vez, o Coletivo de Mulheres afirmou que as declarações do presidente da Palmares configuram atos de racismo e intolerância religiosa. “Exigimos respeito e retratação desta instituição perante as ofensas criminosas cometidas contra nosso povo. Somos macumbeiras com orgulho, Sr. Sérgio. Macumbeiros são músicos, tocadores de um instrumento africano”, condenaram.

Também emitiu nota pedindo a saída de Camargo um grupo formado por 49 organizações, incluindo o Coletivo de Entidades Negras do DF (CEN-DF) e a Federação Nacional das Associações Quilombolas. Para as entidades, o presidente da Palmares “reafirma a todo momento, com seu ódio, não ter capacidade moral, profissional, intelectual e também não ter a impessoalidade necessária para estar à frente da Fundação Cultural Palmares”.

Mãe Baiana
A mãe de santo Adna Santos, a Mãe Baiana –– que é coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Diversidade Religiosa da Subsecretaria de Direitos Humanos e Igualdade Racial no Distrito Federal –– foi mais uma vítima dos ataques de Camargo. Ela prestou queixa, ontem, na Polícia Divil do DF, contra o jornalista, por ter sido chamada pejorativamente de “macumbeira”. No boletim de ocorrência, foram qualificadas as seguintes infrações penais: crime praticado pela internet, injúria racial, discriminação racial e discriminação religiosa.

“Acho feio (a permanência de Camargo) porque é uma instituição tão bonita, com representatividade nacional e internacional”, disse Mãe Baiana, que afirma não conhecer o jornalista.