Nesta sexta-feira (27/9), por determinação do ministro do STF Alexandre de Moraes, a Polícia Federal cumpriu mandado de busca e apreensão na casa e no escritório de Janot em Brasília. Os agentes recolheram uma pistola, celulares, tablets e computadores. Os aparelhos eletrônicos serão analisados para verificar a existência de outros planos de assassinato eventualmente formulados pelo ex-PGR. Ele era esperado pelo STF para prestar esclarecimentos sobre o assunto, mas se recusou a prestar depoimento.
Partiu de Alexandre de Moraes também a ordem para suspender o porte de arma de Janot e impedir a entrada dele nas dependências do STF. O ministro atendeu a pedido feito por Gilmar Mendes à Corte. Segundo Moraes, a decisão teve como objetivo ;evitar a prática de novas infrações penais e preservar a integridade física e psicológica dos ministros, advogados, serventuários da Justiça e do público em geral que diariamente frequentam essa Corte;.
Para Moraes, as revelações de Janot estão ;alicerçadas em indícios de autoria e materialidade criminosas; e revelam um ;quadro gravíssimo;. ;As entrevistas concedidas sugerem que aqueles que não concordem com decisões proferidas pelos ministros desta Corte devem resolver essas pendências usando de violência, armas de fogo e, até, com a prática de delitos contra a vida;, alertou.
Gilmar Mendes, por sua vez, afirmou que o comportamento do desafeto mostra ;tentações tresloucadas;. Ele disse não imaginar ;que nós tivéssemos um potencial facínora comandando a Procuradoria-Geral da República; e recomendou a Janot ;que procure ajuda psiquiátrica;.
;Confesso que estou surpreso. Sempre acreditei que, na relação profissional com tão notória figura, estava exposto, no máximo, a petições mal redigidas, em que a pobreza da língua concorria com a indigência da fundamentação técnica. Agora, ele revela que eu corria também risco de morrer;, alfinetou o ministro. ;Nada mais me resta além de lamentar o fato de que, por um bom tempo, uma parte do devido processo legal no país ficou refém de quem confessa ter impulsos homicidas.;
O magistrado avaliou que o comportamento do ex-procurador-geral da República abre a possibilidade para que decisões judiciais no âmbito da Lava-Jato sejam colocadas em xeque. ;Tenho a impressão de que se trata de um problema grave de caráter psiquiátrico, mas isso não atinge apenas a mim, atinge a todas as medidas que ele pediu e foram deferidas no Supremo Tribunal Federal. Denúncias, investigações e tudo o mais. É isso que tem de ser analisado pelo país;, disse.
Reações
O relato de Janot gerou reações também entre deputados federais e senadores. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou: ;Hoje, descobrimos que o procurador-geral da República queria matar o ministro do Supremo. Então, quem vai querer investir num país desse? Você ia querer investir?;, questionou, durante evento no Rio de Janeiro sobre parcerias público-privadas, concessões públicas e fundos de investimento em infraestrutura.O deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR) classificou como ;totalmente irresponsável as declarações de Janot;. ;Anunciar que chegou perto de assassinar um ministro do STF só fará com que mentes insanas espalhadas Brasil afora comecem a cogitar realmente atitudes dessa natureza. Juristas, legalistas, democráticos devem reagir;, conclamou.
Já o senador Eduardo Braga (MDB-AM) pediu paz. ;Quando o ódio dá lugar aos argumentos diante das divergências, chega a hora de repensar se o extremo é mesmo o melhor caminho a ser seguido. Por mais paz e por mais exemplos de engrandecimentos do ser humano;, comentou.
;Declarações infelizes;
Por meio de nota, o Instituto de Garantias Penais criticou Janot e frisou que ele ;não possui a estabilidade mental necessária para exercer a função acusatória, ofício tão sensível em um Estado democrático de direito;. Para o instituto, a cogitação de homicídio ;eleva os embates que os ministros têm que enfrentar ; indevidamente ; a cada habeas corpus fundamentadamente concedido;.;Nesse sentido, todas as ações penais que conduziu o ex-PGR estão maculadas pela cólera que entorta e desencaminha o direito de punir do Estado. Estão, portanto, sob compreensível suspeita;, destacou o órgão. ;Que das declarações infelizes emanem, ao menos, resoluções: aos injustiçados pela postura do ex-procurador, que se reveja a injustiça, e ao próprio ex-procurador, que possa receber auxílio médico e recobrar a temperança.;
Doutor em direito penal, Conrado Gontijo frisou que é ;absolutamente espantoso imaginar que um procurador-geral da República, no auge da sua carreira, responsável por exercer uma função essencial para assegurar a democracia no Brasil, tenha cogitado a hipótese de praticar um ato tão descabido;. ;É bizarro que alguém pretenda solucionar um desgaste de forma tão violenta. Isso põe em xeque a condição dele para conduzir um trabalho tão importante à época;, afirmou.
O que decidiu o STF
; Suspender o porte de arma de Rodrigo Janot; Aplicar contra ele a medida cautelar de proibição de aproximar-se a menos de 200 metros de qualquer um dos ministros da Corte
; Impedir o acesso do ex-procurador-geral da República ao prédio sede e anexos do tribunal
; Coletar armas, computadores, tablets, celulares e outros dispositivos eletrônicos na casa e no escritório de Janot
; Colher depoimento do ex-procurador-geral da República. Janot se negou a prestar esclarecimentos
Entenda o caso
Rodrigo Janot era procurador-geral da República, em maio de 2017, quando entrou armado no prédio principal do Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes. O então chefe do Ministério Público Federal chegou a ver o ministro, porém desistiu no último segundo. As declarações dele foram dadas ao Estadão, à Veja e à Folha de S.Paulo. ;Não ia ser ameaça, não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (sic) e depois me suicidar;, afirmou o ex-procurador.
Ele contou que a intenção de atirar em Gilmar Mendes foi motivada por ataques que o ministro fez à filha dele. Quando era chefe do Ministério Público, Janot chegou a pedir a suspeição do magistrado na análise de um habeas corpus do empresário Eike Batista, sob o argumento de que a mulher do ministro, Guiomar Mendes, atuava no escritório de Sérgio Bermudes.
Ao se defender, Gilmar Mendes afirmou que a filha de Janot advogava para a empreiteira OAS em processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e poderia ser ;credora por honorários advocatícios de pessoas jurídicas envolvidas na Lava-Jato;. A história aparece no livro de memórias Nada Menos que Tudo, a ser lançado pelo ex-chefe do MP em outubro. Na publicação, porém, Janot preferiu ;não dar nome aos bois;.