As últimas atitudes do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, elevaram a temperatura do confronto com o presidente Jair Bolsonaro e podem acelerar a saída dele da equipe, vista até por seus aliados como uma questão de tempo. O estopim da nova crise foi a entrevista dada pelo ministro ao programa Fantástico, da Rede Globo, na noite de domingo. O tom adotado por Mandetta foi considerado por militares do governo, e até mesmo por secretários estaduais da Saúde, como uma “provocação” ao chefe do Executivo.
Na ocasião, Mandetta afirmou que o governo carece de um discurso unificado sobre o enfrentamento à pandemia e dirigiu cobranças a Bolsonaro, que tem ignorado recomendações de isolamento social e defendido o retorno ao trabalho. Nos bastidores, não apenas a ala ideológica do governo como até alguns apoiadores do titular da Saúde já acreditam que, com essa estratégia, ele força uma situação para sair do governo.
“O brasileiro não sabe se escuta o ministro da Saúde, o presidente, quem é que ele escuta”, disse Mandetta ao Fantástico, um dia depois de Bolsonaro ter visitado, ao seu lado, um hospital de campanha, em construção, na cidade de Águas Lindas (GO). Naquele sábado, como de outras vezes, o presidente foi ao encontro de eleitores, que se aglomeraram para cumprimentá-lo.
Questionado, ontem, sobre a cobrança de Mandetta, Bolsonaro desconversou. “Não assisto à Globo. Vou perder tempo da minha vida assistindo à Globo agora?” .
No Planalto, não foi apenas a referência de Mandetta à “dubiedade” do governo que causou contrariedade. O fato de o ministro ter dado entrevista para a emissora vista como inimiga também foi tido como afronta.
Ao contrário do que estava previsto, Mandetta não participou da entrevista coletiva de ontem ao lado dos ministros Sérgio Moro (Justiça) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), no Planalto, sobre as medidas contra o vírus. A explicação oficial foi de que ele estava em outro compromisso.
Na avaliação de militares ouvidos pela reportagem, Mandetta tenta montar uma espécie de “ministério técnico autônomo” para se dissociar das ações de Bolsonaro e ganhar os holofotes. Há nas Forças Armadas a percepção de que o ministro desrespeita não apenas a hierarquia como acordos firmados. Mandetta tem confrontado o presidente, quando havia combinado com os militares que agiria para acalmar os ânimos.
Interlocutores de Bolsonaro também afirmam que áreas técnicas do governo já detectaram falhas na execução de medidas por parte do MS, como a distribuição de equipamentos que não estavam em perfeito estado. Respiradores enviados ao Amazonas, Amapá e Ceará, por exemplo, teriam sido entregues com defeito . O secretário executivo da pasta, João Gabbardo, admitiu o problema, mas afirmou que soluções já estão sendo dadas para amenizar as dificuldades.
Na outra ponta, embora secretários estaduais da Saúde estejam se manifestando a favor de Mandetta, há insatisfação com critérios para repasses de recursos e pedidos para que o governo também leve em conta municípios com pequena população, mas grande número de atendimento de pessoas da região procurando os hospitais.