Em coletiva de imprensa no início da noite desta quarta-feira (25/3), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou o pronunciamento de Jair Bolsonaro e cobrou que o presidente lidere o combate à crise provocada pela pandemia do coronavírus e que envie projetos de lei para que o Congresso possa aprová-los. Afirmou ainda que há uma pressão por parte de alguns investidores contra o isolamento, mas que não é razoável arriscar a vida dos brasileiros, e que esse tipo de articulação não está acontecendo em nenhum outro país.
"Na minha opinião, nas últimas semanas, tivemos uma pressão muito grande de investidores que colocaram recursos na bolsa de valores esperando prosperidade. A bolsa caiu, como caiu no mundo todo, pois é uma crise mundial. Não é só do Brasil. E um jornal do campo econômico começou a falar sobre a necessidade de não ter isolamento. Mas a gente não pode ouvir os investidores que estão perdendo dinheiro por risco. Risco é assim, você ganha e você perde. Mas a gente não pode colocar a vida de brasileiros em risco por uma pressão de parte de brasileiros que investiram e estão perdendo dinheiro", afirmou.
"Quem foi para o risco, foi para o risco. O que a gente precisa é continuar seguindo orientação do Ministério da Saúde. E precisamos de previsibilidade. O que está faltando para todos é previsibilidade. Se o governo tivesse resolvido uma política de isolamento de idosos de comunidades do Rio de Janeiro e São Paulo, renda e emprego de quem recebe até o teto do INSS, teríamos previsibilidade para a maioria dos brasileiros, e todos estaríamos fazendo o isolamento e esperando os impactos da chegada do vírus. E a cada semana, avaliando o que deve ser feito. Esperando o que será feito", continuou Maia. "É uma pressão equivocada. Se a gente tiver previsibilidade de 60 dias, o governo poderá avaliar se é hora de terminar ou de manter o isolamento. A vida e o emprego dos brasileiros não podem virar estatística nas mãos de outras pessoas com interesses legítimos, mas de risco”, completou.
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Maia disse não ver motivos de um impeachment do presidente. "Não há motivo para impeachment. Vamos resolver o problema dos brasileiros apesar de, muitas vezes, o governo dar sinalizações erradas, no meu ponto de vista, com todo respeito ao governo."
Falta de coerência
Nesse momento, Maia cobrou que Bolsonaro apresentasse projetos que estivessem de acordo com o que ele vem afirmando. "Como alguém pode falar em isolamento vertical se, até hoje, não apresentou uma proposta de contingenciamento para idosos brasileiros mais pobres? Como um governo pode falar de um assunto, sabendo que temos milhares de idosos nas comunidades do RJ, e que São Paulo tem 7 milhões de pessoas acima de 60, muitas delas de baixa renda, e até hoje, a gente não ouviu do governo qual a política para isolar esses idosos?", questionou.
"Já que você quer uma política vertical, se é pra ser vertical, não pode tirar de uma comunidade de crianças, jovens adultos e idosos, tirar uma parte para trabalhar, e voltar à noite para uma casa de 30, 40 metros quadrados. Porque você vai contaminar os idosos. O vírus contamina rápido. Estamos esperando, cobrando do governo. Já falei com o ministro Onyx, tem até uma proposta que veio do meu partido Democratas, de criar um protocolo para isolar idosos. A partir do momento que o governo tiver uma política séria, responsável, olhando com com mais cuidado esses idosos que vivem nas comunidades e construir uma solução de isolamento distante dos que vão sair da comunidade para trabalhar, sair para a escola e voltar, em alguma semanas você teria solução para liberar as pessoas para trabalhar”, criticou.
Normalidade democrática
Questionado sobre a fala de Bolsonaro a respeito de um possível "fim da normalidade democrática" decorrente de convulsões provocadas pela crise do cornavírus, Maia descartou a possibilidade. "O Brasil tem instituições fortes, que tem funcionado, garantindo equilíbrio entre poderes. Temos que estar preocupados com vidas, empregos e condições para que os mais simples possam ter, por parte do Estado, o apoio para, cumprindo o isolamento, passar pelas próximas semanas. É o mais importante. Frase de efeito não vão resolver o nosso problema. O mais importante é que possamos construir as soluções que passam pela liderança do Poder Executivo, que tem falhado, mas as equipes técnicas têm avançado. E que a gente possa construir essas soluções", lembrou.
"Temos que garantir a estrutura de estados, municípios e União para a saúde pública. Garantir os leitos de UTI, o que já se provou que um número maior garante uma maior chance de recuperação dos que contraíram o vírus. Tem a questão do emprego. Há compromisso da área técnica de apresentar, entre hoje e amanhã, uma solução para a suspensão do contrato de trabalho vinculado a liberação de recursos do seguro desemprego. Eu disse ao governo que era fundamental uma solução rápida. A demora está gerando insegurança. E devemos votar hoje o recurso para os mais vulneráveis, os informais, aquele recurso que já estamos trabalhando para ter um valor melhor que os R$ 200 propostos pelo governo, que é um valor pequeno para os brasileiros com mais necessidade possa superar esses próximos três meses. Mas não fechamos um valor. Depende de líderes e do relator", ressaltou.
Calamidade pública
Questionado sobre se os governadores estariam desconsiderando as medidas do governo federal ao parar comércios e orientar a população a se isolar, o presidente da Câmara destacou que os chefes de executivos estaduais e o Congresso estão segundo as recomendações que Jair Bolsonaro deixou expressas no decreto de calamidade pública, votado por deputados e senadores na semana passada.
Ninguém desconsiderou as recomendações do governo, que enviou mensagem para o Congresso para que decretasse estado de calamidade pública. A Câmara votou no mesmo dia. O senado votou na sexta. Aprovamos de forma célere. Estamos seguindo as recomendações do presidente através da mensagem. Espero que ele não tenha decretado calamidade pública por nada. Somado às recomendações do ministro Mandetta desde fevereiro, quando os brasileiros que estavam na China voltaram ao Brasil sob o comando das Forças Armadas. E os governadores vem seguindo a orientação do decretação de estado de calamidade do próprio presidente e Ministério da Saúde, que tem sido claro sobre a necessidade de isolamento”, argumentou.
Orçamento de guerra
Sobre a separação do orçamento anual do orçamento da crise do coronavírus, Maia pretende debater o texto da proposta de emenda à Constituição (PEC) até o início da próxima semana. “Hoje, consigo terminar de fechar um texto. Estou ouvindo políticos, TCU, equipe econômica. Tem bastante apoio. Para que venha com força. Conversei com o líder (da minoria) José Guimarães (PT-CE), que acha o debate importante. Os deputados querem conhecer o texto para ter opinião”, disse.
“Estou confiante que segunda tenhamos o texto para início de debate e, na próxima semana, nesse ambiente de bom diálogo entre os partidos, a gente possa tentar avançar e dar as condições para que o governo federal, de forma definitiva, possa entender que a segregação do orçamento nos obriga a construir soluções de gastos públicos para enfrentamento da crise em todas as áreas”, afirmou.