Contrário à proposta de auxílio emergencial a estados e municípios, aprovada na segunda-feira pela Câmara, o Ministério da Economia tenta negociar outras condições para o repasse de verbas a governos locais durante a pandemia de coronavírus. O Executivo defende um texto alternativo, que garanta transferência fixa, menor e, a princípio, por menos tempo do que a definida pelos deputados. A ideia da equipe de Paulo Guedes é convencer o Senado a rever as regras, antes de votá-las, ou resolver o impasse por meio de uma medida provisória.
O objetivo do auxílio é compensar as perdas com a queda de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é estadual, e do Imposto Sobre Serviços (ISS), municipal, nos próximos meses. A estimativa de técnicos do Legislativo é que caia entre 30% e 40%, devido à crise. Caso a primeira projeção se confirme, a União deve ter de desembolsar R$ 89,6 bilhões para repor os valores nos seis meses previstos de duração da medida.
Mas, na prática, a cifra pode ser maior ou menor, já que os repasses vão variar de acordo com o resultado de cada mês. Se em abril, por exemplo, um estado recolher R$ 1 bilhão a menos do que no mesmo período do ano passado, a União vai transferir essa quantia. O cálculo será feito mensalmente, de abril até setembro. O fato de não ser possível definir o gasto exato é a principal crítica da equipe econômica, que propõe um valor fixo, de R$ 40 bilhões, e apenas pelos três meses previstos de pandemia.
O secretário especial da Fazenda do ministério, Waldery Rodrigues, considera que a ajuda aos estados e municípios poderia sair até mais cara do que o pagamento de R$ 600 aos trabalhadores informais, que custará R$ 98 bilhões em três meses. A equipe econômica também reclama do prazo de seis meses de duração, proposto pela Câmara. Todos os outros programas de enfrentamento à Covid-19 devem durar 90 dias, lembrou o assessor especial de Relações Institucionais, Esteves Colnago. “No caso dos informais, que têm uma fragilidade evidente, temos três meses”, comparou.
Além disso, o governo diz que os recursos aprovados pela Câmara poderiam ser mais bem distribuídos para chegarem com mais eficiência às pessoas que precisam. A equipe econômica alega que a divisão pelos critérios do ICMS e do ISS privilegiaria os estados e municípios de maior atividade econômica, que são, naturalmente, os mais ricos. Por isso, propõe que os recursos sejam distribuídos por meio de critérios per capita — pelo número de habitantes — ou de acordo com a demanda das secretarias de saúde.
Impasse
A ideia agora é discutir o novo texto com o Senado, que pode mudar a proposta já aprovada pelos deputados. “Se o ajuste puder ser feito pelo Legislativo, melhor”, considera Colnago. “Tem alguns caminhos. Os R$ 40 bilhões de transferência direta podem ser encaixados em uma medida provisória. Sendo enviada uma MP, os outros projetos caminharão por um projeto de lei complementar”, explicou Waldery.
A diferença é que MPs entram em vigor no momento da publicação. O valor poderia ser complementado depois, por outra medida similar.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), continua defendendo o projeto dos deputados. Segundo ele, os R$ 40 bilhões oferecidos pelo governo seriam, na verdade, R$ 22 bilhões. É a segunda vez que ele acusa o Ministério da Economia de usar números manipulados. “É importante que o governo faça uma proposta, mas continua com dados distorcidos para criticar a da Câmara”, disse.
Segundo Maia, o Executivo incluiu nos cálculos ajudas que já tinham sido liberadas. A quantia, alertou, é insuficiente. “A ajuda do governo é de R$ 22 bilhões. Isso não resolve três meses dos estados. Muito menos de municípios”, calculou.
Waldery disse, ontem, que a proposta do governo é liberar R$ 77,4 bilhões para os estados e municípios, fora os R$ 49,9 milhões que já foram anunciados para os entes federativos. No total, seriam liberados, portanto, R$ 127,3 bilhões para os entes federativos nos próximos meses. Dos R$ 77,4 bilhões propostos ontem, porém, só R$ 40 bilhões correspondem a transferências diretas (veja quadro). O restante seria liberado por meio da renegociação da dívida dos estados e municípios com a União e com os bancos públicos.
Alcolumbre na bronca
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), informou que não vai colocar em votação o projeto de socorro financeiro a estados e municípios. A decisão dele é uma resposta à reclamação do senador Jorginho Melo (PL-SC) de que o projeto que cria o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) está parado na Câmara. “Vai ser agora o princípio da reciprocidade”, frisou Alcolumbre.