Entidades judaicas reagiram à comparação que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, fez de ações nazistas, responsável pela mortes de milhões, com a operação contra ofensas ao Supremo Tribunal Federal (STF). "Noite dos Cristais Brasileira", escreveu o ministro em uma rede social.
A noite dos cristais marcou um período de agressões contra os judeus em 1938. "Hoje foi o dia da infâmia, VERGONHA NACIONAL, e será lembrado como a Noite dos Cristais brasileira. Profanaram nossos lares e estão nos sufocando. Sabem o que a grande imprensa oligarca/socialista dirá? SIEG HEIL!", escreveu. A expressão Sieg Heil é uma saudação nazista que significa "salve a vitória" ou "viva a vitória", usada frequentemente com a saudação de Adolf Hitler.
Na manhã desta quarta, Weintraub voltou a comparar a ação com o regime nazista. O ministro publicou nas redes sociais uma foto de militares nazistas apontando armas para um grupo de judeus com uma mensagem comparando a cena ao Brasil atual.
"Primeiro, nos trancaram em casa. Depois, brasileiros honestos buscando trabalho foram algemados. Ontem, 29 famílias tiveram seus lares violados! Sob a mira de armas, pais viram suas crianças e mulheres assustadas terem computadores e celulares apreendidos! Qual o próximo passo?", escreveu.
O texto é uma clara releitura ao texto "E não sobrou ninguém", do pastor luterano Martin Niemoller. "Primeiro, os nazistas vieram buscar os comunistas, mas, como eu não era comunista, eu me calei. Depois, vieram buscar os judeus, mas, como eu não era judeu, eu não protestei. Então, vieram buscar os sindicalistas, mas, como eu não era sindicalista, eu me calei. Então, eles vieram buscar os católicos e, como eu era protestante, eu me calei. Então, quando vieram me buscar... Já não restava ninguém para protestar", diz o texto do alemão.
Ministro não foi alvo da ação
Weintraub não foi alvo da operação realizada nessa quarta-feira (27/5). Mas foi flagrado pedindo a prisão de ministros do STF durante reunião ministerial do dia 22 de abril, cujo conteúdo foi tornado pública por decisão judicial na semana passada.
As ofensas levaram o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, dá cinco dias para o ministro da Educação Abraham Weintraub prestar depoimento no inquérito das ‘fake news’ contra a Corte. Na avaliação de Moraes, a fala de Weintraub apresentou indícios de três delitos: difamação, injúria e crime contra a segurança nacional. O Ministro da Justiça, André Mendonça, entrou com um pedido de habeas corpus para barrar o depoimento.
Na segunda-feira (25/5), o ministro Celso de Mello enviou cópias do vídeo a todos os ministros da Corte para que fossem comunicados do fato e para que possam, ‘querendo’, adotar as medidas que julgarem ‘pertinentes’. Segundo o decano, a fala de Weintraub foi ‘gravíssima aleivosia (calúnia)’ ‘num discurso contumelioso (ofensivo) e aparentemente ofensivo ao patrimônio moral’ dos ministros.
Entidades reagem
A Confederação Israelita do Brasil (Conib) condenou a comparação. “Não há comparação possível entre a Noite dos Cristais, perpetrada pelos nazistas em 1938, e as ações decorrentes de decisão judicial no inquérito do STF, que investiga fake news no Brasil”, diz, em nota.
“A Noite dos Cristais, realizada por forças paramilitares nazistas e seus simpatizantes, resultou na morte de centenas de judeus inocentes, na destruição de mais de 250 sinagogas, na depredação de milhares de estabelecimentos comerciais judaicos e no encarceramento e deportação a campos de concentração”, continua.
Por último, a Conib ressalta que, ao contrário da época do nazismo, os alvos têm direito à defesa. “A comparação feita pelo ministro Abraham Weintraub é, portanto, totalmente descabida e inoportuna, minimizando de forma inaceitável aqueles terríveis acontecimentos, início da marcha nazista que culminou na morte de 6 milhões de judeus, além de outras minorias”, conclui.
O grupo Judeus pela Democracia publicou mensagem criticando a comparação. “A ação a mando do STF visa buscar quem financia Fake News e evitar novos linchamentos virtuais. A Noite dos Cristais não foi virtual, mas foi o linchamento real a judeus. O objetivo de hoje foi tentar evitar que novas “noites dos cristais” aconteçam com outros povos e pessoas”, afirma.
A mensagem do ministro foi contestada pelo Comitê Judaico Americano, uma das principais organizações da comunidade judaica nos Estados Unidos, que pediu um basta no uso político do Holocausto por autoridades do governo Jair Bolsonaro.
"Chega! O reiterado uso político de termos referentes ao Holocausto por oficiais do governo brasileiro é profundamente ofensivo para a comunidade judaica e insulta as vítimas e os sobreviventes do terror nazista. Isso precisa parar imediatamente", disse a associação pelo Twitter, em inglês, na quarta-feira.
Com informações da Agência Estado