Correio Braziliense
postado em 17/01/2020 06:00
A reforma administrativa que o governo pretende enviar ao Congresso em fevereiro, conforme prometido pelo presidente Jair Bolsonaro, deve se ater apenas aos servidores do Executivo. Integrantes dos demais poderes, como juízes, integrantes do Ministério Público e parlamentares, não entrarão nas mudanças, de acordo com um dos integrantes da força-tarefa criada no Ministério da Economia para tratar do tema.
A pasta, responsável pelos ajustes da proposta, entende que a decisão de acabar, por exemplo, com os supersalários e benefícios excessivos de algumas funções, caberá aos poderes envolvidos. Ao Executivo, fica a missão de tentar reajustar as carreiras de servidores que compreendem a União — estados e municípios podem ser incluídos — para desenvolver um modelo mais eficiente de serviço público.
Durante café da manhã com jornalistas, o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Paulo Uebel, antecipou que a matéria será enviada ao Congresso em doses homeopáticas. Primeiro, o governo vai encaminhar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) com os principais pontos da reestruturação de carreiras da administração federal. Depois, virão os projetos de lei e decretos para complementar medidas e reestruturações de carreiras e de salários, por exemplo.
Uebel reforçou alguns pontos que não devem ser mudados para os atuais servidores. “A proposta não vai mexer com a estabilidade. Não vai haver mudança nos salários e não vai haver desligamento.”
De acordo com o secretário especial adjunto de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Gleisson Rubin, por questões legais, essa reforma será feita em etapas, ao contrário do que aconteceu com a reforma da Previdência. “A reforma administrativa será diferente da previdenciária, porque há matérias constitucionais e infraconstitucionais. E, por conta disso, o projeto vai ter que olhar para todo o ordenamento legal da administração pública”, explicou.
Incompleta
Segundo o especialista em contas públicas e secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco, os gastos do Brasil com pessoal são muito maiores do que os de outros países. “Conforme dados do Banco Mundial, a diferença entre os salários do setor público federal e do privado fica 21% acima da média internacional.”
Segundo Uebel, o gasto com o funcionalismo no Brasil gira em torno de 13,6% do Produto Interno Bruto (PIB), percentual acima dos registrados por países desenvolvidos, como Estados Unidos e França, que ficam abaixo de 10%. “Em relação à reforma administrativa, aprimorar a gestão é, sem dúvida, um objetivo importante, mas não há como ignorar o componente fiscal, principalmente, quando o rombo previsto nas contas públicas para este ano é de R$ 124,1 bilhões”, reforçou.
Na avaliação de Castello Branco, se o governo não enviar uma ampla proposta de reforma, mostrará que está com receio de manifestações dos servidores. “O funcionalismo é uma classe unida e tem pressão grande em ano eleitoral. E os parlamentares também têm interesses nas eleições deste ano, pois muitos deverão ser candidatos”, frisou.
Modelo
Inspirado nos militares e nos magistrados, um ponto do projeto, ainda em avaliação, proíbe que integrantes de determinadas carreiras sejam filiados ou atuem em temas político-partidários. “Serão, basicamente, as carreiras de Estado. A questão foi levantada pelos servidores ao tratarmos de mudanças na estabilidade”, contou outro integrante da equipe que rascunha a reforma. “Alguns ficaram preocupados que avaliações de desempenho fossem prejudicadas pelo viés político.”
Mesmo com o período eleitoral, o governo espera aprovar a reforma administrativa até dezembro. Um dos motivos para a pressa é aproveitar a “janela” de aposentadorias dos servidores públicos nos próximos anos. Estudo do Ministério da Economia prevê que 21% do funcionalismo vai parar de trabalhar até 2024. Esse total sobe para 42% em 2030 e 61%, em 2039. “Com tanta gente saindo, os que entrarem terão regras novas, o salário não vai ser completo logo nos primeiros anos, e as provas de desempenho vão trazer gente mais qualificada”, ressaltou uma técnica da Esplanada dos Ministérios.
