Politica

Conspiração contra Mandetta

Onyx Lorenzoni e Osmar Terra são flagrados discutindo a saída do titular da Saúde, alvo de seguidos ataques do presidente Jair Bolsonaro. Ministro diz que teria %u201Ccortado a cabeça%u201D do colega de governo, e deputado se prontifica a ajudar a derrubá-lo



No dia em que o número de mortos pelo coronavírus no Brasil chegou a 941, o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, e o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) foram flagrados conspirando contra o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Na conversa, divulgada pela CNN Brasil, Lorenzoni acusa o colega de governo de não ter compromisso com Bolsonaro e ressaltou que se tivesse na cadeira do presidente teria “cortado a cabeça” do titular da Saúde. Já Terra, que ambiciona a pasta da Saúde, se dispõe a ajudar a derrubar Mandetta.

No diálogo, Lorenzoni comentou com Terra: “Ele (Mandetta) não tem compromisso com nada que o Bolsonaro está fazendo”. O deputado respondeu: “Ele se acha”. O ministro da Cidadania continuou: “Eu acho que (Bolsonaro) deveria ter arcado (com as consequências de uma demissão)”. Terra comentou: “O ideal era o Mandetta se adaptar ao discurso do Bolsonaro”. 

O ministro da Saúde insiste com a população para que mantenha o isolamento social e prega cautela no uso da cloroquina contra a Covid-19. Ambas as orientações contrariam o chefe do Executivo, que tem fritado o ministro. 

Em mais uma prova que ignora as recomendações do seu próprio ministro, Bolsonaro decidiu, mais uma vez, passear por Brasília. Ele foi ontem a uma padaria na Quadra 212 da Asa Norte. De acordo com uma funcionária do local, o chefe do Executivo tomou refrigerante, comeu um pão do tipo sonho, tirou fotos com apoiadores e conversou com clientes e funcionários. Durante a visita, algumas pessoas bateram panelas pelas janelas dos prédios e criticaram a presença do chefe de Estado no local. Ele chegou a ser hostilizado no momento em que entrava no carro oficial para seguir ao Alvorada.

Terra faz coro com o presidente em relação aos dois assuntos, mesmo sendo médico e sabendo que não há estudo confiável sobre a eficácia do medicamento — usado contra malária, lúpus e artrite — e seus efeitos colaterais.

Lorenzoni disse a Terra na conversa: “Uma coisa como o discurso da quarentena permite tudo. Se eu estivesse na cadeira (de Bolsonaro)... O que aconteceu na reunião, eu não teria segurado, eu teria cortado a cabeça dele…”, garantiu. “Você viu a fala dele depois?”, questionou Terra. “Ali, para mim, foi a pá de cal. Eu já não falo com ele (Mandetta) há dois meses. Aí, acho que é xadrez. Se ele sai, vai acabar indo para a secretaria do Doria”, emendou o ministro da Cidadania, numa referência ao governador de São Paulo, João Doria, entusiasta do trabalho de Mandetta. Terra se prontificou a ajudar a tirar o titular da Saúde. “E não precisa ser eu o ministro, tem mais gente que pode ser.”

Além de ser colega de Mandetta no governo, Lorenzoni é do mesmo partido dele, o DEM. O líder da legenda na Câmara, Efraim Filho (PB), afirmou que era consenso a mobilização para dar respaldo a Mandetta. “É um episódio que impacta a bancada do Democratas. Gera um ruído péssimo, já que todos tínhamos nos mobilizado para dar suporte ao Mandetta na crise da pandemia. E assim continuaremos”, frisou.

Em sua live semanal, Bolsonaro fugiu do assunto. “Quem está esperando aí eu falar do Mandetta, do Osmar Terra e do Onyx, pode passar para outra live”, disse. Ele, no entanto, não perdeu a oportunidade de voltar a atacar o ministro da Saúde. “Médico não abandona paciente, mas o paciente troca de médico”, disparou. Mandetta usou mais de uma vez a frase de que médico não abandona paciente para justificar não pedir demissão mesmo sofrendo estocadas do chefe. Procurado, o Ministério da Cidadania não respondeu ao Correio. Osmar Terra também não atendeu às ligações da reportagem.


Encontro
Na segunda-feira, Mandetta se reuniu com Bolsonaro no Planalto, e os rumores eram de que ele seria exonerado
naquele dia. Após o encontro, o titular da Saúde disse, já no ministério, que continuaria à frente da pasta.


Cloroquina
Bolsonaro usou a frase ao mencionar que se o médico não quiser prescrever cloroquina, ainda alvo de estudos, o paciente pode mudar de especialista. “Você tem todo o direito de trocar de médico”, disse. O presidente ainda informou que já entrou em contato com um dos fabricantes no Brasil e que o país tem capacidade de produzir o remédio em grande escala.