Politica

Relação perigosa com o Congresso

Declaração do ministro Augusto Heleno de que parlamento chantageia governo acirra o clima hostil entre o Executivo e as duas Casas legislativas



A relação entre o governo e o Congresso, que nunca foi das melhores, só se deteriora. Além de o Executivo não buscar a formação de uma base sólida no parlamento, ainda faz disparos contra as duas Casas, o que pode implicar prejuízos na aprovação de pautas de interesse do próprio governo. Desta vez, o pivô da crise é o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, que acusou o Congresso de  chantagear o Executivo.

A crítica de Heleno é ao acordo feito entre parlamentares e o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, sobre o controle da execução de emendas parlamentares ao Orçamento. “Nós não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. F.”, disse Heleno a Ramos e ao ministro da Economia, Paulo Guedes. O áudio foi captado durante o hasteamento da bandeira, ocorrida na manhã de terça-feira, no Palácio da Alvorada. Após a fala, Heleno foi advertido de que “estava em live”.

Posteriormente, Heleno comentou o fato. E, apesar de o vídeo ter sido compartilhado nas redes sociais do presidente Jair Bolsonaro, disse considerar que a divulgação de sua fala foi uma invasão de privacidade. “Em mais um lamentável episódio de invasão de privacidade, hábito louvado no Brasil, vazou para a imprensa uma conversa que tive com o dr. Paulo Guedes e o gen. Ramos”, escreveu no Twitter. Ele ressaltou que a opinião é de inteira responsabilidade dele e que não foi fruto de nenhuma conversa com Bolsonaro ou com outros ministros.

“Externei minha visão sobre as insaciáveis reivindicações de alguns parlamentares por fatias do Orçamento Impositivo, o que reduz, substancialmente, o Orçamento do Poder Executivo e de seus respectivos ministérios”, frisou. “Isso, a meu ver, prejudica a atuação do Executivo e contraria os preceitos de um regime presidencialista. Se desejam o parlamentarismo, mudem a Constituição. Sendo assim, não falarei mais sobre o assunto”, emendou.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), revidou, sem medir palavras. “Geralmente, na vida, quando vamos ficando mais velhos, vamos ganhando equilíbrio, experiência e paciência. O ministro, pelo jeito, está ficando mais velho e está falando como um jovem, um estudante no auge da sua juventude”, disparou. “Uma pena que um ministro com tantos títulos tenha se transformado em um radical ideológico contra a democracia, contra o parlamento, muito triste.”

Quem também se manifestou foi o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ele disse que nenhum ataque à democracia será tolerado pelo parlamento. “O momento, mais do que nunca, é de defesa da democracia, independência e harmonia dos poderes para trabalhar pelo país”, ressaltou.

Posicionamentos de representantes do governo com ataques diretos ao Congresso enfraquecem ainda mais as relações entre os poderes Executivo e Legislativo, comprometendo a discussão e a votação de agendas. É o que explica o cientista político e professor da Universidade de Brasília André Borges. “Apesar de ter apoio para votar algumas matérias, é um governo frágil e que não está em posição de emparedar o Congresso. Não tem maioria nas Casas”, afirmou. “Enquanto isso, Bolsonaro enquadra pautas via decreto, medidas provisórias, que vão caindo e não podem ser reeditadas. Governo vai por um caminho perigoso.”