al[FOTO1]O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quinta-feira (17/10), o julgamento que pode resultar na revisão do entendimento da Corte sobre a prisão em segunda instância. Na primeira das sessões agendadas para tratar do tema, ocorreu a fase das sustentações orais, onde as partes interessadas apresentaram versões contra e a favor do chamado cumprimento antecipado da pena.
O presidente do Tribunal, ministro Dias Toffoli, tentou amenizar a polêmica criada em torno do caso. Sem citar diretamente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele declarou que o julgamento não tem como objetivo afetar ;nenhuma situação particular;.
A sessão foi suspensa e a análise do caso deve continuar na próxima quarta-feira (23/10), com o voto dos ministros. Estão em julgamento três Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) que pedem a validação do artigo 285 do Código de Processo Penal que afirma que "ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva;.
As ações foram apresentadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Patriota e PCdoB. Logo no começo da sessão, Toffoli rebateu críticas sofridas pelo Supremo em decorrência do julgamento. ;Que fique bem claro que as presentes ações, e este julgamento, não referem a nenhuma situação particular;, disse.
Em seguida, Toffoli afirmou que os olhos da sociedade estão virados para a Corte e apresentou números sobre a produtividade neste ano, ressaltando que ;nenhum outro tribunal constitucional no mundo julga tanto;.
De acordo com ministro, foram realizadas 63 sessões no plenário físico, até ontem, com 247 casos julgados e 33 sessões no plenário virtual, com 2.306 processos avaliados. Na próxima semana, a Procuradoria Geral da República (PGR) e a Advocacia Geral da União (AGU) devem se manifestar no julgamento e defender que a prisão seja aplicada já a partir de condenação em segunda instância, como ocorre atualmente.
Além de representantes das instituições que entraram com as ações, advogados de instituições aceitas como amici curiae (amigos da Corte) foram a tribuna e apresentaram diferentes versões para o momento da prisão.
[SAIBAMAIS]O advogado Heracles Marconi, que representa o Patriota, afirmou que uma mudança sobre o entendimento atual da prisão em segunda instância deve ser realizado apenas pelo Congresso. "Na ação penal 470 (processo do mensalão) houve um único grau de jurisprudência. Na Lava-Jato houve um duplo grau de juridição. Uma pessoa, que eu não vou falar o nome, foi condenada, está presa. Houve a quebra de um paradigma. É preciso ter uma resposta satisfatória desta Corte aos anseios da sociedade. Se alguém pretende fazer diferente, que mude a letra da Constituição;, disse.
Atuando pelo Conectas, organização que luta pela proteção aos direitos humanos, a advogada Silvia Souza, declarou que a prisão antes do fim do processo prejudica as pessoas mais pobres e negras. "Os corpos negros estão nas valas, estão empoleirando as prisões em condições subumanas, em condições insustentáveis. Um debate tão serio quanto a relativização da presunção de inocência tem sido pautado como se afetasse apenas os condenados de colarinho branco, quando na verdade nós sabemos muito bem a quem se endereça o aparato penal do Estado. Ele se endereça aos pretos, pobres e periféricos", sustentou Sílvia Souza.
7 a 4
O ministro Marco Aurélio Mello, defensor da proibição da prisão a partir de condenação em segunda instância, afirmou que a Corte deve proibir o cumprimento da pena nesta fase do processo. Para o magistrado, pelo menos 7 integrantes do plenário apoia a revisão do entendimento atual da corte sobre o assunto.
O magistrado chegou até a opinar sobre qual será o resultado do julgamento. ;7 a 4 é o meu palpite. Não sei, como é que chegamos a sete? Eu costumo julgar os colegas por mim, às vezes sou otimista em excesso. É apenas a minha percepção, eu sempre acredito no melhor", disse.
Visão dos especialistas
Contrário à prisão após o julgamento em segunda instância, o criminalista e professor de direito penal e econômico da escola de direito do Brasil João Paulo Martinelli divide o julgamento em dois aspectos. Ou os ministros do STF levam em consideração o que diz à Constituição Federal, ou fazem uma leitura consequencialista. ;Não tem dúvidas do que está escrito ali. Eu sempre concordei com a posição de que o trânsito em julgado é que define quando se executa a pena. Não se alteram nem com emenda. Somente uma nova Constituição. E o entendimento atual está em desacordo;, explicou. ;Está tendo uma reação muito forte, e tem ministro falando em ouvir a voz da rua, e não seguir rigorosamente a burocracia da lei. Acho que teremos um julgamento apertado, de 6 a 5 pela inconstitucionalidade. O Toffoli vem defendendo uma terceira via, que também fere a constituição, que é o trânsito em julgado só acontecer com a decisão do STJ. Mas não tem previsão legal;, acrescentou.
Favorável à prisão após a condenação em segunda instância, Vera Chemim, constitucionalista e mestre em direito público administrativo pela Fundação Getúlio Vargas faz uma defesa técnica dos motivos. ;Do ponto de vista jurídico, eu considero que o princípio da presunção da inocência não é afrontado pela prisão em segunda instância. Isso porque somente a primeira e segunda instância que examinam os fatos e provas. A partir daí, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, a defesa do réu só vai interpor recurso junto ao STJ se algum tipo de lei federal tiver sido afrontada no processo. A partir do momento que os fatos e as provas foram corroborados na segunda instância, o réu é culpado;, argumenta.
Vera Chemim vê três cenários possíveis para o julgamento e a prevalência da inconstitucionalidade da prisão após o julgamento da segunda instância. ;Se partimos do pressuposto que o Alex de Morais e a Carmen Lúcia manterão a decisão de 2016, a favor da prisão da condenação em segunda instância, teremos cinco de cada lado: Morais, Barroso Carmen Lúcia Fux e Fachin contra, Gilmar, Celso de Mello, Marco Aurélio, Lewandowski e Rosa Weber. Caberia o desempate ao Toffoli, que está defendendo a terceira instância, que seria o STJ. Alguém vai ter que ceder. E o Toffolli, acho, vai acabar tendendo contra a prisão em segunda instância. O segundo cenário é que Alexandre de Morais e Carmen Lúcia mudem de ideia e termos um placar de sete a quatro. Em último caso, seria 8 a 3, se o Alexandre de Morais mudasse de ideia e a Carmen Lúcia não. Mas acho que é difícil prever;, ponderou a jurista.