Pressionado para vetar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) de R$ 2 bilhões proposto pelo Congresso para as eleições municipais deste ano, o presidente Jair Bolsonaro alegou que cometeria crime de responsabilidade e poderia sofrer impeachment caso vetasse o texto.
Ele já havia indicado que sancionaria o projeto, mas voltou a falar sobre o assunto na tradicional live pelo Facebook na quinta-feira (2/1). Para justificar a decisão, Bolsonaro citou os incisos do artigo 85 da Constituição, que aborda os crimes de responsabilidade, no qual é possível ler: "São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição e, especialmente, contra: III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; VI - a Lei Orçamentária; VII - O cumprimento das leis".
"Eu vou vetar isso? Com toda certeza alguém vai entrar com um pedido de impeachment", concluiu Bolsonaro. Antes disso, o chefe do Executivo já havia dito para receber a notícia.
A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) usou o Twitter na manhã desta sexta-feira (3/1) para dizer que Bolsonaro cometeu "estelionato moral" ao falar sobre fundo eleitoral, já que o argumento de impeachment é "enganoso". "Afirmar que a discussão legislativa do quarto a ser aprovado geraria crime de responsabilidade é pura má-fé. É tentar manipular de forma mentirosa a opinião pública. Isso não pode ser feito por um presidente da República. É vergonhoso. Vexatório. É molecagem", escreveu no microblog.
O Correio conversou com constitucionalistas para verificar se Bolsonaro poderia ou não sofrer uma tentativa de impeachment, caso vetasse o projeto do Congresso.
Para a advogada constitucionalista Vera Chemim, a posição de Bolsonaro em sancionar o montante é mais política do que técnica. Ou seja, se vetasse, dificilmente seria alvo de um processo de impeachment, mas o veto pode significar uma saia-justa com o Congresso. "Desde que ele atenda à legislação eleitoral, ao código e as demais legislações, não há porque ele sofrer crime de responsabilidade, caso ele vete algo que o Congresso decidiu", opinou.
A justificativa está no inciso V do artigo 84 da Constituição Federal, como mostra Chemim, que versa sobre as competências do presidente da República. "Uma das competências privativas da Presidência está prevista no artigo 84, inciso V, que é justamente vetar projetos de lei total ou parcialmente. Não há porque ele argumentar que pode sofrer impeachment", explicou.
E mesmo se o presidente da República vetasse o texto, ao voltar ao Congresso, os deputados e senadores teriam 30 dias para derrubar o veto, caso formassem maioria absoluta. "A partir do momento que ele veta o Fundo Eleitoral, ele vai atingir diretamente os partidos políticos, então, é um ponto sensível. Ele pode levar a um novo conflito no Legislativo", continuou Chemim. "É uma questão política. Não afeta diretamente vetar ou não. Porque ele tem o poder de sancionar ou vetar dentro dos limites legais", acrescentou.
Para Adib Abdouni, especialista em direito constitucional e criminal, a legislação é clara. "O fundo tem uma legislação específica. Se ele sancionar a lei ou não aceitar, ele não gera nenhum crime. Isso apenas ocorre se ele ultrapassar as hipóteses do crime de responsabilidade e da área orçamentária", afirmou.
Na opinião do especialista, o governo encara um problema político, não orçamentário. "Todo argumento para passar é político. O próprio fundo é de interesse dos donos dos partidos. Bolsonaro demonstra, pelo discurso, que tem interesse no fundo. Então, ele tem que evitar a parte política, mas a interpretação da Constituição é clara. A lei de impeachment também tem as próprias especificações", concluiu.
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