Aprovar no Congresso a medida provisória que libera o pagamento de 13º salário aos beneficiados pelo Bolsa Família ajudará o Planalto a rascunhar o novo desenho do programa. Desde o ano passado, o Ministério da Cidadania e a Casa Civil tentam fazer com que o presidente Jair Bolsonaro pressione o ministro da Economia, Paulo Guedes, a liberar R$ 14 bilhões para mudanças no programa. Guedes, no entanto, diz não ter nem dinheiro nem tempo para discutir as ideias.
Uma saída é pressionar os parlamentares na volta do recesso e tentar colocar a votação da MP em pauta. Assim, seriam injetados quase R$ 3 bilhões no projeto para o pagamento de um “abono natalino”, em 2020, aos 13,5 milhões de beneficiados — no ano passado, foram liberados R$ 2,58 bilhões para a parcela extra, graças a uma MP editada especificamente para 2019. “Se o presidente conseguir o dinheiro do 13º, não vai ter como a Economia segurar as mudanças estruturais”, disse um técnico do Congresso.
Ao articular na Câmara e no Senado uma votação que fortaleça o Bolsa Família, o governo se exime de uma eventual interferência no planejamento do ministro da Economia, que só opera com total autonomia, como gosta de lembrar nas reuniões palacianas, ainda que tenha amargado derrotas ao longo do primeiro ano de gestão. “O presidente prefere não se envolver nessa questão, tanto que o projeto para mudar o programa social está aí desde janeiro de 2019 e pouco mudou de lá para cá”, destaca um dos assessores de Guedes na Economia.
Enviada pelo Executivo ao Congresso, a MP 898/19 trata justamente da liberação do 13º salário aos beneficiados pelo programa. O texto precisa ser votado até maio ou perderá a validade. Por isso, articuladores do Planalto têm visitado assessores próximos dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em busca de aproximação para que o item figure entre os primeiros a serem analisados pelo parlamento.
“Uma sinalização dessa demonstraria, com certeza, que o Congresso está em busca de entender melhor as mudanças propostas pelo governo Bolsonaro, que surpreende ao dar continuidade a um projeto petista”, explica o professor de ciência política João Carlos Borges Cerqueira, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Para o especialista, está claro que “a Esplanada não ficaria sem se movimentar com a aprovação de um projeto de lei que direciona mais fundos ao Bolsa Família”.
Para reformular o programa, o governo estuda subdividir o projeto em três partes: o benefício pago às famílias de baixa renda, o específico para crianças de até 3 anos e outro que contempla os jovens até 21 anos. O custo estimado para essas e outras mudanças é de cerca de R$ 14 bilhões.
Transferência de renda
Criado em 2003 na primeira gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Bolsa Família recebe dinheiro do governo para distribuir a pessoas de baixa renda. Diversos requisitos são observados na hora do cadastro, mas o projeto de combate à extrema pobreza chegou a ser fraudado. Até novembro de 2019, foram excluídos 1,3 milhão de beneficiários devido a irregularidades no cadastro.