A manifestação do procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, sobre a divulgação de trechos do vídeo da reunião do dia 22 de abril entre o presidente Jair Bolsonaro com ministros, não foi bem vista entre procuradores. Aras se manifestou contra a divulgação integral e avaliou que deveria ser levantado o sigilo apenas sobre as falas do presidente que tenham relação com o que está sendo investigado no inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF). A investigação é relativa às acusações do ex-ministro Sergio Moro de que o presidente tentou interferir politicamente na Polícia Federal.
O requerimento do PGR foi ainda mais restritivo que o da própria Advocacia-Geral da União (AGU), que se manifestou pela divulgação de todas as falas do presidente, exceto a referência a "eventuais e supostos comportamento de nações amigas" e "as manifestações dos demais participantes da reunião". Em documento, Aras pontuou que a divulgação poderia criar uma polarização entre os poderes a serem usadas “ de forma oportunista, como palanque eleitoral precoce das eleições de 2022".
Algumas das falas do presidente relativas ao inquérito, no entanto, já foram até divulgadas pela própria AGU na semana passada. Nelas, ele citou Polícia Federal e falou que “já tentou trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não conseguiu”. “Isso acabou. Eu não vou esperar f. minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura”, afirmou. A defesa de Moro, na ocasião, avaliou que a transcrição omitia trechos importantes.
Dois procuradores consultados pelo Correio pontuaram que essa postura de Aras em relação ao vídeo incomoda servidores do Ministério Público Federal (MPF). Um deles disse que a ação foi no mínimo “estranha”, e “mostra uma tendência do procurador” que poderia estar sendo “instrumento político para evitar maiores constrangimentos do presidente”. “Ele defendeu o presidente mais do que a AGU. E não é papel do Ministério Público isso”, disse.
Há crítica também quando se fala no pedido da PGR de abertura de inquérito contra o presidente. Além de pedir a investigação sobre as acusações feitas por Moro contra o presidente, Aras já solicitou que Moro fosse investigado denunciação caluniosa e crimes contra a honra.
Conforme os procuradores, denunciação caluniosa, por exemplo, caberia após avaliadas as denúncias feitas pelo ex-ministro e, se ao final, fosse observado que ele mentiu de forma deliberada. A avaliação dos servidores é que com esta ação, Aras tentou se equilibrar politicamente junto ao Planalto.
Aras foi escolhido pelo presidente e não estava na lista tríplice formada. Na época, houve protesto e críticas por parte de procuradores.
Pressão
Os servidores consultados pelo Correio avaliam que houve uma pressão sobre Aras para que fosse aberto o inquérito que investiga as ações antidemocráticas no STF - ainda assim, um deles pontua que o procurador-geral não envolveu especificamente o presidente no pedido de investigação. Essa pressão citada foi, inclusive, pública.
Já em relação ao inquérito envolvendo as acusações de Moro, a avaliação é que o PGR agiu de forma rápida. Um subprocurador pontua que os fatos se impõem, e não havia como ignorá-los - assim como não havia possibilidade de ignorar a entrevista do empresário Paulo Marinho à Folha de S. Paulo, na qual ele afirma que Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) foi informado por um delegado da PF sobre a operação que chegou a Fabrício Queiroz.
A PGR, inclusive, já pediu para que a PF ouça Marinho no inquérito relativo a supostas interferências políticas de Bolsonaro na PF.
Saiba Mais
Por enquanto, na avaliação deles, está cedo para dizer sobre quais serão os comportamentos de Aras. Todos pontuam que os fatos são fortes, difíceis de serem ignorados, e o procurador possui ainda uma equipe responsável, séria e técnica que o assessora.