A semana de críticas do presidente Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF) chegou ao ápice, ontem, quando ele usou palavrões para reclamar de integrantes da Corte e foi enfático ao dizer que não vai mais tolerar “a atitude de certas pessoas individuais” e “decisões monocráticas”. Em tom de ameaça, o chefe do Palácio do Planalto cobrou mais “respeito” entre as instituições e, ao mesmo tempo, sinalizou que o Poder Judiciário é o grande vilão do governo federal no momento, sobretudo pelo fato de o Supremo ter fechado o cerco a ele, a ministros e ao grupo ideológico que o promove nas redes sociais.
“Ninguém mais do que eu, cada vez mais, tem demonstrado que tem compromisso com a democracia, com a liberdade. Agora, as coisas têm limite. Ontem (quarta-feira) foi o último dia. Eu peço a Deus que ilumine as poucas pessoas que possam se julgar melhor e mais poderosas do que os outros, que se coloquem no seu devido lugar. Respeitamos os demais Poderes, mas não abrimos mão que nos respeitem também”, esbravejou Bolsonaro, em frente ao Palácio da Alvorada.
“Não podemos falar em democracia sem um Judiciário independente, sem um Legislativo independente, para que possa tomar decisões, não monocraticamente, por vezes. Que tomem, mas de modo que seja ouvido o colegiado. Acabou, p.! Me desculpem o desabafo. Acabou. Não dá para admitir mais a atitude de certas pessoas individuais, tomando de forma quase que pessoal certas ações”, concluiu.
Bolsonaro também reclamou que “não pode um processo começar em cima de um factoide”, em cima de uma fake news”. “Inventaram o nome ‘Gabinete do Ódio’, uns acreditaram e outros foram além e abriram processo no tocante a isso”, disparou. Ele comentou, também, que “ordens absurdas não se cumprem”. “Com todo respeito que eu tenho a todos os integrantes do Legislativo, do Judiciário, do meu próprio Poder, invadir casa de pessoas inocentes submetendo a humilhações perante esposa e filhos é inadmissível”, protestou. “Mais um dia triste na nossa história, mas o povo tenha certeza: foi o último dia triste. Nós queremos a paz, a harmonia, a independência, o respeito e a democracia acima de tudo. A liberdade de expressão é algo sagrado entre vocês (imprensa) e também entre a mídia alternativa.”
Relator do inquérito que apuras as acusações de Moro, o decano do STF, Celso de Mello, foi acusado pelo chefe do Planalto de culpado pela crise política gerada após ele ter permitido a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril. “Ele levantou o sigilo secreto de uma sessão. A responsabilidade do que se tornou público não é de nenhum ministro, é do ministro Celso de Mello. A responsabilidade de tornar público aquilo é de quem suspendeu o sigilo de uma sessão cujo vídeo foi chancelado como secreto”, disparou Bolsonaro.
Inquéritos
Bolsonaro disparou contra os inquéritos que tramitam na Corte para investigar disseminação de fake news e para apurar as acusações do ex-ministro Sergio Moro de que ele tentou interferir politicamente na Polícia Federal.
ABI vê “sinais de desespero”
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) criticou, ontem, a reação do presidente Jair Bolsonaro ao inquérito das fake news em andamento no STF. De acordo com a entidade, o chefe do Executivo está “acuado”. “O presidente dá sinais de desespero”, disse, em nota. “Notório inimigo da democracia, tenta se escudar no sagrado princípio da liberdade de expressão para confundir as coisas e defender aliados. É o caso de se perguntar: estamos diante de uma confusão do presidente, ou de má-fé? Tudo indica que é má-fé mesmo.” A ABI enfatizou que “o uso de fake news é uma prática criminosa que tem que ser investigada e punida.” Na quarta-feira, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgou um manifesto assinado por veículos de comunicação e por entidade contra censura e fake news. O documento pede que o Congresso dê uma resposta legislativa para o combate às notícias falsas. “É fundamental que deputados e senadores tomem a iniciativa de realizar um amplo debate público sobre o melhor caminho a ser adotado para enfrentar a pandemia da mentira e da desinformação”, diz um trecho do manifesto.
“Nunca tive a intenção de controlar a PF, pelo menos isso serviu para mostrar ontem (quarta-feira). Mas, obviamente, ordens absurdas não se cumprem, e nós temos de botar um limite nessas questões”
Jair Bolsonaro, presidente da República, sobre a operação da PF