Por mais que relute, o provável adiamento das eleições é um tema que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) terá que enfrentar. Ao Correio, o ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marco Aurélio Mello, opinou sobre o tema, e afirmou que “o prognóstico é péssimo”. Destacou que o Brasil não chegou ao pico da crise provocada pelo coronavírus e que não há clima para as eleições. No Congresso, dois deputados também já pediram adiamento. O líder do Podemos, Léo Moraes (RO) e o parlamentar gaúcho Bibo Nunes (PSL). Em seu último posicionamento, Maia afirmou que trata-se de uma “discussão equivocada”.
“Hoje, o prognóstico é péssimo. Ainda teremos o pico da crise. Temos que esperar. Hoje, não teríamos condições de realizar (as eleições). Nós temos que ter uma visão prognóstica. Não podemos chegar em cima da hora para deliberar. Como está hoje, não temos clima para realizar eleições. Eu adiaria”, afirmou o ministro. O vice-presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, que assumirá a presidência do tribunal este ano e estará a frente do órgão durante as eleições, tem posição similar à do presidente da Câmara. O magistrado afirmou, ontem, que tem “a firme expectativa de que até lá a situação do novo coronavírus estará sob controle”.
A afirmação foi feita ao Estadão no domingo. Barroso afirmou, ainda, que trabalha “com fatos, e não com especulações”. Na Câmra, o líder do Podemos protocolou no TSE um pedido de adiamento para o primeiro domingo de dezembro. “Levando em consideração esse cenário dramático, solicitamos ao Tribunal Superior Eleitoral a revisão do calendário das eleições para Prefeito, Vice-Prefeito e Vereador. Especificamente, propomos que o primeiro turno aconteça no primeiro domingo de dezembro e que, nos municípios onde houver, o segundo turno ocorra no terceiro domingo do mesmo mês. Ademais, consideramos conveniente o adiamento de outros atos relevantes que integram o processo eleitoral campanha, convenções partidárias, doações eleitorais, prestação de contas etc”, afirma o texto do documento.
Bibo Nunes, por sua vez, fará a proposta na primeira sessão remota da Câmara. Ele também quer que os R$ 2 bilhões destinados do fundo eleitoral sejam direcionados ao combate ao vírus. O tema ganhou destaque após o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, defender o adiamento do pleito. Em resposta, Maia afirmou que, nos próximos meses, o foco do Congresso, Executivo e STF deve ser o enfrentamento da crise “de forma unida”.
Reajuste do calendário
Professor de ciências políticas da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Ricardo Ismael afirma que a Câmara pode adiar o debate até maio, mas que não poderá evitar o debate. Até porque o isolamento de candidatos e eleitores impede diversas etapas do processo. “As eleições acontecem em outubro, e o calendário eleitoral diz que as convenções tem que acontecer até junho, formalização de candidaturas e aplicação da ficha limpa, em julho, campanha de rua e, em agosto, campanha eleitoral gratuita. É mais ou menos esse o tempo que percorremos dentro da dinâmica. A variável que não está na mesa é quanto tempo vai demorar com todo mundo em casa, suspendendo qualquer tipo de aglomeração”, calcula.
Para o cientista político, as restrições inviabilizam esse processo. “É difícil pensar em convenção partidária virtual. Tem articulações, disputas, e estamos entrando nesse período de articulação. Essa eleição tem uma novidade que não pode haver coligação na proporcional, mas vai ter para prefeito. Esse período já era para estar acontecendo isso. É claro que as pessoas podem falar por computador, mas prejudica. Imagina se isso ultrapassa o período de junho? Não vai ter campanha de rua. E temos uma quantidade de eleitores que não tem nem internet. Então, a eleição está muito prejudicada. Essa questão vai ter que ser discutida.”
“Um cenário que está certo é que o calendário eleitoral terá que ser reajustado. Foi construído sem prever um cenário como esse. Então terá que, por exemplo, diminuir o tempo de campanha, de televisão. Agora, o adiamento das eleições, podemos aguardar um pouco. Concordo com as falas de Maia e Barroso. Os dois pediram calma. Podemos aguardar mais um pouco para ver quanto vai durar o isolamento por conta do coronavírus. Se isso demorar muito, essa discussão vai acontecer. A questão é que não se pode imaginar uma campanha eleitoral com eleitores e candidatos em casa, sem poder sair”, pondera o especialista.