Correio Braziliense
postado em 11/01/2020 07:00
O presidente Jair Bolsonaro terá 47 chances de nomear diretores para as agências reguladoras até o final do mandato, em 2022. Só este ano vagam 13 postos, que somados aos 10 já desocupados desde 2019 totalizam 23 possíveis indicações. Resta saber se o chefe do Executivo vai aproveitar as oportunidades ou acumular as vagas. Para especialistas, postos desocupados enfraquecem a regulação e contradizem a orientação liberal do governo.
De acordo com Carlos Ari Sundfeld, professor titular da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV), há uma tendência progressiva de aumento nas vacâncias no comando das agências nos últimos anos, principalmente a partir do segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. As nomeações precisam ser aprovadas pelo Senado e enfrentam os aspectos relacionados ao toma lá, dá cá com os parlamentares. Como a articulação política não é o forte do presidente, tal qual Dilma, a tendência é de as vagas se acumularem.
“Já temos mais de 20 anos de vivência com indicações para agências reguladoras. No geral, o processo não mudou muito. A novidade é a aprovação da nova Lei das Agências Reguladoras (Lei 13.848/19), no ano passado. No entanto, ela não traz nenhum dispositivo para evitar o acúmulo de vagas abertas, ou seja, não estipula prazo para as substituições”, disse Sundfeld.
Para o especialista, como há uma “simpatia” do atual governo pela economia de mercado, seria coerente o presidente esforçar-se para manter as agências funcionando bem, já que elas são o elo entre o governo, o mercado e os consumidores.
Centralização
Na opinião de Sérgio Guerra, professor titular de direito da FGV-Rio, que também acompanha o tema regulação, é preciso priorizar as agências e ter mais compreensão sobre o modelo. “Falta entender o que é regulação e a importância de estruturas de Estado. Desde o Império, o Brasil tem uma tradição de centralizar poder no chefe do Executivo. O perfil do atual presidente também é centralizador, com exceção da economia, que ele delega para o ministro Paulo Guedes.”
Segundo Guerra, a nova Lei das Agências Reguladoras criou um mecanismo, com lista tríplice, para que sejam nomeados interinos para os cargos de direção por 180 dias na falta do titular, mas, para o especialista, a nomeação dos indicados confere mais estabilidade às agências. “Se o presidente quer valorizar o mercado, como diz, tem de valorizar o modelo regulatório e ter agências fortes. Afinal, ele aprovou a Lei de Liberdade Econômica. Não valorizar as agências é contraditório”, afirma.
As indicações para as diretorias das agências reguladoras são feitas pelo presidente, que recebe uma lista tríplice com nomes sugeridos pelo ministério ao qual a agência é vinculada. O presidente escolhe um nome e envia uma mensagem para o Senado. O indicado é submetido a uma sabatina em comissão e, se aprovado, é submetido ao plenário.
No ano passado, apenas Davi Ferreira Gomes Barreto e o médico Antonio Barra Torres foram sabatinados, e aprovados, pelo Senado para exercerem cargos de direção na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), respectivamente, de acordo com levantamento no site do Senado. O Correio solicitou à Casa Civil, à Presidência e à Secretaria de Governo o total de indicações para ocupar diretorias em agências reguladoras, mas não recebeu as informações.
Para Sundfeld, diretorias completas reforçam a segurança regulatória e dão mais agilidade ao trabalho desses órgãos de Estado. Na opinião dele, a boa notícia é que há a tendência de manter o padrão dos últimos anos de nomeação de técnicos, com apoio político, ligados à máquina pública. “O padrão das indicações que serão feitas por Bolsonaro não deve mudar, já que os cargos são pouco atrativos, pois os salários são baixos comparados aos dos executivos do mercado, e os riscos são altos, além de ter o preço de precisar morar em Brasília.” Além disso, conforme o especialista, vai ficar cada vez mais difícil os setores ligados às agências aceitarem indicações políticas de postulantes não conectados aos setores regulados. “E isso é muito positivo”, destaca.
Segundo Guerra, o artigo 5º da nova lei estabelece o perfil dos ocupantes dos cargos de direção, que agora precisam comprovar notório saber e experiência no setor. “Não há evidências empíricas de que os parlamentares estejam recusando as indicações porque querem fazer indicações políticas. De qualquer forma, cabe ao presidente enviar seus nomes e deixar para o Senado o ônus junto à sociedade de rejeitar indicações técnicas por pressões políticas, se for o caso”, pondera.
Em outubro, o presidente enviou ao Senado o nome de Carlos Manuel Baigorri, superintendente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), para a vaga deixada pelo diretor Aníbal Diniz. Baigorri é economista e foi consultor e analista de informações setoriais em associação de operadoras celulares. Ele é servidor de carreira da Anatel desde 2009. A indicação aguarda sabatina, a ser marcada depois do recesso parlamentar.
Vai e volta
Para outras indicações, também técnicas, à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o caminho não foi em linha reta. O presidente enviou mensagem ao Senado com os nomes de Ricardo Catanant e de Thiago Costa Caldeira para cargos de direção. Sem dar explicações, menos de 24 horas depois, a Presidência substitui Catanant pelo chefe da Assessoria Especial de Assuntos Institucionais e Internacionais do Ministério da Infraestrutura, Gustavo Sabóia Vieira, cujo nome também acabou sendo retirado.
A primeira tentativa ocorreu em outubro, quando Bolsonaro tentava apoio para a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para a Embaixada dos Estados Unidos. Em dezembro, sem as negociações em torno de Eduardo, que desistiu do posto na capital americana, os nomes de Catanant e Caldeira voltaram para o Senado e agora aguardam sabatina.
Outras duas vagas serão abertas na Anac em março, mas a mais esvaziada é a Agência Nacional do Cinema (Ancine), que atualmente conta apenas com o diretor-presidente interino Alex Muniz Braga. No ano passado, Bolsonaro chegou a ameaçar acabar com a agência por não concordar com as produções financiadas por ela.
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