Politica

Bolsonaro: 'Já estou no poder. Então, estou conspirando contra quem?'

Presidente nega intenção antidemocrática após participar de ato em defesa da intervenção militar e sofrer críticas

Um dia após comparecer a uma manifestação que defendia a internvenção militar e criticava o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional, o presidente Jair Bolsonaro negou que tenha qualquer intenção antidemocrática e disse apenas expressar sua opinião ao tecer críticas à atuação de outros poderes. 

"O pessoal geralmente conspira para chegar ao Poder. Eu já estou no Poder. Já sou o presidente da República. Então, estou conspirando contra quem, meu Deus do céu? Falta um pouco de inteligência daqueles me acusam de ser ditatorial", argumentou. 

"O que eu tomei de providência contra a imprensa, contra a liberdade de expressão? Eu, inclusive, sou contra as prisões administrativas que estão ocorrendo no Brasil. Prenderam uma mulher de biquíni na praia no Recreio (Rio de Janeiro), prenderam na praia de Boa Viagem (Recife) um aposentado da Aeronáutica. Eu sou, realmente, a Constituição", acrescentou.

Bolsonaro disse respeitar os demais Poderes, mas argumentou que também possui opinião. "Não vou pecar por omissão. Respeito o STF, o Congresso, mas eu tenho opinião. Não pode qualquer palavra minha ser interpretada por alguns como agressão, como ofensa", disse. Na mesma ocasião, o presidente discordou de um apoiador que pediu o fechamento do Supremo e do Congresso.

"Em seguida, Bolsonaro ainda emendou: "E mais. Tenho conduzido o Brasil orientado e fiel aos interesses do povo brasileiro. Nada que eu faço que não esteja de acordo com eles. É isso que acontece comigo. Onde é que eu estou errando? O meu time não trabalha de madrugada, meu time trabalha a luz do dia. Todas a pessoas escolhidas com critério. Alguns, que por ventura desviam dos critérios, a caneta vai funcionar. É para isso que sou presidente,, para decidir. Se tiver que demitir qualquer ministro, demito. Não estou ameaçando, longe de ameaça, não tem ameaça de minha parte. Agora se ele desviar-se daquilo que eu prometo na pré-campanha  e na campanha lamentavelmente está no governo errado, vá para outro barco, vá tentar em 2022”, disse referindo-se ao ex-ministro da Saúde, Luis Henrique Mandetta, demitido na semana passada.



Ato pró-intervenção militar

No domingo, Bolsonaro compareceu a uma manifestação que pedia a intervenção militar e criticava o STF e o Congresso. Em apoio às milhares de pessoas que se aglomeraram em frente ao Quartel Geral do Exército, ele subiu em uma caminhonete para agradecer. "Eu estou aqui porque acredito em vocês. Vocês estão porque acreditam no Brasil", disse. Bolsonaro disse ainda: "Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil". "Chega da velha política. Agora é Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”, gritou em meio aos apoiadores.

Hoje, questionado sobre qual era a pauta da manifestação, Bolsonaro disse ser um “ato de apoio ao Exército”. 

“O povo na rua, dia do Exército, volta ao trabalho. É isso”. Perguntado então sobre qual mensagem daria aos apoiadores que clamam pela volta do AI-5, Bolsonaro rebateu: “Não quero papo com vocês. Quem não quiser ouvir, vá embora. Todo e qualquer movimento tem infiltrado, tem gente que tem a sua liberdade de expressão. Respeite a liberdade de expressão. Pegue o meu discurso, deve dar dois minutos. Não falei nada contra qualquer outro Poder. Muito pelo contrário. O povo quer voltar ao trabalho. O povo quer isso. Estavam lá saudando o Exército brasileiro. É isso. Mais nada. Fora isso, é invencionice, é tentativa de incendiar uma nação que ainda está dentro da normalidade. No que depender do presidente Bolsonaro, democracia e liberdade acima de tudo”, concluiu.
 

Onda de críticas 

Após participar da manifestação pró-intervenção militar, Bolsonaro recebeu uma verdadeira onda de críticas. O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que é "assustador" ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. 

 

"Só pode desejar intervenção militar quem perdeu a fé no futuro e sonha com um passado que nunca houve. Ditaduras vêm com violência contra os adversários, censura e intolerância. Pessoas de bem e que amam o Brasil não desejam isso", escreveu Barroso.

 

Outro ministro do STF, Gilmar Mendes também comentou o assunto pelas redes sociais: "A crise do coronavírus só vai ser superada com responsabilidade política, união de todos e solidariedade. Invocar o AI-5 e a volta da Ditadura é rasgar o compromisso com a Constituição e com a ordem democrática".

 

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, também se manifestou. Por meio de uma rede social, o deputado disse ser uma “crueldade imperdoável” pregar uma ruptura democrática em meio às mortes da pandemia da covid-19.

 

“O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo. É mais trabalhoso, mas venceremos”, escreveu Maia. “Em nome da Câmara dos Deputados, repudio todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição.

 

O senador Álvaro Dias (PR), líder do Podemos no Senado, criticou em entrevista as manifestações deste domingo contra o Congresso. "Fica difícil aceitar essa transferência de responsabilidade para o Congresso do fracasso do governo federal", diz.

 

Saiba Mais

Ele ainda classificou como grave a presença do presidente da República nessas manifestações. "A atitude de Bolsonaro hoje (com manifestantes) foi grave. É um estímulo à desobediência". Para ele, o presidente age como se estivesse em um "parque de diversões".

 

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que vem travando debates com Bolsonaro desde que determinou medidas de isolamento social para combater o coronavírus, assim como a maior parte dos governadores, chamou de "lamentável" a atuação do presidente neste domingo. "Lamentável que o presidente da República apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o AI-5. Repudio também os ataques ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal. O Brasil precisa vencer a pandemia e deve preservar sua democracia."