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STF impõe revés à Lava-Jato

Corte proíbe prisão após condenação em 2ª instância, uma das bases da força-tarefa. Decisão permitirá a soltura de milhares de detentos, entre eles, o ex-presidente Lula

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Depois de cinco sessões de julgamento, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu, por seis votos a cinco, a execução da prisão após condenação em segunda instância. Com isso, a Corte retrocedeu ao entendimento que vigorou entre 2009 e 2016, impondo um retrocesso no combate à corrupção e um duro revés à Operação Lava-Jato. Pelo menos 38 réus investigados pela força-tarefa devem ser liberados, de acordo com levantamento do Ministério Público Federal do Paraná. O efeito da decisão é imediato, e assim que a ata do julgamento for publicada, advogados poderão solicitar a liberação de condenados que estão presos em decorrência de sentença tomada em segundo grau. Entre os beneficiados, está o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (leia reportagem na página ao lado).

Além do petista, milhares de presos devem ser soltos para aguardar recursos ao STJ e ao STF. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a decisão atinge 4.895 detentos em todos os estados. Entre os condenados na Lava-Jato que podem ser liberados em razão do entendimento do Supremo estão o ex-ministro José Dirceu, condenado a oito anos e 10 meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro em contratos da Petrobras; o ex-gerente da Petrobras Pedro Augusto Cortes Xavier; o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, além do ex-diretor da Petrobras Renato Duque e do pecuarista José Carlos Bumlai.

Em nota publicada logo após o julgamento, a força-tarefa da Lava-Jato declarou que o entendimento do STF prejudica o combate à corrupção e favorece a impunidade. ;A decisão do Supremo deve ser respeitada, mas, como todo ato judicial, pode ser objeto de debate e discussão. Para além dos sólidos argumentos expostos pelos cinco ministros vencidos na tese, a decisão de reversão da possibilidade de prisão em segunda instância está em dissonância com o sentimento de repúdio à impunidade e com o combate à corrupção, prioridades do país;, destacou um trecho do texto.

Procuradores da Lava-Jato lembraram que a grande quantidade de recursos possíveis no sistema jurídico brasileiro resulta, inclusive, na prescrição de crimes. ;A existência de quatro instâncias de julgamento, peculiar ao Brasil, associada ao número excessivo de recursos que chegam a superar uma centena em alguns casos criminais, resulta em demora e prescrição, acarretando impunidade. Reconhecendo que a decisão impactará os resultados de seu trabalho, a força-tarefa expressa seu compromisso de seguir buscando justiça nos casos em que atua;, emendou a nota.

O presidente da Associação Nacional do Ministério Público (Conamp), Victor Hugo Azevedo, lamentou o desfecho do julgamento. ;Reafirmo a preocupação do Ministério Público brasileiro com o provável retrocesso jurídico, que dificulta a repressão a crimes, favorecendo a prescrição de delitos graves, gerando impunidade e instabilidade jurídica;, ressaltou.

O ministro Edson Fachin, relator dos casos da Lava-Jato no Supremo, afirmou que os trabalhos relacionados à operação vão continuar normalmente na Corte. ;Não creio que seja suficiente apenas culpar o sistema de processo penal pelas circunstâncias suscitadas neste julgamento. A relatoria dessa operação vai continuar a fazer o que tem de fazer, que é promover a responsabilização, quando for o caso, e a absolvição, quando for o caso.;

Toffoli
O ministro Dias Toffoli, que desempatou o placar, rebateu críticas de que a medida vai gerar impunidade e destacou que cada magistrado deve avaliar a situação do preso quando receber o pedido de liberdade. ;No Brasil, mais de 300 mil pessoas estão presas por condenação em primeira instância. E continuarão presas, pois são pessoas perigosas;, disse o presidente da Corte, defendendo que condenados sejam presos logo após julgamento no Tribunal do Júri, que atua em casos de crimes hediondos, ou seja, dolosos contra a vida. Esse assunto ainda será analisado pelo plenário do Supremo.

Votaram a favor da prisão após condenação em segunda instância os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os contrários à detenção antes de apresentar todos os recursos possíveis foram Marco Aurélio (relator), Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello, além de Toffoli.

Após o resultado, apoiadores do ex-presidente Lula que estavam na Praça dos Três Poderes soltaram fogos de artifício, e o barulho pôde ser ouvido dentro do tribunal. A Polícia Militar reforçou a segurança.

Respeito
No julgamento, a ministra Cármen Lúcia pediu que visões contrárias sejam respeitadas. ;Quem gosta de unanimidade é ditadura. Democracia é plural, sempre. Diferente não é errado apenas por não ser mero reflexo;, frisou. Ela declarou que conhece os problemas do sistema penal do país, mas que a precariedade não pode servir como fundamento para não aplicar a lei. De acordo com a magistrada, derrubar a possibilidade de prisão em segunda instância aumenta a impunidade. ;Se não se tem a certeza de que a pena será imposta, de que será cumprida, o que impera não é a incerteza da pena, mas a certeza ou pelo menos a crença na impunidade.;

O ministro Gilmar Mendes destacou que mesmo no Superior Tribunal de Justiça (STJ), considerado a terceira instância, é possível anular a pena de uma pessoa condenada nas instâncias inferiores. ;O STJ pode corrigir fatos sobre a culpabilidade do agente, alcançando, inclusive, a dosimetria da pena;, disse.

Saiba mais
Três ações

O julgamento encerrado ontem foi sobre o mérito de três ações, movidas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), PCdoB e Patriota, que tratam sobre a execução antecipada de pena. As ações pediam que fosse confirmada a validade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que prevê o trânsito em julgado ; quando todos os recursos jurídicos são esgotados ; como necessário para estabelecer as condições da prisão. Esse dispositivo foi incluído pelo Congresso Nacional em 2011.

Mudança de posição
O julgamento de ontem marcou a segunda vez que Toffoli mudou de posição sobre o tema. Em fevereiro de 2016, ele admitiu a prisão após condenação em segunda instância. Depois, passou a defender uma solução intermediária ; de se aguardar uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Agora, o presidente do Supremo votou pelo trânsito em julgado.

4.895
Número de presos que podem ser beneficiados pela decisão, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)


Contra a prisão
Ricardo Lewandowski
Rosa Weber
Marco Aurélio Mello
Celso de Mello
Gilmar Mendes
Dias Toffoli

A favor da prisão
Edson Fachin
Alexandre de Moraes
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux
Cármen Lúcia