Em meio à crise provocada pela fuga de 76 presos, o vice-ministro da Política Criminal do Paraguai, Hugo Volpe, pediu demissão. Relatórios produzidos pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil, enviados ao país vizinho, apontam que ele está envolvido em atos de corrupção. A pasta não comentou o intercâmbio de informações, mas a procuradora-geral do Ministério Público do Paraguai, Sandra Quiñone, confirmou que as revelações foram repassadas por autoridades brasileiras. Os 76 detentos fugiram, na madrugada de domingo, da Penitenciária Regional de Pedro Juan Caballero e são ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC).
De acordo com Sandra Quiñone, um procurador brasileiro também repassou as informações. “É uma denúncia formal, recepcionada pelo Ministério Público (do Paraguai), do Ministério da Justiça brasileiro, e de que tomamos conhecimento esta manhã (ontem)”, disse. Em meio às supostas irregularidades cometidas por Hugo Volpe, estão crimes na fronteira entre os dois países. Os relatórios, produzidos por investigações de autoridades brasileiras, contêm mais de 3.500 páginas e vinham sendo mantidos em sigilo.
Dos fugitivos, 40 são brasileiros e 36, paraguaios. No grupo estão criminosos ligados a Sérgio de Arruda Quintiliano, o Minotauro, um dos principais líderes do PCC, preso em fevereiro de 2018 pela Polícia Federal. Os detentos supostamente ligados a Minotauro são os brasileiros Julio César Gomes, de 29 anos; Ailton Botelhos dos Santos, 35; Felipe Diogo Fernandes Dias, 25; Rafael de Souza, 25, e Luciano de Souza Martins, 26, além do paraguaio Marcos Paulo Valdez Moreira, de 25 anos.
É possível que boa parte dos fugitivos já esteja no Brasil. O principal temor das autoridades é que eles tentem chegar a São Paulo, onde estão as maiores células da facção criminosa. A Polícia de Ponta Porã (MS) encontrou três veículos queimados na BR-463, próximo ao distrito de Sanga Puitã, do lado brasileiro da linha internacional que separa os dois países. Como os carros foram achados logo após a fuga, o secretário da Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Antonio Carlos Videira, também acredita que parte dos criminosos fugiu para o Brasil.
Capturas
As forças de segurança do Paraguai conseguiram prender, ontem, um segundo fugitivo entre os 76 que escaparam da prisão de Pedro Juan Caballero. Sabio Darío González Figueredo acabou sendo recapturado ainda no território do país vizinho. O primeiro a ser encontrado foi o brasileiro Eduardo Alves da Cuña, detido em Ponta Porã (MS). De acordo com o Ministério do Interior do Paraguai, Sabio González “foi surpreendido quando estava escondido em um bairro periférico de Pedro Juan Caballero, a 200 metros da penitenciária”. “Ele foi recapturado quando estava prestes a abandonar a cidade. Essas ações fazem parte dos primeiros resultados de trabalhos em conjunto com o governo brasileiro, na zona de fronteira seca”, emendou a pasta.
No Brasil, o Ministério da Justiça enviou tropas para montarem barreiras, com a finalidade de identificar fugitivos que tentam entrar no país. Homens da Força Nacional, da Polícia Militar de Mato Grosso do Sul e das Forças Armadas reforçam a segurança.
Tentáculos
O Primeiro Comando da Capital é uma facção que surgiu em São Paulo e ganha território pelo país e na América do Sul. Pedro Juan Caballero é considerada uma cidade estratégica para o grupo criminoso, já que é por lá que a droga traficada dos países vizinhos entra no Brasil. Uma vez em território nacional, segue para Estados Unidos, Europa e Ásia.
Saiba mais
Ao ser confrontado com a denúncia, Hugo Volpe teria negado os fatos, mas decidiu pela não permanência no cargo para se defender das acusações. De acordo com a ministra da Justiça, Cecilia Pérez, o caso que envolve o promotor não tem a ver com a fuga de presos. “Como ele (Volpe) está sendo alvo de uma investigação, pôs o cargo à disposição para evitar conflitos, porque também deve esclarecer o caso em que foi apontado seu envolvimento.”
O ministro Arnaldo Guizzio, da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), disse que o presidente Mario Abdo aceitou a demissão do vice-ministro para seguir com as investigações e chegar à verdade dos fatos. Volpe desempenhou o cargo de promotor do combate ao narcotráfico até novembro do ano passado, quando pediu demissão do Ministério Público para assumir como titular do vice-ministério de Política Criminal, vinculado ao Ministério da Justiça.
O promotor paraguaio foi figura de destaque nas ações conjuntas entre o Brasil e o Paraguai para combater o narcotráfico na fronteira. Em várias operações, ele prendeu policiais que chefiavam departamentos em cidades da fronteira com o Brasil. Ameaçado de morte pelos traficantes, passou a contar com segurança oficial.
“É uma denúncia formal, recepcionada pelo Ministério Público (do Paraguai), do Ministério da Justiça brasileiro, e de que tomamos conhecimento esta manhã (ontem)”
Sandra Quiñone, procuradora-geral do Ministério Público do Paraguai