[FOTO1]Neste ano, até o início de dezembro, parlamentares, por iniciativa própria ou em articulação com o governo, apresentaram 97 Propostas de Emenda à Constituição (PECs). São mais de oito projetos para alterar o texto da Constituição Federal por mês. Desse total, seis supostamente importantes para o Executivo federal ganharam espaço especial nas páginas de jornais. Cinco das pautas são econômicas, temas afeitos à pauta dos partidos de centro e de direita que, juntos, compõem a maioria dos parlamentares do Congresso. Apesar disso, a única aprovada foi a PEC da reforma da Previdência.
O baixo índice de aprovação não se deve apenas à complexa tramitação desse tipo de matéria, que exige, pelo menos, três quintos dos integrantes da Câmara (308) e do Senado (49), em dois turnos em cada Casa, mas à dificuldade do presidente Jair Bolsonaro e de seus ministros de se articularem com os congressistas.
A incapacidade do Executivo de lidar com o Congresso passa também pelo descumprimento de acordos e promessas. O complemento da reforma da Previdência, a PEC Paralela, que possibilitará a inclusão de estados e municípios nas alterações aprovadas em outubro, é um retrato claro dessa situação. O texto corre o risco de ser desidratado, e o principal motivo é que o governo não liberou os R$ 3 bilhões em emendas parlamentares ao Orçamento prometidos a deputados para a aprovação do texto principal em agosto.
No fim de novembro, o porta-voz do Planalto, Otávio Rego Barros, admitiu que a PEC da reforma administrativa ficará para o ano que vem. Falta fôlego até para a reforma tributária, que tem comissão especial na Câmara. Sem se identificar, um líder do centro falou sobre o cenário desfavorável que o próprio Executivo criou. ;O governo não honrou com o que prometeu com a maioria dos partidos. Só vai agravando o problema. Se acontecer o que os parlamentares esperam, pode ajudar. Mas, hoje, não passaria. Retirar os penduricalhos da PEC Paralela seria um alento. É um paciente na UTI, mas ainda é difícil;, alertou.
Banalização
Mas o problema da apresentação e tramitação das PECs não é exclusividade do governo Bolsonaro. Constitucionalistas e parlamentares que atuaram como constituintes em 1988 criticam a proliferação desses textos no Congresso. Mestre em direito público administrativo pela FGV, Vera Chemim destacou que uma PEC tem que ter relevância. ;Está havendo uma crescente banalização de propostas de emenda constitucional;, avaliou.
Daniel Gerber, mestre em direito penal e processual penal, observa que a Carta Magna é muito detalhista. ;Quanto mais regras, mais regras serão descumpridas. Infelizmente, o brasileiro ainda acredita que a solução para as nossas mazelas passa pela aprovação de leis. Não. Passa por um grau cultural e de cidadania da população. Talvez por isso, nós estejamos, desde 1988, em posse de uma Constituição que jamais foi efetivamente implementada na prática;, lamentou.