Em duras palavras, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que “o ovo da serpente parece estar prestes a eclodir no Brasil”. Ele fez referência a ações que podem colocar sob ameaça o regime democrático. De acordo com o magistrado, o país vive um processo semelhante ao que viveu a Alemanha pouco antes de Adolf Hitler ascender ao poder por meio do voto e implementar o nazismo. As declarações do magistrado ocorreram por meio de uma mensagem encaminhada pelo ministro mais antigo da Corte para interlocutores e colegas de plenário. No texto, o juiz mais antigo da Corte afirma que “bolsonaristas querem implantar uma desprezível e abjeta ditadura militar”.
Na mensagem, Mello afirma que existem fortes sinais de que a política brasileira vive um cenário que pode ter resultados devastadores, como ocorreu durante o nazismo. “Guardadas as devidas proporções, o 'ovo da serpente', à semelhança do que ocorreu na República de Weimar (1919-1933), parece estar prestes a eclodir no Brasil”, escreveu Celso de Mello.
Em seguida, o magistrado afirma que é necessário resistir à derrocada da democracia. “É preciso resistir à destruição da ordem democrática, para evitar o que ocorreu na República de Weimar quando Hitler, após eleito por voto popular e, posteriormente, nomeado pelo presidente Paul von Hindenburg, em 30/01/1933, como chanceler (primeiro ministro) da Alemanha (Reichskanzler), não hesitou em romper e em nulificar a progressista, democrática e inovadora Constituição de Weimar, impondo ao país um sistema totalitário de poder viabilizado pela edição, em março de 1933, da lei (nazista) de concessão de plenos poderes (ou lei habilitante) que lhe permitiu legislar sem a intervenção do Parlamento germânico!”
O texto conclui afirmando que o que se pretende é a instauração de uma ditadura militar em território nacional. “Intervenção militar, como pretendida por bolsonaristas e outras lideranças autocráticas que desprezam a liberdade e odeiam a democracia, nada mais significa, na novilíngua bolsonarista, senão a instauração, no Brasil, de uma desprezível e abjeta ditadura militar”, completa.
Por meio de nota, o gabinete do ministro afirmou que “a manifestação foi exclusivamente pessoal”.
Celso de Mello é o relator de um inquérito aberto para investigar as declarações do ex-ministro Sergio Moro, que acusa o presidente Jair Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. O chefe do Executivo deve ser ouvido nas próximas semanas pela corporação. Em razão do cargo, Bolsonaro poderá depor por escrito, respondendo uma série de perguntas elaboradas pelos investigadores. As diligências devem durar pelo menos mais de 30 dias e, ao final, serão enviadas à Procuradoria Geral da República (PGR). O chefe do órgão, Augusto Aras, é quem define se apresenta ou não denúncia ao STF. Se isso for feito, o caso é enviado para julgamento na Câmara dos Deputados, que autoriza ou não abertura de ação penal contra o presidente, que pode ser afastado do cargo enquanto o processo estiver correndo.
Celso de Mello foi alvo de críticas do presidente da República, que ficou irritado quando o magistrado encaminhou à PGR um pedido feito por parlamentares para que o celular do presidente seja apreendido para a realização de perícia, e que os dados sejam utilizados pelos investigadores. O ato também gerou a publicação de uma nota pelo general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). No texto, Heleno afirma que o eventual recolhimento do aparelho poderia colocar em risco a “harmonia entre os Poderes” e a própria democracia.