R$ 318,8 bilhões: Valor gasto pela União, de janeiro a novembro de 2019, com pessoal e encargos sociais. Foi a segunda maior despesa primária no período, atrás somente dos custos com benefícios previdenciários, de R$ 629,3 bilhões.
Redução no número de carreiras
O governo pretende fazer, ainda no primeiro semestre, uma nova revisão na estrutura da administração pública, reduzindo o número de carreiras e de cargos considerados obsoletos. Em 2019, de acordo com o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, 40 mil postos considerados obsoletos foram extintos. A meta é reduzir mais cargos neste ano. O levantamento dessas funções obsoletas está sendo feito junto aos órgãos, e a ideia é chegar a um resultado ainda neste primeiro semestre.
Durante café da manhã com jornalistas, ontem, Uebel citou várias medidas de informatização de serviços que estão sendo conduzidas pela pasta e reforçou o interesse em reestruturar as carreiras, reduzindo o número delas e aumentando os prazos para que o servidor concursado atinja o topo do cargo. Ao ser questionado sobre a possibilidade de realização de novos concursos ou de novos reajustes para servidores neste ano, ele parafraseou o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues: disse que “não há espaço no Orçamento”. “Toda decisão para pensar em aumento do quadro precisará ser analisada no campo e no espaço. Um concurso prevê uma despesa com um funcionário por 60 a 80 anos”, ponderou. Diferentemente do setor privado, em que os aposentados saem da folha de pagamento, o funcionário público continua a ser mantido pelo órgão em que trabalhava, com aposentadoria e até com os pensionistas.
Ao fazer um balanço das ações em 2019, o secretário citou dados da transformação digital do governo e a extinção de 21 mil cargos e funções comissionadas, que resultaram em uma economia de R$ 194 milhões por ano. Segundo ele, o Executivo estuda, com a reforma administrativa, novas regras para a contratação de funcionários temporários, sem a necessidade de realização de concursos para casos urgentes, como o do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). “O ideal seria fazer uma contratação temporária. O problema é que existem restrições legais para isso”, lamentou.
De acordo com o secretário, a pasta realizou a revisão de 3,7 mil atos normativos, sendo que 3,3 mil deles foram revogados ou extintos em 2019, e, neste ano, a meta é revisar outros 10 mil, com previsão de extinguir 82% desse montante. Uebel destacou também que o acordo cooperativo com grandes empresas de tecnologia da informação gerou uma economia média de 25% nos gastos com contratos, antes individuais de cada órgão, e, para 2020, a expectativa é ampliar o número de parcerias, reduzindo R$ 112 milhões dos R$ 450 milhões previstos apenas com licenciamento de softwares.
Gleisson Rubin, secretário especial adjunto de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, lembrou que o TaxiGov (leia Saiba mais) será ampliado neste ano para outros estados, como Minas Gerais, Mato Grosso e Rio Grande do Norte. Atualmente, a ferramenta é utilizada em 56 órgãos federais, incluindo a Secretaria de Economia do Distrito Federal (GDF). No Rio de Janeiro e em São Paulo, o uso proporcionou economia com serviços de transporte de 48% e de 60%, respectivamente.
Saiba mais
Oferta de transporte
É o serviço de transporte de servidores e colaboradores da administração pública federal em deslocamentos a trabalho com o uso de táxis, que começou a ser implementado em março de 2017. O objetivo é melhorar a oferta de serviços de transporte administrativo ao servidor, com economia, transparência de gastos públicos e eficiência. Podem utilizar o serviço servidores e colaboradores do Poder Executivo federal da administração direta, indireta, autárquica e fundacional que precisam se deslocar em função de atividades de trabalho. O modelo é gerenciado pela Central de Compras do Ministério da Economia, com administração descentralizada, ou seja, os órgãos e entidades fora do DF firmam contratos diretos com as empresas. As informações são do Ministério da Economia.
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