As decisões envolvendo o governo estão dividindo o Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto alguns ministros avaliam que o Executivo tem ultrapassado limites e é preciso levantar barreiras legais, outros acreditam que o Judiciário deve se conter para evitar uma crise entre os Poderes. Na Corte, o presidente, Dias Toffoli, e Marco Aurélio Mello têm atuado para evitar atrito. Já Celso de Mello adota rigor ao tratar ações relacionadas ao governo. A postura dele é acompanhada por Alexandre de Moraes, que foi alvo de ataques do presidente Jair Bolsonaro.
Nos bastidores, Toffoli tem conversado com Moraes sobre ações que interferem na atuação do Executivo. O magistrado é relator do processo que investiga manifestações pró-ditadura, em diversas cidades, que pediram o fechamento do Supremo e do Congresso. Na mira, estão aliados do governo, entre agentes de mobilização social que atuam pela internet e grupos organizados, como políticos que integram a base do Executivo no Congresso. O próprio comandante do Planalto pode entrar na mira, pois tem participado de atos em Brasília que adotaram pautas controversas. Apesar dele não estar no foco do inquérito, existe um pedido para que seja incluído.
Enquanto o governo sofre forte revés em algumas ações, ganha campo em outras. Na terça-feira, Toffoli derrubou uma decisão da 5ª Vara Federal do Rio Grande do Norte que obrigava o Ministério da Defesa a retirar do ar uma nota que defendeu o golpe militar de 1964. Para o ministro, a decisão da primeira instância resultava em “ato de censura à livre expressão” do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva. No texto, publicado pelo ministério, o ato de 31 de março de 1964, quando os militares tomaram o poder, foi “um marco para a democracia”.
Toffoli entendeu que não cabe ao Judiciário interferir na publicação de uma “simples ordem do dia”. Ele destacou ainda que o processo é fruto da excessiva judicialização do sistema jurídico brasileiro. Nos últimos dias, o ministro demonstrou, nos bastidores, irritação com as derrotas impostas ao governo na Corte. O ápice foi quando o Moraes suspendeu a nomeação do delegado Alexandre Ramagem para a direção-geral da Polícia Federal, contrariando o Executivo. Ao ser atacado, recebeu o apoio da maioria dos colegas do tribunal, como Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Edson Fachin.
Celso de Mello, relator de inquérito aberto na Corte para avaliar a suposta interferência de Bolsonaro na Polícia Federal, tem sido o mais crítico ao governo em suas decisões. No curso das diligências, está fazendo tudo que o Executivo não queria. Está encurtando prazos, como o do depoimento de Moro, o qual determinou que fosse colhido dentro de cinco dias. Agora, deu 20 dias para a oitiva de ministros e outras autoridades no processo.
Já Marco Aurélio pretende colocar no regimento da Corte o impedimento de que decisões monocráticas de ministros sejam utilizadas para decidir sobre casos que dizem respeito à competência de outros poderes, colocando fim ao temor de derrotas relâmpago do governo na Corte. (Colaborou Jorge Vasconcellos)
Recado do ministro
Dias Toffoli repudiou, em nome da Corte, as agressões sofridas por profissionais da imprensa no último domingo, durante manifestação que contou com a presença do presidente Jair Bolsonaro. O ato antidemocrático defendeu uma intervenção militar e o fechamento do Congresso e do próprio STF. Toffoli observou que as decisões do tribunal devem ser contestadas com recursos judiciais, “jamais por meio de agressões ou de ameaças a esta instituição centenária ou a qualquer de seus ministros”. Ao falar da violência contra os profissionais de imprensa, ele defendeu que a conduta dos agressores seja apurada pelas autoridades. “Sem imprensa livre, não há democracia”, pregou.